Oi, tudo bem?
Este é o meu primeiro artigo escrito para a Gazeta do Povo, então, nada melhor do que me apresentar e dizer por que aceitei o convite para estarmos juntos por aqui todas as semanas.
Tenho 46 anos de idade e sou carioca, mas não daqueles que convivem todos os dias com as muitas paisagens estonteantes presentes nos cartões postais. Sou da Zona Oeste do Rio, onde a paisagem é muito diferente e nada estonteante, pelo menos no que se refere à estética. A Zona Oeste do Rio de Janeiro é uma das regiões mais carentes e perigosas da cidade. Uma periferia de alta densidade populacional que convive com a ausência do poder público, com a pobreza e com a disputa entre milícias e o tráfico. Tiros de todos os calibres, quase sempre, são parte da trilha sonora do cotidiano de um morador da Zona Oeste. Corpos estirados no chão não são uma novidade, bem como a precariedade do transporte público que confina um grande amontoado de gente por metro quadrado como parte de sua rotina.
O bairro onde cresci foi o Bairro Jabour, uma ilha de classe média baixa/baixa cerca de favelas por todos os lados: Sapo, Rebu, Cavalo de Aço, Selva de Pedra, Coreia, dentre outras. Na escola pública do bairro, meu networking inicialmente foi formado por amigos do bairro e das comunidades próximas com quem convivi até o final do ensino fundamental.
Lá em casa, meus pais e minha avó eram parte de uma estrutura familiar que me deu muito amor e apoio. Meu pai, vindo da roça, ascendeu ao posto de Sargento do Exército, e minha mãe atuava como professora de matemática/ciências em escolas públicas em outras comunidades da Zona Oeste. Já minha vó foi uma lavadeira que criou três filhos com muita dificuldade. Eu, eles e minhas duas irmãs, um total de seis pessoas, morávamos em um apartamento de 80 metros quadrados com um único banheiro. No entanto, entendíamos que tínhamos uma realidade muito privilegiada.
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A razão é simples: como meus pais participavam ativamente de projetos sociais ligados à Igreja, passei minha infância e parte da adolescência envolvido diretamente nesses projetos com eles, o que fazia com que não raramente eu me sentisse filho de rico, já que frequentemente brincava com crianças muito pobres. Não conheci a fome, mas percebia a existência dela. Não usava roupas furadas, mas percebia o quanto as roupas e brinquedos que doava eram valorizados. Percebia que o simples fato de ter pai e mãe já representava um diferencial. Cresci assim, em meio às contradições da vida e de seus apuros.
A vida acabou me levando para outros mares. Como filho de funcionários públicos, minha primeira intuição foi seguir o mesmo caminho, quando ingressei no Colégio Naval para cursar o ensino médio depois de aprovado em concurso público para processo de formação de oficiais da Marinha. Que orgulho da família e dos vizinhos! Mas durou pouco. Precisamente dois anos até ser desligado por não ter perfil para ser militar. Sem prestígio e envergonhado, voltei à rotina diária de ônibus lotados para finalizar o ensino médio. Como era bom aluno, estava pronto para estudar Ciência da Computação em faculdade federal, depois de ser aprovado nos vestibulares, mas algo aconteceu…
Aos 18 anos, eu me apaixonei por uma menina de 15 anos de idade. Luciana me encantou, fez meus olhos brilharem, quebrou a lógica que até então seguia, despertou um lado que desconhecia e trouxe algumas certezas aonde as muitas dúvidas que acumulava eram mais frequentes. A primeira delas foi: quero passar o resto de minha vida ao seu lado. Além disso, despertou – pela primeira vez – o meu desejo de ganhar dinheiro, afinal, não existia espaço para pedir dinheiro aos meus pais para ir ao cinema e tampouco para me casar com ela.
Eu tinha um relógio digital. Vendi. Com o dinheiro, comprei mais um e vendi na sequência. Fiz isso umas cinco vezes até conseguir crédito com meu fornecedor que passou a me vender e consignar alguns relógios que vendia sem muita dificuldade. Dois meses depois, decidi iniciar minha “carreira internacional”. Viajei ao Paraguai para comprar mais barato. Foram seis meses durante o ano de 1990, enquanto terminava meu ensino médio, quando vendi vários relógios e pude concluir: primeiro, que consegui minha independência financeira, pelo menos para minhas despesas de adolescente e para sair com a Luciana. Segundo, esta curta experiência de vendas me mostrou que eu era capaz de gerar recursos com o meu próprio trabalho sem depender de meus pais e de um emprego. No meu ponto de vista, na época, estava confiante que conseguiria fazer o mesmo com outro produto.
Em março de 1991, depois de atender a um anúncio do jornal de classificados – lembre-se que não existia internet – comecei a trabalhar, sem carteira assinada, como vendedor numa escola de inglês. Trabalhava na rua, contatando clientes através de telefones públicos a fim de marcar visitas a clientes para apresentar o curso. Só ganhava por comissões. Para ir e voltar do trabalho, no Centro do Rio de Janeiro gastava em média quatro horas e meia por dia. Nesta empresa, pude aprender mais sobre vendas e tive contato com milhares de pessoas. Cresci e amadureci. Não era mais um adolescente da periferia, mas um jovem da periferia buscando encontrar o seu lugar no mundo. Logo percebi que inglês estava se tornando uma ferramenta fundamental para o crescimento de quem estava no mercado de trabalho. Enquanto crescia na empresa, era promovido e ganhava mais, realizei um sonho: casei com a Luciana em 1992. Eu com 20 e ela com 17 anos. Precisamos que nossos pais assinassem uma autorização para o casamento.
