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Creio ser difícil responsabilizar apenas um fator na série alarmante de más notícias em torno da atividade musical no país, e não creio que há um plano articulado contra a música como um todo. A crise é global. No entanto a catastrófica crise econômica que assola o Brasil nos últimos tempos veio se agregar a algo já muito conhecido quando nos referimos a instituições públicas voltadas à atividade musical: péssima gestão. A lista de hecatombes nacionais recentes (crise econômica, política e alta corrupção) se soma às toscas e ineficientes práticas administrativas.

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Curitiba

Aqui no Paraná o anunciado cancelamento da realização da 35ª Oficina de Música de Curitiba demonstra uma junção de uma arrecadação cambaleante da prefeitura com deslizes sérios de gestão, tanto da administração que está saindo, por ter prometido uma verba que não existe, como da administração que está entrando e que lança uma artificial disputa entre saúde e cultura (que é vista pelo novo prefeito como “secundária”). A meu ver nada justifica o cancelamento de um evento cultural que há 35 anos acontece na cidade, ainda mais depois que os aportes necessários foram oferecidos por diversas secretarias do Estado, mas se revelaram ineficientes frente à obstinação do novo prefeito em cancelar o evento.

Brasília

Caso já antigo é o da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro de Brasília, que há três anos vem se apresentando em locais totalmente desprovidos de mínimas condições acústicas pelo fato de sua sede, o Teatro Nacional, estar fechado para reformas, reformas essas que ainda estão longe de começar. A má novidade é que a recessão galopante faz da próxima temporada da orquestra ser uma incógnita pois cortes consideráveis já foram anunciados. Lembro que os músicos desta orquestra recebem os mais altos salários de músicos de orquestra do país. Em resumo: músicos bem pagos tocando para um pequeno público em lugares impróprios. Desperdício?

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Porto Alegre

Outra crise de gestão aguda e antiga acontece também com a OSPA – Orquestra Sinfônica de Porto Alegre. Sem sede há muitos anos (sua sede foi “desalugada” pela governadora Yeda Crusius) toca em igrejas com acústicas sofríveis para um público declinante. A diferença com Brasília é que os salários, que já não são grande coisa, entraram no sistema de parcelamentos no falido Estado do Rio Grande do Sul. Vale ressaltar que no programa de contenção de custos o Governo do Estado extinguiu a Rádio Educativa do Rio Grande do Sul.

São Paulo

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Em São Paulo a queda de arrecadação advinda da crise econômica levou o Governo do Estado a praticamente extinguir a Banda Sinfônica do Estado de São Paulo. Aliás o governo de São Paulo pensa seriamente (através da OS “Instituto Pensarte”) em cessar a atividade da Jazz Sinfônica e da Orquestra do Theatro São Pedro. Mesmo a OSESP, uma instituição que parece viver ao largo da catastrófica situação econômica do país, tem perspectiva de alguns cortes no seu orçamento. Mas como a OSESP tem um apoio forte de um conceituado banco, e como os bancos são os únicos a lucrarem no caos econômico brasileiro, existe chance de ela sair menos chamuscada da recessão. A crise de corrupção que aconteceu no Theatro Municipal de São Paulo, com notícias de que o dinheiro desviado chegaria a 130 milhões de reais. Roubalheira, baixa arrecadação e má gestão: tudo junto.

Rio de Janeiro

No Theatro Municipal do Rio de Janeiro (que apesar do nome é administrado pelo governo do Estado) foram canceladas as apresentações de uma ópera (Jenufa do tcheco Leoš Janáček) dois dias antes da estreia no último mês de novembro pelo atraso de mais de um mês de pagamento dos salários dos músicos e demais funcionários do teatro. A penúria carioca faz com que os salários continuem a ser parcelados para todos os funcionários do Estado, inclusive os músicos (cantores e instrumentistas) do teatro. E por falar em Rio de Janeiro, a péssima gestão acrescida à recessão levou mais uma vez ao impasse a existência da Orquestra Sinfônica Brasileira. O Estado do Rio de Janeiro, cujas finanças estão para lá de arruinadas, parece prometer mais crises. No que tange o Theatro Municipal e todo o funcionalismo do Estado o parcelamento dos salários será uma constante durante o ano, o que faz prever mais cancelamentos.

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Salvador e outros lugares

Em Salvador a Orquestra Sinfônica da Bahia (OSBA), mantida pelo Governo do Estado, não para de tirar coelhos da cartola para se manter viva. É lógico que a recessão só piora a situação do conjunto, que talvez sofra por ter sido apoiada por Antônio Carlos Magalhães e não aparece simpática à atual administração. Mera hipótese. Mas a crise é real. Há a promessa de uma OS (Organização social) salvar o conjunto. Ainda não soube de nada mais definido a respeito das atividades musicais em Belo Horizonte, mas, ao que tudo indica, problemas acontecerão, pois, o Estado de Minas Gerais decretou Catástrofe Econômica. Ainda não obtive notícias de Goiânia, Manaus, Belém e Recife.

Futuro sombrio e nebuloso

Para mim a equação é simples: a música de qualidade é uma atividade que depende principalmente do poder público e as finanças públicas estão numa crise profunda, advinda principalmente de uma recessão nunca vista por aqui, alimentada por uma infindável crise política. E quem administra esta verba declinante não tem demonstrado capacidade técnica de fazer com que esta verba produza algo de bom. Esta crise política me parece estar longe do fim e como consequência a crise econômica permanecerá, infelizmente, por um longo tempo. Não há mais nenhuma garantia, e mesmo os funcionários estatutários não sabem do dia de amanhã e se perguntam: haverá recursos para se pagar salários e aposentadorias para eles? Creio mesmo que a atividade musical, mesmo com todas as dificuldades, deverá aos poucos se desenvolver fora do meio governamental. O futuro, do jeito que as atividades culturais vêm sendo feitas, me parece mesmo extremamente sombrio e nebuloso.

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