Em North Bay, cidade localizada na região nordeste do distrito de Ontário (Canadá), às margens do Lago Nipissing, nasceu em 1964 Terrence John O’Shaughnessy. Quando tinha 4 anos, seu pai, o ortodontista Terrence O’Shaughnessy, mudou-se com a família para os Estados Unidos, passando a residir em Framingham, Massachusetts. Depois de uma infância e uma adolescência nas quais se destacou como excelente jogador de hóquei, em 1986 o jovem T. J. O’Shaughnessy formou-se na Academia da Força Aérea Americana, de onde partiu para uma carreira militar de sucesso.
Com mais de 3 mil horas de voo (incluindo 168 em combate) a bordo do F-16 Fighting Falcon, T. J. O’Shaughnessy já comandou a 35.ª Esquadrilha da base aérea de Misawa (Japão), o 613.º Centro de Operações Aéreas e Espaciais da base aérea de Hickam (Havaí), e a 57.ª Esquadrilha da base aérea de Nellis (Nevada). Foi diretor de operações do Comando do Pacífico dos EUA, sendo responsável por operações conjuntas em mais da metade do globo, numa área abrangendo 36 Estados-nações.
Foi também vice-diretor de Estado-maior para assuntos político-militares na Ásia, no qual deu forma ao planejamento regional e político das porções pacífica e central do continente, dando suporte aos comandantes do Comando do Pacífico e do Comando Central dos EUA. Foi vice-comandante do Comando das Nações Unidas na Coreia; vice-comandante da Força Aérea americana na Coreia; comandante do Comando de Forças Conjuntas EUA-Coreia; comandante da Sétima Força Aérea, da Força Aérea do Pacífico, da base aérea de Osan (Coreia do Sul), bem como da Força Aérea do Pacífico.
Em função da pandemia, estrategistas americanos se viram forçados a vislumbrar o que chamam de “circunstâncias extraordinárias”, o que, em outras palavras, significa dizer: um estado de guerra
Hoje, O’Shaughnessy comanda o Comando Norte (Northcom) – criado após o 11 de Setembro – e o Comando de Defesa Aeroespacial dos EUA (Norad) – uma operação conjunta EUA-Canadá para monitorar os céus da América do Norte em prevenção a ataques aéreos.
Um currículo tão respeitável trouxe consigo uma grande responsabilidade nesta pandemia de coronavírus. Pois o general de quatro estrelas está sendo cotado para assumir temporariamente o governo dos EUA em caso de adoecimento do presidente e demais civis na linha sucessória, bem como na hipótese de colapso social por causa de uma eventual crise de desabastecimento. Em função da pandemia, estrategistas americanos se viram forçados a vislumbrar o que chamam de “circunstâncias extraordinárias”, o que, em outras palavras, significa dizer: um estado de guerra.
Segundo matéria da revista Newsweek, há em circulação uma série de planos de contingência ultrassecretos (com codinomes tais como Octagon, Freejack e Zodiac) indicando o que os militares devem fazer se os sucessores previstos constitucionalmente estiverem incapacitados. Já em meados de fevereiro, os chamados “combatant commanders” – ou seja, generais que chefiam os diversos Comandos regionais das Forças Armadas americanas – receberam ordens para não apenas proteger Washington, mas também se preparar para a possibilidade de o país ingressar em estado de lei marcial. É nesse contexto que o nome de Terrence John O’Shaughnessy, um dos mais respeitados “combatant commanders” do país, entra em cena. Como brincou um alto oficial entrevistado pela revista: “É bom a América começar a conhecê-lo melhor”.
Pois bem. No último dia 23 de março, em coletiva de imprensa virtual transmitida pela página do Northcom no Facebook, e estranhamente pouco repercutida no Brasil, o general e virtual “comandante” dos EUA em tempos de crise anunciou um dos planos de contingência relativos às “circunstâncias extraordinárias” da pandemia: a transferência de parte significativa do Estado-maior, incluindo os maiores especialistas em segurança nuclear e comandantes de forças especiais, para uma série de bunkers subterrâneos, dentre eles o das Montanhas Cheyenne, no Colorado – um emaranhado de túneis enterrado a 600 metros da superfície, construído na época da Guerra Fria para resistir, em tese, a uma explosão nuclear de até 30 megatons. A justificativa oficial: proteger as forças da ameaça da Covid-19.
“Para garantir a defesa da pátria durante essa pandemia, o nosso comando e equipes de vigilância aqui no quartel-general organizaram-se em múltiplos turnos, sendo que uma parte do nosso pessoal começou a operar no complexo das Montanhas Cheyenne, criando ainda uma terceira equipe em local alternativo” – comunicou o general O’Shaughnessy. E acrescentou: “Os nossos dedicados profissionais do Norad e do Northcom deixaram os seus lares, despediram-se de suas famílias e estão isolados de todos para garantir a manutenção da vigilância diária requerida para a defesa da pátria. Não é, decerto, a situação ideal, mas é absolutamente necessário e adequado em função do momento presente”.
Do outro lado do mundo, o maior parceiro militar dos EUA, Israel, adotou medidas similares. Segundo reportagem da Reuters, o governo israelense pôs em funcionamento o “Centro de Controle Nacional”, um bunker nas colinas de Jerusalém, construído há mais de dez anos por conta da preocupação com o avanço do programa nuclear iraniano e os ataques com mísseis do Hezbollah e do Hamas. “Este bunker é uma outra ferramenta para gerenciar, controlar, mapear e vigiar” o coronavírus, disse um oficial. “Entendemos que essa crise se estenderá ainda por um bom período de tempo.”
Somadas às operações ordenadas por Donald Trump no mar do Caribe e no Iraque, essas são movimentações curiosas no tabuleiro geopolítico do mundo em meio à pandemia. Movimentações de guerra, decerto. Resta saber se o alegado temor da Covid 19 esgota toda a história, e se o vírus é, de fato, o único inimigo contemplado.
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