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Filipe Figueiredo

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Europa

Novo governo italiano com foco em Salvini

Luigi Di Maio (esq) cumprimenta o presidente da Itália, Sergio Mattarella, após juramento do primeiro-ministro Giuseppe Conte (dir) em cerimônia de posse do novo governo no palácio Quirinale, em Roma, 5 de setembro de 2019 (Foto: Quirinale Press Office / AFP)

A Itália possui novo governo. O Movimento 5 Estrelas (M5S) formalizou uma aliança com o Partido Democrático (PD), com a sigla de centro-esquerda substituindo o partido da direita populista, Lega Nord, no poder. Continuando a discussão iniciada aqui nesse espaço, no dia 16 de agosto, é necessário olhar para os principais desafios para o novo governo. Mais ainda, o que isso significa para o futuro político da Itália?

O novo governo não foi sem sustos. Pouco após o anúncio do acordo, o líder do M5S, Luigi Di Maio, apresentou uma lista de “pontos imprescindíveis” ao primeiro-ministro Giuseppe Conte, como o estabelecimento de um salário mínimo nacional, a recusa em aumento de impostos e uma gradual diminuição do número de parlamentares do país. Sobre os pontos, Di Maio disse: “Se forem acolhidos, ótimo. Senão, melhor irmos para eleições rapidamente".

Novo governo

O tom, e o prazo, soaram como um ultimato. Um vice-secretário do PD escreveu em seu Twitter que aquilo era “incompreensível” e se perguntou se Luigi Di Maio “mudou de ideia? Então que diga claramente". Ainda assim, na terça-feira, os cerca de cem mil filiados ao M5S votaram online se aprovavam ou não a formação da nova coalizão. Um esmagador total de 79,3% dos filiados aprovou o novo governo.

Além da formação de um novo governo, como mencionado na coluna anterior, seria interessante dar uma “gordura” à maioria parlamentar da coalizão, já que a Lega Nord possui 125 cadeiras, contra 111 do PD. A diferença de 14 cadeiras foi compensada com a adição dos Livres e Iguais (Liberi e Uguali no original, sigla LeU), grupo de pequenos partidos de esquerda, liderado por um promotor célebre por processos contra a máfia.

Dos 13 ministérios titulares, seis ficarão com o M5S, cinco com o PD, um com o LeU e outro sem vinculação partidária. Nos oito cargos equivalentes a uma secretaria no governo brasileiro, ocorreu uma divisão igual entre os dois principais partidos. E citar essa dança das cadeiras não é apenas uma questão numérica, mas com algumas questões políticas interessantes aparentes.

Mudanças de pastas

Primeiro, Di Maio, líder do M5S, deixou de ser ministro da Economia e do Trabalho; as duas pastas, brevemente unidas sob sua gestão, voltaram à ser separadas. E ele ocupa o cargo de Ministro de Relações Exteriores. Estará na pasta para orientar a Itália para longe das relações com eurocéticos e populistas afinados com Salvini. Agora, relações mais pragmáticas, como com a China, e menos ruidosas dentro da União Europeia.

Além disso, nessa pasta, Di Maio pretende ocupar mais espaço visual, como rosto da Itália, representante da Itália, o porta-voz dos italianos. Consolidar sua figura e sua posição política, ao mesmo tempo em que, novamente, busca deixar Salvini para trás. Segundo, o Ministério do Interior, anteriormente ocupado por Salvini, será de Luciana Lamorgese. Uma antônima de seu antecessor.

Longe de fortes discursos políticos, Lamorgese é uma jurista sem filiação partidária, uma funcionária pública de carreira que fez parte da administração de grandes cidades, como Milão e Veneza, incluindo a chefatura de polícia. Ela articulou políticas de acolhimento de refugiados em Veneza e já deixou claro que vai reverter diversas políticas de seu antecessor, em uma abordagem, em suas palavras, “técnica e legal”.

A única continuidade de nome e pasta entre os dois gabinetes de Giuseppe Conte é Alfonso Bonafede, ministro da Justiça, filiado ao M5S. Todas as outras pastas foram rearranjadas. Mesmo a Secretaria para o Sul da Itália, principal reduto eleitoral do M5S, trocou de mãos, agora ocupada por Giuseppe Provenzano, do PD, um economista especializado no estudo da discrepância de desenvolvimento entre o norte e o sul italianos.

Salvini é o alvo

Essas mudanças deixam claro o primeiro desafio do governo. Golpear mortalmente (no sentido político) Salvini. A Lega Nord foi tirada do governo, alguns de seus integrantes são investigados por uma oferta pouco republicana em um contrato de gás com empresas russas e Salvini se desentendeu com Mike Pompeo, Secretário de Estado dos EUA. Ainda assim, o ex-ministro do Interior ainda é figura extremamente popular.

Qualquer crise, qualquer rachadura na estrutura desse governo, resultará em fortalecimento de Salvini. Se as eleições fossem hoje, provavelmente ele seria o líder do pleito. Cabe então, para que a coalizão sobreviva e para que os dois partidos saiam fortalecidos, que Salvini seja feito de alvo. Suas medidas revertidas, eventuais fracassos colocados em sua conta e os sucessos apontados como a superação de Salvini.

Parte importante desse cálculo será a postura de Salvini e de seu partido na oposição. A Lega Nord será a maior bancada opositora, seguida de perto pelas 103 cadeiras do Forza Itália. De Silvio Berlusconi, figura amada por uma minoria e odiado pela imensa maioria. Uma aproximação Salvini-Berlusconi fortaleceria a oposição institucional, mas poderia desgastar a imagem de Salvini perante o eleitorado.

Junto com isso, o principal problema italiano que precisa ser solucionado pelo novo governo: a elaboração de um orçamento viável para 2020. Viável tanto no sentido político quanto econômico, já que a situação econômica italiana é longe do conforto. O M5S, inclusive, é mais expansionista do que o PD, visto como um partido que cedeu às políticas de austeridade europeias em governos anteriores.

O governo está formado, o problema está estabelecido e o alvo está posto. Se os próximos meses forem um sucesso, pode ser o prenúncio de uma duradoura aliança partidária. Se for um meio sucesso, uma luta entre os dois partidos atualmente ombreados lado a lado. Em caso de fracasso, Salvini está logo ali adiante, esperando por sua chance de ter os “plenos poderes” que pediu durante as férias.

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