Cartaz de campanha para as eleições israelenses com o líder do Likud e primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e o presidente dos EUA, Donald Trump| Foto: AHMAD GHARABLI / AFP

Pela segunda vez em cinco meses, os cidadãos israelenses vão às urnas escolher o governo nacional. Ao que tudo indica, entretanto, o atual impasse não será desfeito. Em abril, o partido Likud, do premiê Benjamin Netanyahu, ficou em primeiro nas eleições, com 38 assentos. Bibi, o recordista de tempo no cargo de primeiro-ministro, não conseguiu formar uma coalizão governamental e, pela primeira vez na História, o Knesset votou por sua dissolução sem a formação de um governo viável, convocando eleições antecipadas, para esse dia 17 de setembro.

CARREGANDO :)

Como mencionado nesse espaço quando da primeira eleição, um fenômeno comum em eleições parlamentares, especialmente em países com múltiplos partidos, é quando um candidato ganha, mas não leva. Netanyahu ganhou a eleição, ficando em primeiro, mas não levou o prêmio pra casa, a extensão de seu governo. Essencialmente, o que inviabilizou um novo gabinete foi a distensão entre seus aliados da direita religiosa ortodoxa com os da direita secular. O principal motivo é a discordância sobre a obrigatoriedade do serviço militar para os jovens ortodoxos.

Os seculares, como Avigdor Lieberman, do Yisrael Beiteinu, alegam que, se o serviço militar é obrigatório e universal, para homens e mulheres, deve o ser também para ortodoxos. Os religiosos são tradicionalmente isentos do alistamento, por motivos tanto políticos quanto religiosos; o serviço deles à nação estaria nas orações e no estudo dos textos sacros. Essa questão, por décadas, ficou intocada. No século XXI, ganhou crescente papel eleitoral e político, consequência da soma de problemas econômicos, questionamento do serviço militar como um todo e novas gerações de israelenses.

Publicidade

Não há novidade que indique algum acordo entre os dois setores partidários, e Netanyahu precisa tanto dos seculares quanto dos religiosos. Para piorar a perspectiva do governo, as pesquisas indicam um parlamento muito similar ao que já existe. Na média das pesquisas realizadas em setembro, até o dia 12, quando as pesquisas são proibidas pela véspera do pleito, o Azul e Branco, centrista liderado por Benny Gantz, terá 32 assentos, contra os 35 atuais. Já o Likud, hoje com 38, cairia para 31 ou 32. Além de eventuais quedas dos dois maiores partidos, restam os cálculos de possíveis coalizões.

Na direita religiosa, o Shas, o Judaísmo Unido da Torá e a nova coalizão Yamina possuem 22 assentos; nas previsões, sobem para 24. Mais à direita, também religioso, o Otzma Yehudit não possui nenhum assento, com a média das pesquisas prevendo quatro assentos. Na direita secular, o Yisrael Beiteinu possui cinco assentos, podendo dobrar sua bancada; o Zehut, nas pesquisas, não conseguirá o mínimo eleitoral. Na esquerda, os trabalhistas e a União Democrática somam dez assentos, com prévias de 12 eleitos. Finalmente, a Lista Conjunta de partidos árabes deve manter os dez parlamentares.

Pensando que são necessários 61 assentos para viabilizar uma maioria no Knesset, o único cenário plausível para que Netanyahu permaneça no poder é uma coalizão exclusivamente religiosa, com um bom desempenho dos partidos desse espectro político. Indo além, essa é a única coalizão plausível com as atuais pesquisas eleitorais. Mesmo que o Azul e Branco consiga articular uma coalizão que envolva tanto a direita secular quanto a esquerda, o número final não seria suficiente para uma maioria. Já a Lista Conjunta deve manter-se na oposição independente de quem for eleito.

O problema é que, em Israel, após tantos anos com Netanyahu como líder da nação, ele, sua pessoa, se tornou a figura central dessa política. Sua campanha gira em torno da ideia de que, sem ele, o país perderá representatividade internacional, coesão política e terá sua segurança ameaçada. É o candidato da segurança versus a incerteza, o desconhecido; embora Benny Gantz passe longe de ser uma figura desconhecida do público israelense, e tenha a mais alta patente militar israelense. A rejeição a Netanyahu é o que movimenta uma proposta incomum do Azul e Branco.

Gantz já disse que aceita uma coalizão entre seu partido e o Likud, as duas maiores bancadas do parlamento. Sem Bibi, entretanto. Netanyahu não vai aceitar isso, provavelmente, pensando inclusive nas suas prerrogativas legais no cargo, já que ele ainda é alvo de três investigações sobre corrupção. As línguas mais maldosas de Israel dizem que o apego de Bibi ao poder é, na verdade, apego ao foro privilegiado do cargo. Enquanto isso, Israel paga o preço. Seja o preço político, de ficar com um governo interino por meses, seja o preço literal, já que as novas eleições custarão mais de US$ 100 milhões.

Publicidade

A chave para o futuro político de Israel está, então, em breves opções. A primeira é, infelizmente, a mesma escrita aqui em abril, e que se mostrou correta para o momento: "O resultado será a falta de resultado. Um governo provisório que convoque novas eleições, esperando acabar com o impasse. Claro, tudo isso pode mudar com uma renovação no Likud, com uma “renúncia honrosa” de Netanyahu ou um “convite para a aposentadoria” de outras lideranças. Em nome de seus “serviços ao país” (...). O futuro de Netanyahu determinará o futuro de seu país."

A segunda possibilidade é uma vitória dos partidos ortodoxos junto ao Likud, formando, pela primeira vez, um governo não-secular em Israel, país fundado por lideranças trabalhistas e socialistas em uma perspectiva de um sionismo não-religioso. Um governo religioso israelense seria um potencial fenômeno de ruptura nas relações internacionais do país. Finalmente, a possível manutenção do impasse que, pelo ineditismo da situação e pelo perigo de um governo interino por tempo demais, abre o leque de possibilidades mais radicais, como a mencionada retirada de Netanyahu da política.

Outra especulação está na presidência de Israel, uma figura apolítica, atualmente ocupada por Reuven Rivlin. Após o impasse das eleições anteriores, Rivlin aceitou a convocação de novas eleições, após dar o direito de formar um governo ao Likud. Em caso de um segundo impasse, ele pode, antes de aceitar a dissolução de governo, dar ao segundo colocado nas eleições, Gantz, a chance de formar um governo. Embora improvável, não é impossível, e isso seria não uma retirada, mas uma derrota de Netanyahu. Se esse impasse chegará ao fim, saberemos em alguns dias.