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O garotão do Ministério do Trabalho e outros casos bizarros da política brasileira

O jovem Mikael Tavares Medeiros, de 19 anos, sai do Ministério do Trabalho, onde era responsável por administrar quase meio bilhão de reais. Crédito da foto: Reprodução/ TV Globo. (Foto: )

A frase nem é dele. Mas acabou sendo atribuída ao ex-presidente da França Charles de Gaulle (1890-1970): “O Brasil não é um país sério”. Até hoje, as sete palavras ordenadas nessa sequência mexem com os brios dos brasileiros. Mas, convenhamos, nossas autoridades se esmeram em fazê-las verdadeiras. Duvida? Então lá vai: 5 casos bizarros da política que fazem com que o Brasil não pareça um país sério. E só vamos falar de casos mais recentes. E nem entraremos na corrupção em si…

 

1. O garotão do Ministério do Trabalho e sua caneta de meio bilhão de reais

Os últimos serão os primeiros: esta é a história mais nova. Foi contada pelo jornal O Globo na última sexta-feira (9).

Mikael Tavares Medeiros tem 19 anos. Um garotão. Orgulha-se do currículo acadêmico que inclui ter ficado de recuperação no último ano do ensino médio: “qm passa direito é busao kakakwkaka” (sic), escreveu na web. Experiência profissional anterior? Vendedor de óculos numa loja. E só. Conhecimento de políticas sociais? Supostamente profundo: está inscrito como dependente do Bolsa Família que sua mãe recebe.

Foi então que alguém do PTB, “dono” do Ministério do Trabalho, teve a ideia: “Taí, um bom nome”. E Mikael foi nomeado responsável pela coordenação-geral de recursos logístico da pasta. O garotão ganhou uma caneta de meio bilhão de reais para liberar ao longo do ano.

Um dia depois de assumir o cargo, o dedo coçou e Mikael assinou a liberação de R$ 22,49 milhões para a empresa B2T, que presta serviços para o ministério. Aliás, serviços suspeitos de terem sido superfaturados, segundo auditoria da Controladoria Geral da União (CGU). Logo depois, outro pagamento de R$ 8,3 milhões. Ok, prometi não falar de corrupção, mas esse é só mais um dos muitos detalhes da história.

Procurado pelo jornal O Globo, o ministério tentou se justificar em nota. Disse que Mikael tem “alto grau de responsabilidade”. E mais: “Não levamos em conta sua idade, mas sim sua capacidade. Sua nomeação seguiu critérios de conduta ilibada e comprometimento”. Ah, então tá!

Não colou. A demissão de Mikael foi publicada nesta segunda-feira (12) no Diário Oficial da União. Detalhe: sem que ninguém assumisse a paternidade da nomeação dele.

Mas não é difícil encontrar as digitais da indicação. Mikael é filho do presidente do PTB de Planaltina de Goiás (GO), Cristiomario de Sousa Medeiros. E Cristiomario, por sua vez, é aliado do deputado federal Jovair Arantes (PTB-GO), líder do partido na Câmara.

 

2. O Ministério do Trabalho de novo: a quase-ministra e os fortões sem camisa

Se houvesse um concurso de bizarrices, o Ministério do Trabalho vencia fácil. Ou talvez o PTB. A indicação da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) para ocupar o cargo de ministra do Trabalho virou uma novela. Ou, como acabou virando piada na internet, um filme… bem, digamos… não recomendado para menores de 18 anos.

Para se defender do fato de ter pendências na Justiça do Trabalho, Cristiane gravou o antológico vídeo da lancha, em que está cercada de quatro fortões sem camisa.

‘Desnomeada’ pelo presidente Michel Temer, Cristiane disse que ter sido vítima de machismo. “Ficaram falando que eram garotões, sarados. Todos tinham uma barriguinha, estávamos lá com as nossas famílias”, disse.

Ok, vamos dar uma colher de chá para Cristiane. Suponhamos que os amigos dela estivessem com camisas. Ainda assim todo o resto estaria errado. O contexto em que ela gravou o vídeo era de lazer. Um lazer de luxo, por sinal. Quem afinal sai passeando por aí numa lancha? No mínimo pega mal a futura ministra do Trabalho criticar trabalhadores em busca de seus direitos num ambiente que sugere que ela tem dinheiro para desfrutar la dolce vita, mas não para pagar seus funcionários de modo correto.

