Os concertos que farei junto à Camerata Antiqua de Curitiba no próximo fim de semana é a realização de um terceiro projeto junto a este excelente grupo que tenho concretizado nos últimos anos. Em 2013 o projeto foi em torno de obras de Franz Schubert, com destaque para sua obra desconhecida no Brasil “Canto dos espíritos sobre as águas”. Em 2014, a presença de Bach levou à ousadia da dupla apresentação das Bachianas brasileira N° 9 de Villa-Lobos, em sua versão original para “Orquestra de vozes” e na transcrição que o autor fez para orquestra de cordas. Em 2015 o focalizado é Mozart.
Mozart em Dó Maior
A vida de Wolfgang Amadeu Mozart foi breve. Nasceu em Salzburg em 1756 e morreu em Viena em 1791. Apesar de ter sido uma criança prodígio as obras primas de Mozart começam realmente a aparecer quando o compositor tinha por volta de dezoito anos de idade. Sua existência em sua cidade natal foi cheia de conflitos, sobretudo no que se refere ao terrível Bispo Hieronymus von Colloredo (1732-1812), o único “patrão” que o compositor teve. A partida definitiva do compositor para Viena em 1781 abrirá espaço para que o compositor expanda um gênio musical extremamente raro, tornando-o o primeiro compositor “independente” da história. Nos últimos anos de sua presença em Salzburg a base deste gigantesco talento pode ser constatada em diversas obras. A ideia de reunir três partituras juvenis do compositor é perceber que a essência de algumas obras primas escritas em Viena já desabrochava na cidade natal do compositor. A primeira obra do programa é a Sinfonia em Dó maior IK 200, numerada (erroneamente, como todas as sinfonias de Mozart) como Nº 28. Ela faz parte de uma série de nove sinfonias escritas entre 1773 e 1774. Muito mais desenvolvida do que a maioria delas (só perde para a Sinfonia em Sol menor) esta Sinfonia apresenta todos os quatro movimentos que normalmente encontramos em sinfonias clássicas. Claramente escrita sob influência de Michael e Joseph Haydn, e de um compositor pouco conhecido, Johann Baptist Wanhal, certos toques de escrita revelam a influência também das técnicas de escrita da escola de Mannheim. A sua escrita virtuosística (especialmente no último movimento) não facilita muito que ela se torne popular. Salvo engano será a primeira execução aqui. A segunda obra do programa é uma das últimas composições de Mozart antes dele se mudar para Viena. Trata-se das “Vesperae solennes de confessore”, IK 339. Obra litúrgica, foi escrita em 1780 para ser executada na Catedral de Salzburg. Os textos vêm dos Salmos 110, 111, 112,113 e 117. A última parte é um Magnificat, extraído do Evangelho de São Lucas. Com este canto de júbilo da Virgem Maria, a obra se foca na voz do soprano solista, que no belíssimo V movimento, o Laudate Dominum nos leva a uma melodia mágica, que parece antecipar o Quarteto de despedida da ópera Cosi fan tutte, que Mozart escreveria alguns anos depois. Em termos de antecipações o IV movimento, Laudate Pueri, parece anunciar a primeira fuga do Requiem que Mozart esboçaria no final de sua vida. A terceira obra é a Missa em Dó maior IK 317, conhecida como “Missa da coroação”. Este título teria a ver com a “Coroação” da estátua da Virgem Maria em uma pequena igreja próxima de Salzburg, mas o título ficou também ligado ao fato da obra ter sido executada nas coroações dos imperadores austríacos Leopoldo II e Francisco II. Esta missa é a mais conhecida obra deste gênero que Mozart completou, já que suas missas mais importantes, a Missa em Dó menor IK 427 e seu Requiem IK 626, permaneceram inacabadas. Foi escrita em 1779, depois de um período de 18 meses fora de Salzburg, quando o compositor tentou se fixar em Paris e em Mannheim. Logo de início percebemos a originalidade, quando, no início da obra, o temor a Deus é manifestado num piano súbito no meio da palavra Kyrie (Senhor). Notável é o fato do Agnus Dei antecipar a ária “Dove sono” de “As bodas de Fígaro”, uma das óperas mais importantes de Mozart, que só seria composta em 1786. Na ária da ópera a Condessa lamenta o fato de seu marido não mais ama-la. A mesma angústia no pedido de paz na parte final da missa leva o compositor a usar a mesma melodia. Realmente o grande compositor já concebia ideias musicais parecidas. Ao executarmos estas três obras o objetivo maior é mostrar que o compositor, quando jovem, já era um mestre absoluto no domínio da linguagem musical. O jovem Mozart já era um grande compositor. Quem quiser assistir os concertos eles acontecerão na Capela Santa Maria, aqui em Curitiba, na sexta, dia 27 às 20 horas e no sábado dia 28 às 18:00.