“[Os militares] pensam que são superiores... Eu não tenho conversa com os militares... Quando eu ganhar, eu vou conversar porque, aí, eu vou ser chefe deles e vou dizer o que eu penso e qual é o papel deles.” (Luiz Inácio Lula da Silva, entrevista coletiva em 16 de agosto de 2021)
Em 11 de fevereiro de 2014, uma terça-feira, houve no Rio de Janeiro uma sessão da assim chamada Comissão Nacional da Verdade, o tribunal revanchista montado pelo PT para humilhar e subjugar os últimos representantes vivos do regime militar brasileiro. Com a presença da então ministra dos Direitos Humanos, a comunista Maria do Rosário, a sessão contou com a participação de um coral cantando a Internacional Socialista. No trecho final do célebre hino revolucionário, os cantores ergueram os punhos cerrados, sendo acompanhados pelos militantes na plateia, que, comandados pelo maestro, também gritaram “Pátria livre!” e “Venceremos!”
Coisa de dois anos antes, em 29 de março de 2012, oficiais da reserva, muitos deles octogenários, haviam sido acuados, ofendidos e agredidos com cusparadas na saída do Clube Militar do Rio de Janeiro por militantes de um movimento chamado Levante Popular da Juventude. Os agredidos participavam de um evento em celebração ao 31 de março de 1964, no qual fizeram muitas críticas à instituição da Comissão da Verdade. Por uma estranha coincidência, o petista Tarso Genro, ex-ministro da Justiça de Lula e então governador do Rio Grande do Sul, passava pelo local no instante da confusão e, ao ser perguntado sobre o ocorrido, chancelou as agressões dizendo que o evento dos militares fora uma “provocação”. Na época, o jornalista Reinaldo Azevedo – que ainda não tinha, como hoje, aderido tão sabujamente ao petralhismo midiático – informou que Genro era um velho amigo do tal “Levante”.
O projeto de poder lulopetista exige oficiais predispostos a agir como força auxiliar da ditadura e reprimir toda oposição, aos moldes do que Hugo Chávez e Nicolás Maduro fizeram com as forças armadas na Venezuela
Desde que o partido chegou à chefia do Executivo pela primeira vez, em 2003, a vingança tem sido a grande pulsão lulopetista para com as Forças Armadas brasileiras, as quais, na visão dos ex-guerrilheiros dos anos 1960, devem ser inteiramente enquadradas – e transformadas em polícia política, como na Venezuela – ou sucateadas. Essa disposição ficou muito clara, por exemplo, por ocasião do impeachment de Dilma Rousseff, que motivou o partido a uma autocrítica de suas estratégias de manutenção do poder. Assim, para quem não lembra, o partido lançou em maio de 2016 um documento intitulado “Resolução sobre Conjuntura”, onde fazia o diagnóstico de sua derrota política e um prognóstico para a retomada do poder, sem o cometimento dos mesmos erros.
“O avanço do movimento golpista, no entanto, somente poderá ser corretamente entendido se avaliarmos, de forma autocrítica, os erros cometidos por nosso partido e nossos governos” – dizia o documento, apontando como um erro principal a estratégia de composição “pluriclassista”, que teria levado o partido a abdicar demais, em favor de acordos e alianças, de sua agenda socialista e revolucionária. “Logo ao assumirmos, relegamos tarefas fundamentais como a reforma política, a reforma tributária progressiva e a democratização dos meios de comunicação” – dizia ainda o documento, enfatizando a necessidade de “democratizar” (leia-se, aparelhar integralmente) o Estado e remover “os entulhos autoritários herdados da transição conservadora pós-ditadura”. O objetivo era declarado em termos abertamente gramscianos: construir uma “hegemonia dos trabalhadores no Estado e na sociedade”, devendo para isso concentrar “todos os fatores na construção de uma força política, social e cultural capaz de dirigir e transformar o país”.
Para a construção dessa hegemonia sobre o Estado e a sociedade, o partido admite ter errado em não aparelhar o bastante as forças de segurança, notadamente a Polícia Federal, o Ministério Público e as Forças Armadas. “Fomos igualmente descuidados com a necessidade de reformar o Estado, o que implicaria impedir a sabotagem conservadora nas estruturas de mando da Polícia Federal e do Ministério Público Federal; modificar os currículos das academias militares; promover oficiais com compromisso democrático e nacionalista”. Por “oficiais com compromisso democrático e nacionalista”, leia-se, obviamente, oficiais comprometidos com o projeto de poder lulopetista, predispostos a agir como força auxiliar da ditadura e reprimir toda oposição, aos moldes do que Hugo Chávez e Nicolás Maduro fizeram com as forças armadas na Venezuela.
