Casal faz fotos com o Monumento dos Anéis Olímpicos em Odaiba, na véspera da abertura dos Jogos Olímpicos em Tóquio, Japão, 22 de julho| Foto: EFE/EPA/KIMIMASA MAYAMA
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A abertura dos Jogos Olímpicos de 2020, realizados em 2021, não serão das mais animadas ou produzidas da História, infelizmente. O motivo óbvio é a pandemia, que custou mais de quatro milhões de vidas, oficialmente, com o número real potencialmente maior. Não há clima popular para uma grande celebração, além dos riscos de realizar um evento desse porte, com um estádio cheio de espectadores e mais milhares de profissionais trabalhando.

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Teremos uma cerimônia sóbria, uma homenagem com a mensagem de que a vida segue adiante. Nesse espírito, a coluna segue adiante e com um tema sempre oportuno em anos olímpicos: quais os aspectos para o leitor ficar de olho na relação entre a abertura do evento esportivo e a política internacional.

Teremos algumas novidades e simbolismos na cerimônia de abertura. A Parada das Nações, nome oficial do desfile de bandeiras e delegações, será esvaziada, com alguns poucos porta-bandeiras e autoridades. Muito longe da pompa enorme que nos encantava quando crianças, vendo todas aquelas bandeiras diferentes e atletas de ponta. Um aspecto diferente da Parada deste ano é o fato de que os países seguirão a ordem gojūon, algo como a “ordem alfabética japonesa”, numa simplificação grosseira. O Brasil, por exemplo, será apenas a 150ª delegação. Uma novidade é que será a primeira participação olímpica da Macedônia do Norte com o nome atual, após o acordo com a Grécia e o abandono do provisório Ex-República Iugoslava da Macedônia.

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Refugiados e o Irã

Pela segunda vez, teremos uma delegação de atletas refugiados representados pela bandeira olímpica. Infelizmente, a equipe cresceu de 16 para 29 atletas. O “infelizmente” se dá não pelo direito desses atletas competirem, claro, mas pelo fato de que as crises que causaram esses deslocamentos populacionais não se resolveram. Algumas, inclusive, pode-se dizer que se agravaram desde 2016. São três atletas afegãos, um camaronês, um de cada uma das duas repúblicas do Congo, dois eritreus, cinco iranianos, um iraquiano, quatro sul-sudaneses, um sudanês, um venezuelano e nove sírios. Desses atletas, talvez os casos mais “polêmicos” sejam os dos atletas iranianos.

Uma judoca síria que foge da guerra para os Países Baixos, como Sanda Aldass, por exemplo, é um caso óbvio, quase autoexplicativo. A pessoa se viu em meio uma guerra civil, que destrói seu país e tira a vida de seus conhecidos, e busca refúgio para ter paz e uma vida melhor. Os atletas iranianos, entretanto, são de ponta em suas modalidades. O carateca Hamoon Derafshipour foi medalha de bronze mundial em 2018. A taekwondista Kimia Alizadeh foi medalha de bronze na Olimpíada de 2016, bronze mundial em 2015 e vice-campeã mundial em 2017. Hoje, ele está refugiado no Canadá e ela na Alemanha, ambos fugindo de perseguições políticas. Alizadeh, inclusive, tornou-se uma voz publicamente ativa na denúncia da repressão contra mulheres no seu país-natal.

Outro atleta iraniano da equipe de refugiados é o judoca Javad Mahjoub, cujo nome talvez desperte alguma lembrança ao leitor. Nos jogos de 2012, em Londres, ele abdicou da competição em cima da hora, alegando um “problema gástrico”. Na prática, ele foi pressionado pelas autoridades de seu país, pois o chaveamento o colocou contra um atleta israelense na estreia. Ele já havia sido forçado a tomar uma decisão similar no mundial do ano anterior. Com o crescente destaque conquistado pelos judocas israelenses, algo já visto no nosso espaço, é muito difícil que um atleta consiga disputar uma medalha olímpica sem lidar com a possibilidade de uma disputa contra um judoca israelense.

