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O Brasil sempre surpreende pelos seus baixíssimos índices que medem a situação do ensino em nosso país. Que a nossa educação é algo catastrófico eu não tenho nenhuma dúvida, e a decadência dessa situação é facilmente visível. O professor é desprestigiado por um salário aviltante e por uma ameaça constante de violência por parte dos alunos, e as condições físicas das escolas são de chorar. Lembro que estudei num colégio estadual em São Paulo, e saí da escola com bons conhecimentos de inglês, francês, história, literatura e geografia que hoje não se encontram nem em escolas particulares. Para piorar, a geração de jovens já vem de pais que tiveram uma educação ruim, e não vejo tendências para as coisas melhorarem. Não quero aqui tratar sobre a educação em geral. Fixo-me apenas na educação musical, que como a educação em geral sofre pelo desprezo e pelos maus tratos.

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A educação musical nas escolas regulares

A educação musical no ensino regular nas escolas públicas é uma antiga reinvindicação dos profissionais da área. Para uma sociedade que recebe tal formação os ganhos são evidentes, não só para a descoberta de novos talentos, mas para o aperfeiçoamento do ser humano como um todo. Até o final da década de 60 de século passado o ensino musical era obrigatório. Aos poucos, durante a ditadura militar, este ensino foi desaparecendo, e acabou sendo substituído por uma “Educação artística”, algo genérico, que misturava artes plásticas, teatro e música, não satisfazendo plenamente nenhuma das três áreas. Esta matéria sempre foi vista com desdém pelos diretores das escolas, e a situação ficou do jeito que está, isto é, completamente ineficaz. Para uma boa educação musical cada escola deveria pelo menos ter um piano, ou mesmo um teclado eletrônico, mas isso talvez fosse pedir demais quando vemos alunos tendo aulas ao relento ou dentro de containers. A volta da educação musical tornou-se lei: a lei 11.769, publicada no D.O.U. de 19 de agosto de 2008 altera a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, instituindo a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas brasileiras. No entanto, como outras leis que temos esta não teve efeito prático nenhum.

A triste situação das Escolas de Música

Quanto ao ensino específico de música a situação é mais do que caótica. Com exceção do Estado de São Paulo onde encontramos centros de absoluta excelência, como o Conservatório Dramático e Musical de Tatuí “Dr. Carlos de Campos”, ou mesmo a Escola Municipal de Música na capital (onde estudei), a situação em geral é bem triste. Aliás, é interessante lembrar que o Estado de São Paulo é o lugar do país onde existem mais orquestras e concertos, o que torna evidente os resultados de uma formação com qualidade. O estado calamitoso dos Conservatórios e Faculdades de música não é apenas uma questão do estado físico das instalações. Outro problema sério é a grade curricular. Diversas Faculdades de Música são completamente estéreis ao oferecer apenas cursos teóricos. O resultado é a formação de surdos e incompetentes, que se aprimoram em teses chatas, aborrecidas e inúteis. Poucos departamentos de música do país são como o departamento de Música da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), que apesar de suas mal conservadas instalações oferecem cursos de altíssimo nível tanto no aspecto prático (excelentes professores de instrumento) quanto no aspecto teórico (idem).

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Escolas de música caindo aos pedaços

Vou me ater apenas a dois estados brasileiros: o Paraná e o Rio de Janeiro, apesar de que a situação é parecida na Bahia, em Brasília e na maioria dos estados. Do Paraná destaco o imenso desprezo com que é tratada há muitos anos a nossa principal escola oficial de música, a Escola de Música e Belas Artes do Paraná. Já fui professor desta entidade, e me demiti por não suportar ver tantos maus tratos. Na sala em que dava aula diversos ratos (sim, roedores) devem ter aprendido a não fazerem quintas paralelas (papo de músico) e lembro-me de um curso intensivo que dei de Contraponto há alguns anos, onde os pianos da sala, que estavam completamente desafinados, recebiam nos dias de chuva insistentes gotas d’água. Esta escola ocupava um prédio histórico no centro da cidade e foi transferida, em caráter provisório que se mostra mais do que isso, para dois edifícios num lugar perigoso da região central, em salas sem nenhum preparo acústico, térmico, ou qualquer coisa do gênero. Enfim, é uma escola que não anima nenhum aluno e nenhum professor.
No Rio de Janeiro a situação é ainda pior, e os descalabros que acontecem por lá (Museu do índio, Theatro Municipal) atingem em cheio o ensino musical. As duas principais escolas de música da antiga capital federal estão literalmente quase em ruínas. Basta vermos algumas fotos do departamento de música da UNIRIO (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro) e da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Lembro que esta última é uma das melhores escolas de música do país, com intensa atividade prática. Instalada num belíssimo prédio histórico, tenho a lamentar o estado de conservação do mesmo. Neste edifício existe uma das melhores salas de concerto do Brasil, o Salão Leopoldo Miguez, a única sala de concertos do país com um autêntico órgão de tubos, e com uma acústica simplesmente maravilhosa. Pois esta sala de concertos não tem ar condicionado (pelo menos não tinha até há dois anos, quando me apresentei lá), o que transforma, no intenso calor carioca, qualquer apresentação num martírio para os artistas e para o público. Em resumo, o estado de conservação da sede da escola de música da URFJ está bem abaixo da excelente atuação didática praticada por lá.

Ânimo!

Mesmo com tantos problemas não podemos desanimar. Jovens continuam a se interessar no estudo musical e o mínimo que deveríamos oferecer a eles é uma condição decente de formação. Coisas simples e nem tão custosas podem ajudar, sobretudo um curriculum que efetivamente ajude o jovem músico. A tecnologia nos oferece hoje em dia pianos elétricos excelentes e muito menos custosos, que seriam perfeitos para as aulas teóricas. Não podemos apenas lamentar a situação. Temos que cobrar das autoridades (in) competentes, e temos que fazer o melhor possível para tornar o caminho do estudante de música algo melhor e mais construtivo.