O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, é um sujeito franco, decidido e apressado. Descrito como brilhante, porém prepotente – ou, como preferem alguns, autêntico.
Seu destemor em “meter a faca”, para usar uma expressão dele mesmo, pode ajudá-lo na ambiciosa tentativa de revolucionar a economia brasileira num punhado de anos. Mas também pode pôr tudo a perder.
Guedes quer privatizar tantas estatais quanto Jair Bolsonaro permitir. Fazer uma reforma estrutural na Previdência. Passar a tesoura nas despesas públicas. Desengessar o Orçamento. Cortar ao máximo os benefícios fiscais. Abrir o país ao comércio exterior.
São medidas que, executadas com o devido cuidado, podem ajudar o governo a equilibrar suas contas e abrir caminho para o país crescer de forma sustentável. Mas elas também contrariam interesses os mais variados. São, no geral, impopulares. E não foram devidamente apresentadas nem debatidas na campanha eleitoral.
Quase tudo o que Guedes pretende mudar depende de aprovação do Congresso – da maioria dos parlamentares, no caso de leis, e de três quintos deles, para alterar a Constituição.
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Em tese, quem quer atacar tantas frentes ao mesmo tempo deveria estar preocupado em fazer aliados, não inimigos. E cuidar da retaguarda, para não tomar facadas pelas costas.
Não é o que Guedes tem feito.
Fala a parlamentares e empresários no melhor estilo “trago verdades”. Não que eles não tenham de ouvir algumas, ou várias. Mas se ilude se pensa que, agindo com essa sutileza, ganhará apoios incondicionais. Dilma Rousseff que o diga.
Enquanto fala o que quer, Guedes acumula derrotas antes mesmo de assumir seu superministério. E justamente no campo das contas públicas, sua obsessão.
Horas depois de um encontro pouco amistoso com o futuro ministro, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), incluiu na pauta da Casa o aumento do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Votado em 7 de novembro, o reajuste provocará um efeito cascata que custará ao governo federal cerca de R$ 1,7 bilhão por ano, ou R$ 6,8 bilhões nos quatro anos de mandato de Bolsonaro.
No dia seguinte, o Senado aprovou o programa automotivo Rota 2030. Serão R$ 2,1 bilhões por ano, ou R$ 8,4 bilhões em quatro anos, em renúncias tributárias para montadoras.
Em dezembro, mais incentivos fiscais. A Câmara dos Deputados prorrogou benesses para empresas instaladas no Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A União deixará de arrecadar R$ 3,5 bilhões por ano, ou R$ 14 bilhões em quatro anos. O projeto, que já havia passado pelo Senado, é de autoria de Eunício Oliveira, aquele mesmo.
Tudo em meio a uma constrangedora desarticulação da base do futuro governo. Enquanto isso, Guedes fracassou na negociação do rateio de recursos do futuro “megaleilão” de petróleo do pré-sal, e começará 2019 sem ter ideia de quanto dinheiro pode ou não entrar nos cofres da União.
De brinde, o guru econômico de Bolsonaro ganhou, no último dia 19, uma fatura de R$ 4,7 bilhões para pagar no ano que vem. Uma liminar do ministro do STF Ricardo Lewandowski garantiu o reajuste salarial de servidores federais, ao derrubar medida provisória que adiava esse aumento para 2020.
Como se não bastasse, ainda veio uma facada pelas costas. Contrariando Guedes, Bolsonaro decidiu apoiar o projeto de lei que perdoa R$ 17 bilhões em contribuições previdenciárias devidas por empresários rurais, segundo relato feito ao “Valor” pelo presidente da União Democrática Ruralista (UDR) e futuro secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Luiz Antônio Nabhan Garcia.
O futuro ministro, que nunca trabalhou no governo, acredita ter muito a ensinar a Brasília em termos de economia. Pode ser. Antes, no entanto, terá de aprender o que Brasília tem a lhe ensinar em termos de política.
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