Como diretor comercial, em 1994, ganhando bem, mas não o suficiente para acumular capital, decidi pedir demissão para abrir o meu próprio negócio. Em 3 de abril de 1995, com 23 anos de idade e Luciana com 20, nascia a primeira escola da WiseUp no Centro do Rio de Janeiro. Para conseguir reformar os 437m2 de um andar na Rua da Alfândega, na esquina com a Avenida Rio Branco, eu precisei usar R$ 20 mil de nosso cheque especial (R$ 10 mil no meu e R$ 10 mil no cheque especial da Luciana). Como diretor comercial e bom cliente do banco, consegui este super limite que me possibilitou fazer a reforma inicial. O custo do cheque especial foi a bagatela de 12% de juros ao mês e para o mês seguinte, precisava vender para pagar os funcionários, aluguel e outras despesas, além de minhas despesas pessoais. Financeiramente, não podia contar com ninguém a não ser com minha experiência em vendas para gerar o fluxo de caixa necessário para a empresa sobreviver. Não recomendo isso a ninguém, mas faria exatamente tudo de novo e da mesma maneira.
Daqui para frente, vou resumir porque o mais importante eu já disse. A WiseUp cresceu muito rapidamente porque tinha uma proposta de inglês exclusivamente para adultos. Eu abri 24 escolas próprias nas principais capitais do Brasil nos primeiros 3 anos. Aos 26 anos de idade, já havia inaugurado uma nova cada 45 dias e tinha mais de 1 mil funcionários. As primeiras duas escolas foram abertas usando o cheque especial. Já as demais, abrimos com o aporte de capital gerado nas outras escolas. Sem sócios investidores, fundos ou bancos, chegamos em 2013 com 396 escolas, quando vendemos a rede por quase R$ 1 bilhão.
Em maio de 2013, comprei um pequeno clube de 3ª divisão nos EUA, o Orlando City. O compromisso de investimento para colocar o projeto de pé foi de R$ 200 milhões. Em dezembro do mesmo ano, conseguimos ser aceitos na MLS, principal liga de futebol profissional dos EUA. Em 2015, estreamos num jogo com 62.500 torcedores, marcando o gol de empate aos 47 min do segundo tempo.
Quem marcou o gol? O brasileiro Kaká, que jogou no Orlando por três anos. Em 2017, inauguramos o nosso próprio estádio com 100% de capital privado e em 2018, vendemos 8,6% para um investidor francês numa avaliação de R$ 1,8 bilhão, colocando o Orlando City como um dos clubes mais valiosos das Américas, segundo a revista Forbes. Também fundei o meuSucesso.com, uma escola de empreendedores online e o Geração de Valor, um projeto que fomenta o empreendedorismo como forma de mudança de vida e desenvolvimento do país.
Recentemente, tornei público o meu projeto pessoal de encerrar minha carreira como empresário aos 50 anos, em 2022, para me dedicar 100% a projetos sociais. Até lá, uma de minhas atribuições será produzir conteúdos em minhas redes sociais que contam com mais de 5 milhões de seguidores e para veículos selecionados a dedo.
Se você pesquisar na internet, provavelmente vai encontrar muitos rótulos a meu respeito, como: guru, bilionário, magnata do futebol e muitos outros que não me aproprio com orgulho de qualquer um deles. Portanto, vou preferir me rotular apenas como alguém que conhece os dois lados da moeda, que conhece a pobreza e a riqueza, que conhece o ônibus lotado e o avião particular, que conhece o cachorro quente por R$ 1 e restaurantes com três estrelas Michelin. Sou alguém que, mesmo pobre, sempre me senti rico e privilegiado e que, mesmo rico, não me sinto melhor do que ninguém. Tenho um extremo desejo que ver o feio se tornar belo, o rejeitado se tornar desejado e os que antes eram desprezados, tornarem-se foco das atenções. A sociedade é hipócrita para criar rótulos. Inclusive para tachar as grandes massas das periferias como pessoas desqualificadas ou sem perspectivas. Eu vim de dentro de um ônibus lotado da periferia. Portanto, também não aceito esses rótulos.
Eu aceitei estar aqui todas as semanas por um único motivo: para ajudar. Só isso que eu quero. Não preciso mais de nada. Se apenas um leitor for beneficiado por qualquer conteúdo que publique por aqui, já terá valido a pena todo meu esforço, dedicação e exposição a críticas que terei por aqui, em vez de ficar quietinho no meu canto gastando o dinheiro que eu ganhei. Em meu padrão de valores, seguirei neste caminho até 2022. Depois de meus 50 anos, quero começar uma nova fase, mas isso já é outro assunto.
Ah, já ia me esquecendo. Em dezembro de 2017, eu e Luciana comemoramos 25 anos de casados. Temos três filhos, moramos em sete países e carregamos muitas aventuras na bagagem.
Eu continuo apaixonado.
Ela continua linda.
Até semana que vem.