Pedestres passam por cartaz de campanha para o referendo sobre o aborto na cidade de Dublin, Irlanda, em 22 de maio de 2018. Naquele ano, o aborto foi aprovado no país europeu| Foto: EFE/AIDAN CRAWLEY
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O primeiro-ministro da Irlanda, Leo Varadkar, renunciou ao cargo na última quarta-feira, dia vinte. Líder de uma coalizão de três partidos, Varadkar já está na História da República da Irlanda, mesmo com sua renúncia, provocada especialmente por dois motivos. A renúncia ao cargo é parte de uma aposta mais ampla, que pode render frutos, mas, ainda assim, como toda aposta, pode não se pagar.

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Varadkar foi taoiseach, palavra gaélica para “chefe” e o título oficial do premiê do país, pela primeira vez em 2017, quando ocupou o cargo até 2020. O médico retornou em 2022, após a mais recente eleição irlandesa. Em 2017, quando tinha 38 anos de idade, tornou-se o mais jovem premiê da História do país. Também tornou-se o primeiro chefe de governo da União Europeia abertamente homossexual.

O sobrenome Varadkar é de origem indiana, e ele foi também o primeiro chefe de governo miscigenado da História da Irlanda, filho de um médico indiano e uma enfermeira irlandesa. Também médico, Leo Varadkar foi ministro da Saúde entre 2014 e 2016. De fato, ele ocupou cinco ministérios diferentes entre 2011 e 2022, passando também pelas pastas de Defesa, Proteção Social, Empresa, Comércio e Emprego e Transportes, Turismo e Esporte.

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Seu partido é Fine Gael, o partido cristão-democrata de centro na Irlanda, que conta com 33 das 160 cadeiras do parlamento. A coalizão de governo é formada com o conservador Fianna Fáil, que tem 36 cadeiras, e com os verdes, donos de onze assentos. O fato de os conservadores terem a maior bancada mas não liderarem o governo se dá por exigência dos verdes para a formação da aliança.

Crise

No total, foram cinco anos no mais alto cargo da república e mais de uma década de serviço público. Jovem, com apenas 45 anos de idade, Leo Varadkar ainda teria muita “lenha para queimar”. O quê explica, então, sua renúncia? O estopim imediato foi o alerta que soou com a derrota do governo no último dia Oito de março, Dia Internacional da Mulher, quando o país realizou um referendo constitucional.

O referendo fazia duas perguntas sobre alterar a grafia de dois artigos da constituição de 1937, que, na visão do governo, retratam um linguajar obsoleto sobre casamento e papéis de gênero. A primeira questão do referendo pedia aos eleitores permissão para tornar a definição de família mais abrangente, substituindo casamento para famílias podem ser estabelecidas “por meio do casamento ou de outras relações duradouras”.

A segunda questão perguntava se o artigo “mães não serão obrigadas por necessidade econômica a trabalhar ao ponto de negligenciar os seus deveres domésticos” poder ser substituído por “O Estado reconhece que a provisão de cuidados entre membros de uma família em razão dos vínculos que existem entre eles, dá à sociedade um suporte sem o qual o bem comum não pode ser alcançado, e se esforçará para apoiar tal prestação”.

A campanha foi apoiada por todos os partidos, incluindo o conservador. Mesmo assim, contrariando todas as pesquisas, o governo foi derrotado de maneira retumbante. Muitos tentaram explicar o resultado na comunicação do governo e na força da Igreja Católica no país. Não se pode perder o horizonte, entretanto, que o voto também foi um protesto contra o atual governo.

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O motivo principal do protesto é a crise de habitação na Irlanda, com um número recorde de pessoas sem teto e altíssimos aluguéis em Dublin, puxando a inflação para cima. Como o país com um dos mais altos Índices de Desenvolvimento Humano do mundo passa por essa crise? Principalmente, leis arcaicas de habitação, que dificultam ou proíbem vários tipos de construção em algumas áreas.

Isso é totalmente contraditório com outros setores muito mais dinâmicos da economia irlandesa, como o setor da tecnologia. Economia pujante essa que atrai muitos imigrantes, incluindo brasileiros. De fato, a economia da Irlanda é tão dinâmica e liberal para investimentos que alguns economistas e juristas classificam o país como um paraíso fiscal, embora essa classificação seja discutível.

Pesquisas e aposta

Como consequência da crise de habitação, o partido está em terceiro nas pesquisas do próximo pleito, que será realizado em março de 2025. Se as eleições fossem hoje, segundo as pesquisas, o Sinn Féin de esquerda teria uma vitória significativa. Já falamos do partido republicano irlandês aqui em nosso espaço antes. Mais recentemente, por sua inédita liderança na Irlanda do Norte, parte do Reino Unido.

A aposta de Leo Varadkar e de seu partido, então, é a da renúncia do premiê para que uma nova liderança possa assumir o cargo e tenha um ano até as eleições. Nesse período, essa nova liderança buscará reverter a crise e a queda de popularidade, buscando a reeleição do partido. O favorito é o atual ministro da Educação, Simon Harris. Curiosamente, aos 37 anos, ele quebraria o recorde de Varadkar.

Alguns leitores podem se lembrar que falamos de uma situação muito parecida em 2022. Naquela ocasião, na Suécia. O então premiê Stefan Löfven, social-democrata, renunciou em novembro de 2021, dando lugar para Magdalena Andersson, que disputou as eleições de outubro de 2022 na liderança do país. A aposta não se pagou, Andersson não conseguiu reverter a tendência das pesquisas e o conservador Ulf Kristersson foi eleito.

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Como mencionado, Varadkar já está na História do seu país, nem que seja pelas portas que abriu. Jovem, é plenamente plausível que retorne à vida pública no futuro. Também é possível que o Sinn Féin fique em primeiro nas eleições, mas não consiga formar um governo. São perguntas para o futuro, que Simon Harris ou quem quer que seja a nova liderança do Fine Gael tentará moldar.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]