Desde a derrota política de 2016, o partido tem se dedicado a promover essa corrupção institucional em seu favor. Tendo conseguido, via aliança estratégica com um STF ideologicamente afim, aparelhar satisfatoriamente boa parte da Polícia Federal – que passou reiteradamente a cumprir ordens inconstitucionais e aberrantes, servindo de instrumento de perseguição política contra apoiadores de Jair Bolsonaro –, o lulopetismo seguiu avançando em sua missão de desmoralizar e subjugar as Forças Armadas. Em dezembro de 2021, por exemplo, o PT realizou o seu Encontro Nacional de Direitos Humanos, ao fim do qual emitiu uma resolução que, na ausência deste, substituiu o plano de governo omitido do público durante o pleito de 2022 (ver, a respeito, a minha coluna de 19 de outubro). Alvo de muitas críticas assim que repercutida, a resolução foi apagada do site do partido, embora ainda possa ser encontrada na internet.
O documento era bastante explícito em apontar os obstáculos ao exercício daquilo que o partido chama de “democracia e dos direitos humanos no Brasil”. Dentre esses obstáculos, destacam-se as Forças Armadas e as polícias militares, ambas encaradas como um inimigo a ser vencido (ou aliciado). “No que se refere às Forças Armadas, sabemos bem que o governo Bolsonaro defende forças armadas que sejam tutoras do poder civil, antagonistas da democracia e dos Direitos Humanos e subordinadas ao Comando Sul dos Estados Unidos”, lia-se na resolução, que não economizava ataques à honra da instituição.
O documento prosseguia nos seguintes termos: “A atual cúpula das forças armadas é cúmplice desta conduta do governo Bolsonaro. Não há como separar as FFAA da catástrofe que é o governo Bolsonaro. Transformaram-se em peça fundamental desde o apoio ao golpe contra a presidente Dilma, à prisão do Lula e construção da candidatura do atual governante. Mais do que participar do governo, avalizam e conduzem as diretrizes políticas e orientações governamentais, aceitam o programa neoliberal de ajuste fiscal, que envolve a eliminação de direitos e privatizações, a supremacia do capital financeiro e submissão à hegemonia americana. As FFAA são uma força importante de governo Bolsonaro, ocupando cargos, exercendo funções chaves e definindo orientações. Os compromissos são mais profundos do que aparentam, os vínculos nasceram na campanha, na montagem do atual governo e na viabilização de suas políticas”. Para resolver o problema, o texto defendia mudanças estruturais na instituição, muitas das quais a serem realizadas via convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte para a elaboração de uma nova Constituição.
A população do país, por ora, ainda vê as Forças Armadas como a mais crível e respeitada das instituições nacionais. Resta saber se essa credibilidade e esse respeito seguirão intactos
Depois de “eleito” (ou, antes, proclamado pelos companheiros do TSE), o descondenado e seus companheiros intensificaram a campanha de desprestígio contra os militares. Em artigo publicado no site da Fundação Perseu Abramo, aparelho teórico lulopetista, dois intelectuais orgânicos do partido sugerem, por exemplo, alterar o artigo 142 da Constituição e limitar o poder das Forças Armadas à defesa externa. A equipe de transição promete também retirar do Exército a responsabilidade pela concessão de registro e pela autorização para aquisição de armas para os caçadores, atiradores e colecionadores (CACs), transferindo-a para a Polícia Federal, instituição já em estado muito mais avançado de aparelhamento. Desconfiado dos militares, ademais, o descondenado optou por contar com segurança da PF. Essa e outras medidas levaram um militante de redação lulopetista a falar abertamente em “disparos” de Lula contra as Forças Armadas.
O projeto lulopetista de venezuelização das Forças Armadas é, portanto, muito claro. Obviamente, os militares brasileiros tendem a rechaçar essa possibilidade, afirmando reiteradamente a sua vigilância e fidelidade à pátria e ao povo que juraram defender. Em outros tempos, jamais essa vigilância e essa fidelidade foram postas em dúvida pela maioria da população do país, que, por ora, ainda vê as Forças Armadas como a mais crível e respeitada das instituições nacionais. Resta saber se, com a inauguração oficial da ditadura socialista no país, que deverá pôr imediatamente em prática os planos declarados de repressão contra os opositores nas ruas, nas redações e nas redes sociais, essa credibilidade e esse respeito seguirão intactos. Tendo em vista a relativa indiferença com que, mesmo em face das ameaças recorrentes dos tirânicos “vitoriosos”, alguns comandantes têm reagido ao clamor angustiado dos manifestantes em frente aos QGs, a sociedade já não parece assim tão confiante. E hoje, ao ouvir a bela canção Fibra de Herói, que sempre lhe infundiu um sentimento de esperança e proteção, teme pela primeira vez estar diante do mais triste réquiem para o Brasil...
“Se a Pátria querida
For envolvida pelo inimigo
Na paz ou na guerra
Defende a terra contra o perigo
Com ânimo forte, se for preciso
Enfrenta a morte
Afronta se lava com fibra de herói
De gente brava
Bandeira do Brasil
Ninguém te manchará
Teu povo varonil
Isso não consentirá
Bandeira idolatrada
Altiva a tremular
Onde a liberdade é mais uma estrela a brilhar”
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