O projeto mais importante da gestão de Jair Bolsonaro é a reforma da Previdência.
Ao menos é o que diz o núcleo pensante do governo, o que pregam os aliados sensatos, o que supõem empresários e investidores, o que esperam os minimamente informados sobre a catástrofe das contas públicas.
Mas não é o que se deduz do Twitter presidencial. Que é o canal onde, segundo Bolsonaro, seus eleitores podem se informar sobre as ações do governo sem risco de cair no que o presidente classifica de notícias falsas – isto é, tudo o que diga respeito a Fabrício Queiroz, circulação de salários no antigo gabinete de Flávio Bolsonaro, candidaturas laranjas do PSL, superministros desautorizados e demais inconveniências.
Quem – vamos dizer assim – se informa pela rede social do presidente fica sabendo o que apronta o pessoal da agenda globalista, vê afagos a Olavo de Carvalho e ao filho Carlos, acompanha intrigas com artistas e lê críticas à imprensa. Desde o carnaval, o seguidor também tem a oportunidade de conhecer práticas sexuais heterodoxas por meio de vídeos de conteúdo explícito, uma novidade do perfil.
No geral, é um canal muito alinhado às ideias dos ministros Damares Alves, Ernesto Araújo e Ricardo Vélez Rodríguez – trio que, para alguns, forma a alma do governo – e que atende com maestria aos anseios dos fãs mais ardorosos do presidente.
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Por outro lado, quem acompanha Bolsonaro nas redes saberá pouco ou nada sobre as regras que seu governo está propondo para aposentadorias, pensões por morte e benefícios assistenciais. Mudanças que, em resumo, farão dezenas de milhões de brasileiros se aposentar mais tarde e recebendo menos, em troca da promessa de algum equilíbrio nas contas públicas. Equilíbrio este que permita investimento público no que mais importa, atração de dinheiro privado, geração de empregos, crescimento econômico.
São coisas relevantes. Talvez até a torcida organizada do presidente saiba disso. Mas, claro, não causam frisson. Não alimentam aquele estado frenético, aquela excitação contínua em que Bolsonaro busca manter seu séquito desde muito antes da campanha eleitoral. Ninguém, afinal, vai “mitar” falando de Previdência.
Desde 20 de fevereiro, quando foi ao Congresso entregar a Proposta de Emenda à Constituição, até as 8h da manhã desta quinta-feira (7), o presidente tuitou ou retuitou 77 mensagens. Dessas, cinco têm a ver com a reforma.
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São dois compartilhamentos (uma notícia sobre aposentadoria especial de políticos e uma postagem do filho Eduardo, deputado federal, sobre aula que recebeu de técnicos do Ministério da Economia); um anúncio de entrevista do ministro Paulo Guedes à tevê estatal; o pronunciamento do presidente sobre a reforma; e um único texto, digamos, de próprio punho (“Nenhuma outra proposta de reforma foi tão firme contra privilégios. Está claro no texto da Nova Previdência: quem tem menos, paga menos. É preciso consciência. A mudança é dura, mas necessária. Devemos assegurar o futuro sustentável do Brasil e dos brasileiros. Estamos juntos!”)
Foi só. Nas redes sociais do presidente, o assunto Previdência nasceu em 20 de fevereiro e morreu no dia 21. No dia 26, em reunião com lideranças no Palácio da Alvorada, Bolsonaro ouviu queixas de aliados. Deputados reclamaram que ele estava mudo sobre o assunto, enquanto eles tinham de lidar com o ônus da proposta e, de quebra, serem cobrados em público por um vereador carioca. No caso, Carlos Bolsonaro.
Na ocasião, Bolsonaro prometeu gravar vídeos e fazer “lives” nas redes para tratar do tema diretamente com a população. E, assim, deixar os parlamentares mais confortáveis para apoiar a reforma. Chegou a dizer que contaria com a ajuda do filho Carlos na divulgação, o que não necessariamente causou alívio.
Desde então, nada. O presidente se manteve ocupado com outras coisas, e os vídeos que ele anda compartilhando não tratam exatamente de Previdência.
“Esperamos que ele use as redes, faça vídeos ao vivo. Acho que está demorando para ele fazer isso. Isso foi pedido e conversado na reunião de líderes. Continuamos esperando ele colocar isso em prática”, disse nesta quinta (7) o líder do Novo na Câmara, Marcel Van Hattem, à agência de notícias do jornal “O Estado de S. Paulo”.
Há uma exceção, honrosa, no Twitter de Bolsonaro: as menções à infraestrutura. O ministro da área, Tarcísio Gomes de Freitas, mantém o presidente bem abastecido sobre as ações e licitações que sua Pasta está preparando. Tanto que infraestrutura é o terceiro assunto que Bolsonaro mais comenta em suas postagens.
Segundo levantamento do “Estadão”, desde que assumiu o cargo o presidente postou 515 mensagens. À parte agradecimentos e saudações, ele falou 51 vezes sobre ideologia e doutrinação, 43 sobre relações internacionais e 41 sobre infraestrutura. Fez 31 publicações com críticas à imprensa, 30 com reações a críticas e 30 sobre segurança. A Previdência foi citada aquelas cinco vezes de que já falamos. O pacote anticrime, de Sergio Moro, só duas.
Claro que é mais agradável anunciar obras – ferrovias, portos, estradas e afins – do que um aperto nas aposentadorias, pensões e benefícios de quem o elegeu. Mas quem sabe a equipe de Paulo Guedes não consiga ajudar o presidente? Tarefa ingrata: há sempre o risco de ele se distrair com vídeos, memes, tretas, teorias conspiratórias, áudios de WhatsApp…
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