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Filipe Figueiredo

Filipe Figueiredo

Explicações para os principais acontecimentos da política internacional

Surpresa na disputa presidencial

As pesquisas erraram de novo, agora no Equador

eleições equador
Trabalhadores do Conselho Nacional realizam a digitalização dos dados eleitorais após as eleições gerais do Equador, em Quito, em 8 de fevereiro de 2021 (Foto: RODRIGO BUENDIA/AFP)

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Os equatorianos foram às urnas no último final de semana e deixaram uma surpresa para quem acompanha a política internacional. No final de 2020, aqui no nosso espaço, foram publicadas algumas colunas sobre eleições para ficarmos de olho em 2021, divididas por todos os continentes. Claro que algumas ficaram de fora, seja para serem abordadas em textos dedicados no futuro, como em Israel, seja por falta de espaço ou de conhecimento para comentar. Um dos pleitos presentes nos textos, entretanto, foi o do Equador, para decidir tanto a presidência quanto o parlamento unicameral do país. E o que tivemos foi uma surpresa.

Vamos refrescar a memória. Primeiro, sobre o atual presidente, Lenin Moreno não ter disputado o pleito, pois sabia “que sua votação provavelmente seria vexaminosa. Para a esquerda, ele é um traidor de Correa. Para a direita, ele é um oportunista “ex-esquerdista” que não é confiável”. Segundo, sobre o principal candidato da esquerda, Andrés Arauz Galarza, candidato pela Unión por la Esperanza, “coalizão formada para contornar o imbróglio jurídico envolvendo o partido Fuerza Compromiso Social, fundado por Correa, que alega perseguição política. Andrés Arauz está com cerca de 20% das intenções de voto.”

Aqui o primeiro erro das pesquisas e que acabou sendo repassado aos leitores. Com 88% das urnas apuradas, o ex-ministro no governo de Rafael Correa está com 32% dos votos e matematicamente garantido no primeiro lugar para o segundo turno, que certamente ocorrerá. Contra quem o candidato de 36 anos de idade vai disputar o segundo turno? Não sabemos ainda. E esse é o segundo erro das pesquisas eleitorais. Novamente, um resgate de memória daquele texto: “Com cerca de 24% das intenções de voto está o banqueiro Guillermo Lasso, do Movimiento CREO, de orientação conservadora.”

Lasso, segundo colocado nas eleições de 2013, quando foi derrotado no primeiro turno por Rafael Correa, foi também derrotado em 2017, agora no segundo turno, pelo então sucessor de Correa, Lenin Moreno. Essa seria sua redenção, liderando quase todas as pesquisas realizadas até o final de 2020. Um segundo turno era certeza. Nesse momento, ele está com 19,5% dos votos apurados e corre o risco de ficar apenas em terceiro lugar na corrida presidencial, um sério revés comparado com as expectativas e cenários.

Disputa acirrada

Mesmo nas pesquisas realizadas em 2021, que já apontavam Andrés Arauz como o candidato melhor colocado, Lasso estava no segundo turno, com certo conforto. E agora ele terá que disputar, voto a voto, com o candidato Yaku Pérez Guartambel, do movimento Pachakutik, parte de um um grupo maior indigenista de esquerda. Em dezembro de 2020, ele foi assim retratado no nosso espaço: “Yaku Sacha é professor universitário e advogado, e sua candidatura possui cerca de 12% das intenções de voto. É provável que seu eleitorado vote em Andrés Arauz em um segundo turno, contra Lasso.”.

Na ocasião, ele “fechava o pódio”. Na realidade, ele está com 20,1% dos votos. A margem apertada entre o segundo e o terceiro colocado faz com que a autoridade eleitoral equatoriana já tenha declarado que o resultado oficial demorará alguns dias para sair, já que, legalmente, a margem apertada implica em nova verificação. A eleição é realizada com observação da Organização dos Estados Americanos, inclusive. Nos 12% de urnas que restam ser apuradas, tudo pode acontecer. Lasso pode virar e ir para o segundo turno, assim como Yaku Sacha pode aumentar sua vantagem.

Sendo justo, duas pesquisas indicaram o cenário que, no momento, se concretiza. De um universo de dezenas, e nenhuma das duas era de um grande veículo de mídia. Simpatizantes do candidato indígena podem até dizer que era um complô da grande mídia contra seu candidato ou pelo candidato da direita da elite de Guayaquil. A política equatoriana é marcada pela clivagem entre a cidade portuária e a capital, Quito, uma rivalidade que remonta ao imediato pós-independência, com as duas cidades desejando a proeminência econômica e ser a sede de governo.

Curiosamente, embora Lasso seja de Guayaquil, seu melhor resultado foi na província de Pichincha, onde fica Quito. Voltando aos “complôs”, o próprio Yaku Sacha acredita em uma conspiração para retirá-lo do segundo turno e acusa a apuração dos votos de ser fraudulenta. Até o momento, sem apresentar evidência disso. Curiosamente, ele aponta que ambos os candidatos não o querem no segundo turno e por isso estão fraudando a eleição, para manter o “esperado” e temendo que um candidato indígena vença.

No fundo, entretanto, a explicação da eleição pode ser bem mais prosaica, sem precisar de teorias ou de ver um complô nas pesquisas eleitorais. Um resultado surpreendente de uma eleição com baixo comparecimento eleitoral. Apenas 68,7% do eleitorado compareceu, o menor número da História democrática do Equador. A depender das regiões em que o comparecimento foi reduzido, isso pode ter afetado mais um candidato, já que o voto foi bastante marcado pela divisão geográfica, com o interior e o sul favorecendo Yaku Sacha e as províncias costeiras, mais populosas, votando em Andrés Arauz.

Presidencialismo de coalizão

Calma, leitor, que as surpresas ainda não acabaram. Enquanto as pesquisas davam cerca de 3% das intenções de voto para Xavier Hervas, da Izquierda Democrática, ele está em quarto lugar com 15,9% dos votos até agora apurados. O candidato do partido social-democrata não irá ao segundo turno, mas ganha peso enorme para os arranjos partidários do país, devido a um cenário muito parecido com o brasileiro, citado naquela coluna do fim de 2020: um legislativo fragmentado e que requer o “presidencialismo de coalizão". Quais são então os cenários possíveis?

Nos atuais resultados, a maior bancada do parlamento será da base partidária de Arauz, a segunda será a do Movimento Pachakutik, a terceira da Izquierda Democrática e, com porcentagens muito similares, os conservadores Creando Oportunidades e Partido Social Cristiano, em quarto e quinto lugar. Ninguém terá maioria, todos precisarão compor alianças. Arauz, caso eleito, precisará apenas de um complemento para ter a maioria, não precisará do Pachakutik. Caso não seja eleito, provavelmente será oposição, cobrando um preço alto pelo apoio da maior bancada, e tanto Yaku Sacha quanto Lasso precisarão da esquerda moderada em suas alianças.

Ou seja, provavelmente ninguém governará sem o apoio do partido de Xavier Hervas, engenheiro do setor agroexportador que nunca ocupou cargo público e pautou sua campanha na imagem de ser uma alternativa mais ao centro. Uma figura que pode ir de candidato exótico sem chances para fiel da balança política. Numa eleição que se mostra mais surpreendente e acirrada do que o esperado, ainda não sabemos qual será o segundo turno no Equador, mas uma coisa é certa: ela também está mais divertida de acompanhar.

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