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Ótima notícia: os brasileiros estão vivendo mais. Um dos números que ilustram o fenômeno é a quantidade de habitantes com idade a partir de 80 anos, que saltou de 1,8 milhão em 2000 para 4,6 milhões em 2022, segundo o Censo do IBGE. Deve estar perto de 4,8 milhões neste ano, calcula o instituto.
Desde o início do século, a proporção de brasileiros com 80 anos ou mais dobrou, de 1,1% para 2,2%. E ainda crescerá muito. O IBGE estima que o número de pessoas dessa faixa etária vai triplicar nos próximos 30 anos e chegar a 15,8 milhões em 2054, quando elas serão 7,3% da população total.
Os dados foram compilados pelo economista Rogério Nagamine Costanzi, estudioso da Previdência Social.
"Um aspecto marcante do processo de envelhecimento é que uma proporção maior das pessoas que atingem a idade de 60 anos acaba conseguindo viver até 80, 90 ou até mesmo 100 anos ou mais. O resultado é uma população de superidosos que cresce a um ritmo superior não apenas ao da população total como também ao dos idosos como um todo", diz Costanzi em artigo publicado no boletim Informações Fipe, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas.
Os dados são auspiciosos, mas também indicam o tamanho do desafio que o país tem pela frente. "O incremento desses grupos exige um planejamento de médio e longo prazo das políticas de seguridade social, em especial previdência e saúde", avisa o pesquisador.
Uma das perguntas que se impõem é: quem vai pagar as aposentadorias dos superidosos brasileiros?
Mesmo sendo um país relativamente jovem, o Brasil já enfrenta grandes dificuldades nessa área. Em 2023 a arrecadação da Previdência Social correspondeu a 5,5% do PIB, segundo o Tesouro. Bem abaixo do gasto com benefícios, de 8,3% do PIB. A diferença foi coberta por impostos e dívida.
O próprio governo admite que o rombo vai aumentar. A estimativa oficial é de que em três décadas a receita previdenciária será de 5,8% do PIB e a despesa, de 10,1%, conforme projeções anexadas ao Orçamento de 2025. E esses números nem incluem os déficits dos regimes de servidores civis e militares.
Ou seja, serão necessários mais tributos e endividamento para tapar o buraco. Até onde contribuinte e investidor estarão dispostos a financiar essa conta?
Aposentadoria é o gasto que mais aumentou
A Previdência é o gasto que mais subiu nas últimas décadas, ajudando a levar o conjunto das despesas federais para perto de 20% do PIB. Hoje o governo não consegue arrecadar nem esse montante. Qual a chance de que convença o país a colaborar com isso tudo e mais 1,5% do PIB?
O sistema previdenciário oficial, vale lembrar, é de repartição simples. A contribuição cobrada de empregados e patrões não se converte em poupança a ser sacada na aposentadoria; ela é usada para pagar os atuais aposentados e pensionistas. O então ministro Paulo Guedes propôs em 2019 a criação de um regime de capitalização, nos moldes do que ocorre na previdência privada, mas a ideia não prosperou.
A demografia, que muito ajudou nas últimas décadas, jogará contra de agora em diante. A população de jovens e adultos ainda cresce em números absolutos, mas já diminui em termos proporcionais. Não só porque a longevidade aumentou, mas porque a natalidade despencou.
Em 1960, cada brasileira tinha 6,28 filhos, em média. Em 2000, eram 2,32 – ligeiramente acima do índice que garante a reposição da população, de 2,1 filhos por mulher. No ano passado, a taxa de fecundidade foi de apenas 1,57.
É por isso que em não muito tempo a população brasileira vai diminuir. O IBGE acredita que ela atingirá um pico de 220 milhões de habitantes em 2041, passando a cair em seguida.
O país terá cada vez menos pessoas trabalhando, e elas terão de sustentar um número crescente de idosos. Precisaremos ser mais produtivos – mas temos falhado nisso há décadas.
É algo que atormenta quem se põe a pensar no assunto, mas não a classe política. Quando muito, ela oferece demagogia e reajustes insustentáveis na aposentadoria, talvez na expectativa de que tudo se resolva sozinho lá adiante.