 

3. Ex-miss Bumbum sensualizando e se exibindo no Ministério do Turismo

Era abril de 2016. O governo de Dilma Rousseff (PT) estava no fim; iria acabar no mês seguinte, tragado pelo impeachment. A debandada de aliados era generalizada. Foi então que o Ministério do Turismo ficou vago e a presidente nomeou para o cargo Alessandro Teixeira, que havia ajudado a elaborar o plano de governo da então candidata à reeleição. A breve gestão de Teixeira, contudo, viria a entrar para a história. Por causa de sua mulher, Milena Santos, a ex-miss Bumbum Miami 2013.

Alheia ao governo que desmoronava, Milena – que se autointitulou primeira-dama do turismo – fez fotos se exibindo e sensualizando na sede do ministério. Aproveitou ainda para mostrar como estava apaixonada pelo marido, em fotos em que trocavam selinhos. E pior: as divulgou numa rede social.

Por meio de nota de sua assessoria de imprensa, Alessandro Teixeira reagiu: “O ministro repudia a exposição dele e da esposa (…). As postagens são na rede social privada dela e (…) mostram a intimidade de um casal apenas”. Bem, rede social (como o nome diz) é social, tanto que as imagens se espalharam. E o ministério é um espaço público, não íntimo. Se não quisesse ser alvo de críticas, não divulgasse nada.

O caso bem que podia ter parado por aí. Mas os holofotes que a ex-miss Bumbum atraiu jogaram luz num caso de nepotismo praticado por Teixeira. Antes de ser ministro, ele era presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) – onde nomeou uma tia de sua mulher para um cargo com salário de R$ 19,48 mil. A tia de Milena acabou sendo demitida.

 

4. O deputado Wladimir Costa: tatuagem fake de Temer, pedido de nude no plenário e assédio a jornalista

Wladimir Costa (SD-PA) é um parlamentar conhecido. Mais pela excentricidade do que por outras qualidades. Estourou um lança-confete ao votar a favor do impeachment de Dilma (numa sessão que, por si só, talvez represente um marco da vergonha alheia nacional pelos discursos bizarros de muitos de nossos parlamentares).

Voltando a Costa… Defensor do presidente, ele tatuou a palavra “Temer” no braço quando o peemedebista podia perder o cargo na votação na Câmara das denúncias dos donos da JBS. O deputado deu a entender que a tatuagem era definitiva. Na verdade, era fake – feita de henna, tinta que sai. Mas conseguiu chamar a atenção para si.

Se ficasse só nisso, Costa apenas entraria para o folclore da política brasileira. Mas ele não é só folclórico. É também machista e ofensivo. Para uma jornalista que pediu que ele mostrasse a tal tatuagem, respondeu: “Pra você, só se for o corpo inteiro”. Trata-se de assédio sexual.

Noutro episódio, foi acusado de distribuir, num grupo de Whatsapp formado por deputados, uma foto da filha adolescente da deputada Maria do Rosário (PT-RS) manipulada digitalmente para mostrar a garota seminua.

Costa também foi flagrado no plenário da Câmara pedindo, em uma conversa no Whatsapp, que uma jornalista mandasse a ele um nude: “Mostra a tua bunda, afinal não são suas profissões que a destacam como mulher, é sua bunda. Vai lá, põe aí, garota”.

Num país sério, o comportamento de Costa não passaria batido na Câmara sem uma punição rigorosa. Mas o Congresso não parece interessado em impor um tratamento sério e respeitoso para as mulheres. Há outros casos mais antigos que corroboram a constatação, como a grosseira declaração de Jair Bolsonaro (PSL-RJ) de que a deputada Maria do Rosário “não merece ser estuprada (…) porque ela é muito feia”.

 

5. Ex-ministro da Justiça cita, no Senado, o renomado jurista “Tomás Turbando”

Parece coisa de colégio e de adolescente. Mas aconteceu durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT), em pleno Congresso. Ex-ministro da Justiça e advogado da então presidente afastada, José Eduardo Cardozo citava no Senado uma série de juristas renomados que haviam emitido pareceres contrários à cassação de Dilma. Dentre eles, incluiu Tomás Turbando – velha pegadinha cacofônica de conotação sexual.

O detalhe surreal da história: a gafe saiu do próprio escritório de Cardozo. “Não foi pegadinha nem nada”, explicou o ex-ministro logo depois. “Eu pedi a relação dos juristas que tinham feito pareceres [a favor de Dilma], e faltava os nomes de alguns juristas completos. Eu pedi no escritório que as pessoas pegassem os nomes, e o rapaz pegou a relação de uma brincadeira que tinha, achou que aquilo era sério e me passou.”

Até que foi engraçado. E, no final das contas, não prejudicou ninguém. Mas ainda assim ajudou a passar a impressão de que o Brasil não é um país sério.

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