Mahjoub, então, refugiou-se no Canadá. Aos trinta anos de idade, o campeão asiático de 2013 terá talvez sua única chance de obter uma medalha olímpica. Enquanto é verdade que a coluna está supondo que essa é a razão de sua fuga do Irã, isso é feito com embasamento em exemplo similar. O judoca iraniano Saeid Mollaei, campeão mundial em 2018 e com ampla coleção de medalhas em competições de alto nível, lutará em Tóquio sob a bandeira da Mongólia. No mundial de 2019 ele foi pressionado pelas autoridades a fingir uma contusão e não enfrentar o israelense Sagi Muki pelo ouro. Ele denunciou a situação, o que causou a suspensão do Irã pela Federação Internacional de Judô.

Temendo por sua segurança, ele fugiu para a Alemanha e, depois, recebeu asilo na Mongólia, onde o judô é um esporte fortíssimo. Como um tapa de luva de pelica, ele lutou no Grand Prix mundial de fevereiro de 2021, competição disputada em Israel, levando a prata. É um potencial medalhista para a Mongólia, situação causada pelo comportamento intransigente e agressivo das autoridades esportivas iranianas, que não honra a Trégua Olímpica. Chega a ser chocante que essas mesmas autoridades não percebam que essa política de evitar uma disputa esportiva a qualquer custo com Israel prejudica a própria imagem. A pose pretendida é a de “bastiões contra o sionismo” mas conseguem apenas parecerem antidesportivos e rasteiros.

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Ausências

Outro ponto que vai chamar a atenção na abertura é a ausência da bandeira russa. O país foi banido da Olimpíada pela Agência Mundial Antidoping, devido a adulteração de provas e contraprovas durante as investigações do que seria um esquema de uso indiscriminado e sistemático de substâncias proibidas no país. Tal esquema contaria com participação do Estado russo e, como consequência do banimento, apenas atletas individuais russos aprovados em testes antidoping poderão competir. Ou seja, o ônus da prova foi invertido, com o atleta precisando primeiro comprovar sua inocência. Não haverá possibilidade de competição para equipes russas em esportes coletivos. A solução foi a de atletas russos competindo como “atletas neutros” sob a bandeira do Comitê Olímpico Russo.

As autoridades russas, obviamente, protestaram contra o banimento, assim como alguns atletas. É possível, então, que, dentre os 328 integrantes da delegação, tenhamos competidores russos que demonstrem esse descontentamento ou expressem solidariedade aos seus compatriotas proibidos de competir.

Outras duas ausências nos jogos são a da Coreia do Norte e da República da Guiné. Oficialmente, ambos os comitês olímpicos alegaram preocupações com a pandemia para a ausência. No caso da Guiné, país que nunca ganhou uma medalha olímpica, questões de custos provavelmente também estão envolvidas. Já a situação norte-coreana é mais intrigante.

Recentemente, Kim Jong-un afirmou que o país cometeu “descuidos” com a pandemia. É possível que a Coreia do Norte tenha uma preocupação sanitária em relação aos jogos, como evitar que cidadãos infectados retornem ao país? Sim, é. Ao mesmo tempo, se os jogos fossem em outro país que não o Japão, rival histórico e contemporâneo da Coreia, a mesma decisão seria tomada? Por exemplo, o receio de não desempenhar um bom papel esportivo em terras japonesas, o que poderia ser causa de vergonha nacional. Em 2016, atletas norte-coreanos levaram sete medalhas para casa, incluindo dois ouros, mas todos os atletas, no mundo, tiveram suas preparações afetadas pela pandemia.

Como estão os atletas norte-coreanos? Teriam chances de repetir o desempenho, ou o impacto da pandemia é maior do que o divulgado? A coluna não sabe a resposta. Os norte-coreanos também não disputaram os jogos de Seul, em 1988, no que foi ostensivamente um boicote político. Com a reaproximação entre as duas repúblicas coreanas nos últimos anos, um ato similar, um boicote político, poderia ser visto negativamente. A pandemia, então, serve de “desculpa” perfeita, seja para um ato político, seja para o receio de um desempenho ruim em terras japonesas. Finalmente, independente de questões de política internacional, o país mais falado da abertura provavelmente será, novamente, Tonga, com seu porta-bandeira “besuntadão”, Pita Taufatofua. Pelo menos algo de bem humorado em tempos tão complicados como os atuais.

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