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Boa parte da torcida não sabe em que times brasileiros jogaram alguns dos principais nomes da seleção, como Firmino, Marcelo e Coutinho, autor do gol contra a Suíça. É gente que saiu muito cedo daqui, contratada por grandes clubes da Europa, e lá fez carreira, fama e fortuna.
Para algumas pessoas, isso é um problema. Mais que isso. Uma questão de Estado. Que exige a intervenção do governo.
Uma dessas pessoas é o historiador Flávio de Campos, da USP, que coordena o grupo de trabalho de Esporte e Lazer do pré-candidato à Presidência Guilherme Boulos (PSOL). Para ele, a saída de jovens promessas transformou a Seleção numa “coisa desenraizada, distante”, “um time de 11 craques que jogam e vivem lá no outro lado do mundo”, “que não criaram raiz, nenhuma identidade com o torcedor”, conforme declarou ao “Estadão”.
Qual a solução? Cobrar imposto. Muito imposto, explica o professor. Uma taxação pesada para inibir a transferência de jovens atletas, que iria reduzido conforme a idade do jogador, até chegar a zero quando ele completasse 23 ou 24 anos. Seria uma forma de “proteger a qualidade técnica do futebol brasileiro”, “sem medo de enfrentar o dogmatismo neoliberal que predomina nessas regras”. A proposta tem o aval de Boulos, que recomendou a entrevista.
É curioso. Essa mesma esquerda (e grande parte de nosso empresariado) acha interessante proteger a indústria nacional com sobretaxa a produtos estrangeiros e desvalorização do real, a fim de desestimular importações e impulsionar exportações (com o efeito colateral, sempre subestimado, de reduzir o poder de compra da população).
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No caso do futebol nacional, por outro lado, a ideia é protegê-lo sobretaxando a exportação de craques. Não parece correto usar um termo como “exportação” quando se fala de seres humanos, mas é difícil evitá-lo quando alguém pensa em impedir a livre circulação de trabalhadores, e por meio de um imposto, como se fossem mercadorias.
Quando um engenheiro, um programador, um advogado ou qualquer profissional vai trabalhar no exterior, tem a oportunidade de conhecer novas tecnologias, outras formas de trabalho, aprimorar seu conhecimento (e depois, se quiser, voltar e aplicar isso no Brasil). Pode não conseguir nem querer nada disso. Não importa. É seu direito tentar a sorte onde bem entender.
Mas, para o Boulos e os intelectuais do PSOL, jogador de futebol não tem esse direito. Em vez de deixar os mais talentosos aprimorarem sua técnica disputando os principais campeonatos do mundo com atletas de alto nível, o partido quer condená-los a atravessar uma fase crucial de suas carreiras jogando com os pernas-de-pau e cabeças-de-bagre que são maioria até na divisão principal do Brasileirão. Difícil entender como isso vai melhorar a qualidade do nosso futebol.
Pior. Caso a ideia seja mesmo levada adiante, o provável é que os clubes europeus continuem importando nossos principais talentos do mesmo jeito. O próprio historiador da USP observa que no “Primeiro Mundo” o esporte se tornou um negócio multibilionário e “pode comprar tudo”. Se pode comprar tudo, pode pagar o imposto também.
Quem perderá são os jogadores comuns. Gente pobre, na maioria esmagadora dos casos, que com um mínimo de bola no pé consegue contratos na Ásia, Leste Europeu e demais mercados da segunda divisão do futebol mundial. Em clubes que, em boa parte dos casos, pagam mais que a miséria reinante no futebol brasileiro. Para esses atletas, os “convencionais”, não haverá quem pague imposto. Para eles, restará tentar a sorte no Brasil mesmo. No futebol ou sabe-se lá onde.
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