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Mozart ou Mendelssohn. Qual o maior prodígio musical da história?

O jovem Mozart. A imagem mais famosa de um gênio musical precoce (Foto: )
O jovem Mozart. A imagem mais famosa de um gênio musical precoce

O jovem Mozart. A imagem mais famosa de um gênio musical precoce

Criança prodígio. Sucesso e tragédia

O prodígio musical sempre nos fascinou. E a figura do jovem Mozart, capaz de realizar prodígios impressionantes, povoa a imagem deste ícone, a criança prodígio, que tanto agrada o público, seja um público afeito à música clássica ou um público simplesmente curioso. No entanto constatamos que ser simplesmente um prodígio pode não levar a nada. Exemplo disso foi um obscuro compositor inglês, Willian Crotch (1775-1847), que ao que parece foi ainda mais prodígio do que qualquer outro músico que já viveu neste planeta. Já dava recitais de piano com menos de três anos (!!!) de idade e aos seis compôs uma ópera em três atos (Robin Goodfelow), e, além disso, aos nove anos de idade foi publicado um concerto para piano e orquestra de sua autoria. Aos sete anos fazia apresentações que enriqueceram seus inescrupulosos pais, mostrando sua memória fantástica e sua facilidade para fazer, no teclado, todos os tipos de “acrobacias” com uma técnica admirável. Aos onze anos compôs um oratório, “The Captivity of Judah” que foi apresentado em Cambridge com grande sucesso em 1788, e que está, nos dias de hoje, completamente esquecido. Crotch, que emocionalmente foi arrasado por esta exploração de sua família, disse em uma carta, quando já tinha mais de sessenta anos: “Eu olho para trás, para a minha infância, como uma parte de minha existência dolorosa e humilhante”.

Willian Crotch, um obscuro compositor prodígio inglês

Willian Crotch, um obscuro compositor prodígio inglês

Ser um prodígio é essencial?

Em termos de prodígios musicais exemplos numerosos existem na história da música de compositores que amadureceram como criadores que não cumprem as promessas feitas pelos seus excepcionais talentos demonstrados com pouca idade. Exemplo disso é o compositor austríaco Erich Korgnold (1897-1957). Aos doze anos de idade teve seu ballet “O Homem da neve” (Der Schneemann) executado na ópera de Viena. Sua Sinfonieta foi escrita aos quatorze anos, e uma ópera extremamente promissora, Violanta, foi composta aos dezessete anos. Seu maior sucesso, sua ópera “A cidade morta”, que é um item importante do repertório lírico mundial, foi escrita quando ele tinha 23 anos. Foi sua última composição de inquestionável qualidade. Depois disso, além de seu meloso concerto para violino, acabou se tornando um compositor de trilhas sonoras em Hollywood e nunca mais compôs algo realmente marcante.

Por outro lado alguns compositores tornaram-se nomes tão importantes que até esquecemos que foram crianças prodígio. É o caso dos compositores russos Sergey Prokofiev (1891-1953) e Dmitry Shostakovich. Este último escreveu “Três danças fantásticas” para piano, obra absolutamente madura, quando tinha apenas quinze anos, e Prokofiev escreveu sua fantástica “Sugestão diabólica” aos dezesseis. É o caso também dos compositores franceses Camille Saint-Saëns (1835-1921) e Georges Bizet (1838-1875) que escreveram uma sinfonia de qualidade (especialmente a de Bizet) quando tinham apenas dezessete anos. Um prodígio, que deveria ser mais lembrado como tal, foi Franz Schubert (1797-1828). Afinal, aos dezessete anos de idade ele transformou de maneira decisiva a história de um gênero musical: o Lied (Canção com acompanhamento de piano). Com esta idade ele compôs “Margarida à roca de fiar” (Gretchen am Spinrade), testemunho de uma completa revolução na música vocal. Mas se vamos mesmo levar à olímpica disputa de quem foi o maior compositor prodígio da história da música, levando em conta obras primas escritas antes dos dezesseis anos de idade, a “briga” fica entre Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) e Felix Mendelssohn (1809-1847).

