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Dia internacional da mulher. Histórias de luta

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Chiquinha Gonzaga.Nossa primeira compositora

Nada mais apropriado do que no “Dia internacional da mulher” se falar do quanto a mulher foi perseguida e condenada ao ostracismo no universo da música clássica. Assim como a escravidão era algo absolutamente lógica no tempo do Brasil colônia, alijar a mulher de atividades musicais era algo considerado, até pouco tempo, algo completamente normal. Num passado bem próximo algumas orquestras não permitiam a entrada de mulheres. Podemos citar como os exemplos mais radicais a Filarmônica de Berlim, a Filarmônica de Viena e a Orquestra Filarmônica Tcheca.

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A clarinetista Sabine Meyer.Rejeitada por seus colegas por ser mulher

Em 1982 a clarinetista alemã Sabine Meyer foi aprovada, em audição feita atrás de um biombo, como membro efetivo da orquestra Filarmônica de Berlim, a primeira mulher na história daquele conjunto, mas numa votação dos próprios músicos ela acabou não sendo aceita num placar de 73 a 4. Em resumo, a grande maioria dos músicos de Berlim rejeitou uma das melhores instrumentistas da atualidade simplesmente por ser mulher. Hoje, felizmente, a coisa é bem diferente por lá, mas a Orquestra Filarmônica de Viena ainda complica a situação das mulheres. Poucas são aceitas, e o mesmo se passa na Filarmônica Tcheca, que mesmo depois do final do comunismo proibia a entrada de mulheres. Aliás, as únicas mulheres que eventualmente atuavam como convidadas nestas três orquestras eram as harpistas. Mais um preconceito ao contrário totalmente idiota, pois dois dos melhores harpistas que já vi e ouvi são homens. Felizmente, digo de novo, a coisa mudou, mas não podemos esquecer que mudou há pouquíssimo tempo. Para as mulheres era eventualmente incentivada sua atuação como pianista, pois isto era visto como mais uma “prenda doméstica”. Graças a isso, no entanto o mundo conheceu a suprema arte de diversas pianistas, inclusive brasileiras. Meu respeito aqui a Guiomar Novaes, Yara Bernette, Magda Tagliaferro e tantas outras, sem falar de Clara Haskil, Martha Argerich, Maria Yudina e inúmeras outras oianistas de todo o mundo. Não posso deixar de falar também da grande violinista brasileira Mariuccia Iacovino, uma grande mulher, com quem tive o privilégio de trabalhar. Citaria também a atitude absolutamente corajosa de nossa Chiquinha Gonzaga (1847-1935), nossa primeira compositora.

Maestrinas

Outro preconceito existia (na realidade ainda existe) em relação a mulheres regerem uma orquestra. Por muito tempo isto foi considerado algo grotesco e mesmo o grande maestro brasileiro Eleazar de Carvalho, em suas aulas, ridicularizava as aspirantes à regência de orquestra fazendo brincadeirinhas que hoje, com certeza, não seriam aceitas. Aliás, quem já leu a biografia da violoncelista Ana Devos (falecida esposa do grande fagotista Noel Devos) pôde constatar a dificuldade de uma mulher instrumentista de orquestra em conseguir o respeito de Eleazar de Carvalho nos anos cinquenta. A coisa mudou, e curiosamente a sucessora de Eleazar na Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, a Osesp, é uma mulher, a americana Marin Alsop.

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Fanny Mendelssohn.Compositora de alto nível combatida pela própria família

Tristes histórias de mulheres compositoras

Outro preconceito indisfarçável foi entre mulheres compositoras. Até o final do século XX não encontramos nenhuma compositora que esteve no que podemos chamar de primeiro time. Seriam as mulheres portadoras de alguma capacidade genética para comporem? Exemplo mais triste disto é o de Fanny Mendelssohn (1805-1847). Irmã do grande compositor Felix Mendelssohn (1809-1847) foi em alguns aspectos mais talentosa do que seu famoso irmão. No entanto teve suas ambições tolhidas pela família, inclusive pelo próprio irmão. Ela foi obrigada a casar (ela protelou o que pôde este casamento) e virou uma simples dona de casa. Eis um trecho de uma carta de Felix Mendelssohn para sua mãe (que era pianista também, mas nunca se apresentou), falando a respeito de sua irmã: “Pelo que eu sei de Fanny eu diria que ela não tem inclinação e nem talento para a composição. Para uma mulher ela já sabe a respeito de música o suficiente. Ela administra sua casa e sua família e não se preocupa com o meio musical, e, com certeza, ela não coloca estas preocupações à frente de suas preocupações domésticas. Publicar suas obras só perturbaria estas suas preocupações, e eu não posso dizer que aprovaria isso”. No entanto Felix Mendelssohn publicou algumas obras da irmã como sendo suas, e ele se envergonhou quando, em uma visita à Inglaterra, a Rainha Vitoria expressou sua predileção por uma canção, que na verdade ele sabia que era da autoria de sua irmã. Fanny Mendelssohn escreveu obras incrivelmente boas, e reputo o seu Quarteto de cordas em Mi Bemol maior como uma obra prima. A história é parecida com Clara Schumann (1819-1896), esposa do compositor Robert Schumann (1810-1856). Musicista soberba Clara era uma excelente pianista, mas também compunha. Suas ambições como compositora nunca encontraram apoio em seu marido, e sua vida não foi o mar de rosas que normalmente tenta se pintar. Seu marido tinha um apetite sexual enorme e acabou contraindo sífilis de uma prostituta. Se Clara foi visita-lo raras vezes no sanatório em que foi internado ao ficar demente, pode-se deduzir facilmente suas razões. Depois da morte do marido Clara ficou sozinha com os filhos, tendo que dar aulas e apresentações para sustentar a família. Não teve mais tempo para compor.

A volta por cima

Nos dias de hoje a situação é bem diferente, e se for falar de criadores musicais importantes de música clássica na atualidade não podemos deixar de citar
duas gigantes da composição: a finlandesa Kaija Saariaho (nascida em 1952) e a russa Sofia Gubaidulina (nascida em 1931). Estas duas compositoras são respeitadas em todo o mundo, possuem um estilo próprio, e o modernismo de suas obras continua a nos intrigar. Sim, este 8 de março abre espaço para a igualdade. A música e as mulheres merecem!

Uma obra prima desconhecida: O quarteto de cordas em mi bemol maior de Fanny Mendelssohn

A arte de Kaija Saariaho.Laterna Magica. Obra prima orquestral

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