“Eles estão vindo te pegar, Bárbara”, diz Johnny à irmã quando vê um homem cambaleando em sua direção. Mal sabe ele que está prestes a ser primeira vítima de um ataque de zumbi da história do cinema.
A cena acima descreve os minutos iniciais de A Noite dos Mortos Vivos (1968), de George A. Romero, obra considerada pioneira no subgênero do zumbi moderno. Antes disso, a maioria das aparições desses personagens era associada com algum tipo de cultura vudu.
A estreia do diretor no cinema se tornou um marco na história da cultura mundial. Depois do lançamento, ela foi infinitamente copiada. Jogos de videogame, seriados televisivos, livros e centenas de outros filmes, de variadas nacionalidades, se apropriaram da mesma atmosfera apocalíptica a ponto dos zumbis se tornarem patrimônio da humanidade.
Mas a primeira vez ninguém esquece.
Filmado em preto e branco, A Noite dos Mortos Vivos tem uma narrativa seca sobre um grupo de sete sobreviventes que se isola numa casa de campo durante um apocalipse zumbi. No refúgio, os personagens travam uma disputa por poder para definir se ficam ou tentam a sorte no meio dos mortos famintos.
Realizado com um orçamento apertado, o longa-metragem do diretor ganhou fama em drive ins, quando era exibido em sessões de meia-noite. A legião de fãs se justificava pelo sabor de novidade da obra, cheia de efeitos visuais crus que, apesar de envelhecidos, ainda convencem. Um exemplo é a cena em que um zumbi devora um rato na frente das telas do lado de outros, que disputam pedaços de um intestino humano.
Para criar o roteiro, Romero se inspirou nos quadrinhos da EC Comics, que lia quando criança. Em títulos como Contos da Cripta, a editora apresentava monstros da literatura gótica britânica – como vampiros e lobisomens – atacando a sociedade contemporânea. Essas histórias foram caracterizadas por Tony Williams, autor de uma biografia do diretor, como horror naturalista.
Esse naturalismo de Romero é evidenciado por seus personagens, que mantêm preocupações altamente contemporâneas, como acompanhar notícias pela televisão para saber o que está ocorrendo – enquanto a morte espreita do lado de fora da porta.
Outra característica da obra, que se tornaria a marca autoral de Romero, é a crítica social. A Noite de Mortos Vivos coloca um personagem negro lutando contra brancos, que beiram o irracional, pelo poder de decisão sobre sua própria vida. O conflito fictício claramente reflete as lutas pela igualdade racial que explodiam nos Estados Unidos no período em que o filme foi lançado.
A representação dos mortos vivos também é alvo de muita análise por fãs e críticos. O diretor apresenta um grupo de monstros contagiosos e irracionais, movidos por instinto. Mas que não deixam de ser humanos. Por isso, quando tratados de maneira selvagem pelos vivos, que os enforcam, queimam e os usam como objetos de jogos sádicos, Romero está dizendo: somos piores.
Por não ter registrado o filme adequadamente na época do lançamento, Romero perdeu os direitos sobre sua obra. Hoje ela é considerada domínio público e pode ser vista pelo YouTube:
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