Erik Satie| Foto:
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Satie: para rir e sonhar

Mesmo 150 anos depois de seu nascimento o compositor francês Erik Satie ainda permanece jovem, iconoclasta e questionador. Precursor da harmonia impressionista, do surrealismo, do minimalismo e até mesmo do Teatro do absurdo (talvez o pai espiritual de John Cage) foi dos raros compositores que teve uma existência marginal, fora de qualquer padrão burguês. Nenhum compositor importante teve uma vida boêmia como ele, nos padrões do famoso atelier “Bateau Lavoir” no bairro de Montmartre em Paris, que serviu de refúgio para artistas que eram ainda alternativos no final do século XIX, como Picasso, Modigliani, Max Jacob, Apollinaire e Derain. Ele vivia numa casa modesta a poucas quadras do “Bateau Lavoir” (uma fábrica de pianos abandonada) e conviveu assumidamente este tipo de vida excêntrica. Stravinsky, que conheceu Satie em 1911, se referia a ele como o ser mais diferente e incomum que conheceu em toda a sua vida.

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Do canto gregoriano ao cabaré

Nascido na Normandia em 17 de maio de 1866 teve ainda como menino uma educação musical bastante afastada do corriqueiro: foi aluno de um certo Monsieur Vinot que baseou seu trabalho com o jovem apenas no canto gregoriano. Isso sem dúvida explicará o modalismo de sua linguagem e um tipo de misticismo secreto do qual nunca se afastará: ele próprio fundará uma igreja mais tarde, a “Igreja metropolitana da Arte de Jesus dirigente”, da qual ele será o único adepto… Sua madrasta tenta colocá-lo num tipo de formação musical mais convencional, mas ele escapa do conservatório se engajando voluntariamente…no exército. Sua saúde frágil o fará renunciar à carreira militar e em 1887 compõe suas primeiras obras importantes, todas visivelmente influenciadas por esse ideal sonoro que poderíamos chamar de arcaico. Suas Quatro Ogivas para piano, com seus cantos gregorianos acordes paralelos e sem compassos definidos, encarnam a atitude mais rebelde possível ao Conservatório de Paris, templo da educação musical rígida e conservadora. Suas Três Sarabandas de 1887 traçam definitivamente o tipo de harmonia que compositores como Debussy e Ravel utilizarão.

É desta época sua obra mais popular, as Três Gymnopédies também para piano. Assim como suas Três Gnossiennes, escritas na mesma época, temos aqui uma música absolutamente “zen”, que revela caminhos originais e inusitados. O experimentalismo mais radical de Satie se manifesta nesta época em sua obra Vexations, uma curta partitura de piano que deve ser executada 840 (!) vezes, algo que deve levar entre 9 e 10 horas. Mesmo tocando todas as noites em cabarés famosos como “Le divan japonais” e “Le chat noir”, sua situação financeira vai ficar tão ruim que é obrigado a abandonar Montmartre e passa a viver num subúrbio da capital francesa (Arcueuil). Mas vai todas as noites a Montmartre e quando volta para casa de madrugada a pé (cerca de 5 quilômetros) caminha sempre com um “ameaçador” martelo para espantar os ladrões… Em 1905 decide aprimorar sua formação musical entrando na Schola Cantorum tendo sido aluno de Albert Roussel e Vincent D’Indy. É depois deste período, em 1915, que Satie conhece Jean Cocteau. Junto a ele Satie abre o caminho para o surrealismo. Prova disso é a genial música que ele escreve para o Ballet “Parade” em 1917, cujo argumento era também de Cocteau.

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Junto à orquestra máquinas de escrever, um revólver e globos giratórios de loteria ajudam a contar a história de uma garota americana, dois acrobatas e um Prestidigitador chinês. A estreia com cenários e figurinos de Picasso e regência de Ansermet foi um escândalo tão grande ao que aconteceu em 1913 com a criação de “Le sacre du printemps”. O surrealismo anunciado nesta obra terá 7 anos depois uma sequência fantástica: Relache, trilha sonora para um curta do cineasta René Clair. O compositor chamava esta obra de “Ballet instantanéiste”. Ele falece em julho de 1925. Satie, que desde jovem tinha um aspecto de idoso, chega a nós como o mais iconoclasta e juvenil dos grandes compositores. 150 anos depois de seu nascimento se apresenta ainda como alguém que nos faz rir e sonhar.

Frases de Satie:

“Quando eu era jovem, me disseram “Você vai ver quando você tem cinquenta anos”. Agora eu tenho cinquenta e eu ainda não vi nada”.

“A experiência é uma das formas de paralisia”.

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“O músico é talvez o mais modesto dos animais, mas ele é o mais orgulhoso. É ele que cria a arte sublime de arrasar a poesia”.

“Ela canta como um rouxinol com dor de dente”.

“Antes de compor uma peça, eu passeio em volta dela acompanhado por mim mesmo”.

“Não busco ser um mestre: isso é muito ridículo”.

“Fisicamente o crítico tem um aspecto grave, do tipo de um contrafagote”.

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“Não existe “Escola Satie”. O “satiesmo” não saberia existir. Me achariam hostil. Na arte não deve haver escravidão”.

“Sabe como limpar o son? É muito sujo”.

“O piano, assim como o dinheiro, só é agradável àquele que o toca”.

Vídeos

A mais famosa obra: Gymnopédie 1 tocada por Alexandre Tharaud

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Relache: Música de Satie para um curta metragem de René Clair

Pequena cena do Ballet “Parade”

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Vexations completa. Mais de 9 horas de música