O compositor Felix Mendelssohn, autor de muitas obras primas compostas com pouca idade

O compositor Felix Mendelssohn, autor de muitas obras primas compostas com pouca idade

A grande “disputa”

Tanto Mozart quanto Mendelssohn tiveram a sorte de nascerem em famílias que souberam valorizar o talento precoce que demonstravam. Mozart nasceu numa família relativamente pobre, e se seu pai, que era uma bom músico, conseguiu um certo dinheiro com as apresentações de seu jovem filho, ao mesmo tempo fez um esforço enorme para que o jovem Mozart tivesse aulas com os mais respeitados mestres da composição daquela época. Leopold Mozart, o pai do compositor, fazia com que as excursões do filho lhe permitissem ter aulas com nomes do calibre de Johann Christian Bach (filho de Johann Sebastian Bach) em Londres e de Giovanni Battista Martini em Bologna. Além de sua alegada facilidade ao teclado e para a improvisação, Mozart realmente nos surpreende com uma fantástica obra prima escrita aos doze anos de idade: a Waisenhausmesse (Missa do orfanato) IK 139. Eu me pergunto como uma criança de doze anos pode escrever o magnífico solo de trombone do Agnus Dei desta missa? Uma obra com mais de 40 minutos de duração, é um ponto decisivo nesta “disputa” que existe entre Mozart e Mendelssohn. O que pesaria em desfavor para o jovem Mozart é que esta missa é uma exceção, pois a maioria das obras que escreveu nesta idade só são escutadas hoje por tratarem-se de obras de um dos maiores compositores da história. Poderia acrescentar a esta missa a ópera “Mitridate, re di Ponto”, composta aos quatorze anos, trabalho lírico bastante consistente.

Diferente de Mozart. Felix Mendelssohn nasceu em uma família rica. Com pouca idade passou a ter aulas com o compositor Carl Zelter (1758-1832), conselheiro musical do escritor Goethe, que em pouco tempo fez com que o jovem músico tivesse contato com a elite intelectual da Alemanha. O que nos surpreende no prodígio do compositor é que antes dos dezesseis anos Mendelssohn compôs algumas de suas melhores obras, algumas bem superiores em termos de qualidade a suas obras posteriores. O número elevado de obras primas compostas com pouca idade é um ponto bem favorável a esta suposta “disputa”: Seus três magníficos Quartetos com piano (Opus 1,2 e 3) foram escritos entre os quatorze e os quinze anos de idade, seu “Octeto” em mi bemol maior foi escrito aos dezesseis anos e sua “Abertura para Sonho de uma noite de verão” foi escrita com a mesma idade. Vale a pena lembrar que entre os onze e os dezessete anos ele compôs 13 sinfonias para cordas, sua Sinfonia Nº 1 para orquestra completa além de quatro óperas. O que nos surpreende mais em Mendelssohn é que seu estilo pessoal já estava completamente amadurecido quando ainda era adolescente. O “Octeto”, por exemplo, tem a marca registrada do autor, e, diferente de Mozart, se o mesmo tivesse falecido aos vinte anos, seria lembrado como um dos maiores compositores do século XIX, enquanto que Mozart, se tivesse falecido aos vinte anos, seria lembrado apenas como um…prodígio. Se na suposta “disputa” entrasse em conta o que se passou depois da fase do “prodígio” talvez Mozart vença. Fora as composições que Mozart foi obrigado a compor por encomenda, tipo Danças e Contradanças, suas obras maduras são todas fantásticas. Não é o caso de Mendelssohn. Sua Sinfonia Nº 5 (da reforma), por exemplo, está longe de ser a melhor de suas obras, e se seu Quarteto de cordas em fá menor opus 80 é um dos melhores quartetos escritos depois dos de Beethoven, muitas de suas obras camerísticas para clarinete e violoncelo são indiscutivelmente obras menores. O mesmo se passa em sua produção para órgão, uma desajeitada cópia da produção organística de Bach. Mendelssohn era visto pelo filósofo Nietsche como um artista fascinado pelo passado, e isto talvez explique o fato dele decididamente não ser visto como um revolucionário. No entanto muito da arte do compositor acabou influenciando os revolucionários da arte musical, mesmo aquele que mais o denegriu, Richard Wagner. A influência de Mozart em Beethoven é inegável. Em resumo, os dois prodígios foram também muito importantes para as transformações estilísticas da música. Nesta suposta “disputa” o ganhador, sem dúvida alguma, somos nós, que podemos usufruir de tantas obras maravilhosas, compostas por homens que sofreram um bocado por terem sido…prodígios.

Tres vídeos

Mozart: O incrível Agnus Dei da Missa do orfanato. Lindo solo de trombone escrito por uma criança de doze anos

Mendelssohn: O Scherzo do Octeto para cordas de Mendelssohn. Obra genial, pessoal e marcante escrita por um adolescente de dezesseis anos

Crotch: Uma rara gravação de uma obra de Willian Crotch

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