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Desde 2007, a Faixa de Gaza é fisicamente bloqueada por terra, ar e mar. O bloqueio é criticado por diversos grupos e organizações e por parte da comunidade internacional como uma violação do direito internacional, especialmente por ser uma punição coletiva contra uma população inteira. Um aspecto pouco conhecido, entretanto, é o fato de que não é apenas Israel que bloqueia Gaza.
Novamente, diante aos eventos dos últimos dias, é importante explicar aos nossos leitores que existem variados aspectos que poderiam ser abordados aqui e que seria impossível abordar todos eles em apenas uma única coluna. Além disso, vocês contam com várias colunas passadas aqui em nosso espaço e com a cobertura da Gazeta do Povo em suas matérias.
Passagens de Gaza
A Faixa de Gaza foi entregue à Autoridade Nacional Palestina na década de 1990, como parte dos Acordos de Oslo, salvo algumas áreas onde existiam assentamentos israelenses. A maioria desses assentamentos era de ultraortodoxos, motivados por perspectivas religiosas sobre a posse da terra. Como parte desse processo, em 1994, Israel começou a construir a primeira cerca Gaza-Israel como medida de segurança.
Naquele momento, foi acordado que existiriam quatro passagens entre a Faixa de Gaza e Israel. Todas as cargas com destino a Gaza, bem como as exportações que passassem por Israel, deveriam utilizar uma dessas passagens e passar por uma inspeção de segurança. Naquele momento existia também uma passagem entre a Faixa de Gaza e o Egito, o corredor Philadelphi, estabelecido em 1982 e inspecionado por Israel.
Em 2005, Israel realizou a retirada unilateral do território. Nesse processo, a passagem entre a Faixa de Gaza e o Egito passou a ser administrada conjuntamente pela Autoridade Nacional Palestina e pelo governo egípcio, na cidade de Rafah. No ano seguinte, ocorre a tomada da Faixa de Gaza pelo Hamas, com a morte de dezenas de palestinos integrantes do partido Fatah e da Autoridade Nacional Palestina.
A origem dessa crise está no ano de 2006, quando o Hamas vence as eleições legislativas palestinas, mas rompe o diálogo com o Fatah, o partido de Yasser Arafat, que havia morrido dois anos antes. O Fatah é o principal partido da Autoridade Nacional Palestina e o responsável pelos Acordos de Oslo. O Hamas rompe com o Fatah por se recusar a aceitar os acordos de Oslo.
Bloqueio
Nesse processo de recusa ocorre a citada tomada da Faixa de Gaza e a rejeição de negociações. Como consequência da tomada do Hamas, a Faixa de Gaza é fisicamente bloqueada, com a justificativa de impedir a passagem de armamentos, dinheiro vindo de fontes suspeitas e o controle de materiais de uso duplo, que podem tanto ter uma finalidade civil quanto serem usados para produzir armamento.
Esse bloqueio, então, dura dezessete anos. Em breve teremos pessoas adultas que nasceram em Gaza e nunca sequer puderam sair de uma pequena faixa de território. Trata-se, deve-se lembrar, de um dos territórios mais densamente povoados do mundo. Mais de dois milhões de pessoas em uma área de 365 quilômetros quadrados. Os mapas enganam, as distâncias na região são muito curtas.
O bloqueio é, com razão, criticado por muitas organizações importantes. Trata-se de uma punição coletiva, algo estritamente proibido pelo direito internacional. Traduzindo: toda a população sofre no lugar da responsabilização individual de integrantes de grupos como o Hamas. O bloqueio restringe ou impede o acesso a alimentos, água potável, medicamentos, combustíveis e outros bens essenciais.
O bloqueio também viola direitos universais básicos, como a liberdade de movimento e o acesso à saúde. O bloqueio prejudica a capacidade dos hospitais em Gaza, a maioria mantidos por organizações como a Cruz Vermelha, de prover atendimento médico adequado devido à falta de eletricidade, suprimentos médicos e a impossibilidade de enviar pacientes para tratamento fora da região.
Dentre algumas organizações que condenam o bloqueio estão, além da citada Cruz Vermelha, a Anistia Internacional, a Human Rights Watch, além de diversos governos nacionais. O leitor, entretanto, deve ter notado que, no nosso breve histórico desse bloqueio, mencionamos que o Egito gerenciava, junto com a Autoridade Nacional Palestina, um dos pontos de passagem da Faixa de Gaza.
Egito
Após a tomada do Hamas, o grupo expulsou os responsáveis pelo monitoramento da passagem e o Egito fechou a passagem de Rafah. Oficialmente, a justificativa é de que aceitar o controle conjunto da passagem com o Hamas minaria a legitimidade da Autoridade Nacional Palestina. Na prática, entretanto, o motivo principal é o fato do Hamas ser um grupo proibido no Egito.
O Egito, assim como a Arábia Saudita, não designa explicitamente o Hamas como grupo terrorista, mas proíbe atividades e relações com o grupo. Na prática, esses países tratam o Hamas como um grupo terrorista, devido suas ligações com a Irmandade Muçulmana, essa sim classificada como terrorista por egípcios e sauditas. Os militares egípcios consideram a Irmandade Muçulmana como a maior ameaça ao país.
A proibição sem designação permite eventuais diálogos em casos necessários e também se relaciona à uma questão de imagem. Classificar o Hamas como terrorista nesses países poderia ser interpretado como apoio à Israel. Além de fechar a passagem de fronteira, o Egito construiu, em 2009, uma barreira subterrânea de concreto e aço ao longo da fronteira, para bloquear túneis de contrabando.
Novamente, o bloqueio comete uma série de violações e pode, e deve, ser criticado. Ao mesmo tempo, não se pode cair em um senso-comum generalista e esquecer que o Egito, um país de maioria árabe e muçulmana, tanto também participa dessas violações quanto não considera o Hamas um ator legítimo, a mesma posição de diversos países. Respostas fáceis podem ser sedutoras, mas muitas vezes não têm propriedade.
Conteúdo editado por: Bruna Frascolla Bloise