Nesta terça-feira, o presidente eleito falou ao vivo aos que o seguem nas redes sociais. Mesmo com mais de dez dias passados desde que as primeiras notícias sobre o relatório do Coaf foram divulgadas pela imprensa, sua opção foi varrer o assunto para baixo do tapete. Apesar de costumar bater de frente com seus críticos e de ser adepto do “a melhor defesa é o ataque”, Bolsonaro se manteve afastado do tema espinhoso envolvendo seu filho, o senador eleito Flávio Bolsonaro, e o ex-assessor e ex-motorista de Flávio, Fabrício José Carlos de Queiroz. Essa mudança de postura é no mínimo intrigante. Quem acompanha Jair Bolsonaro sabe que ele raramente adota o silêncio (ou o quase-silêncio) como resposta a críticas ou acusações. Mais raro ainda é passar dias e dias sem abordar um assunto envolvendo seu nome, mesmo que tenha sido levantado pela parte da imprensa que ele costuma chamar de fake news.
Quanto aos seus apoiadores mais fiéis, os mesmos que devem compor a imprensa chapa-branca do novo governo, as respostas têm evoluído de outra forma. Logo no início do caso, o discurso nas redes sociais e mídias eletrônicas era “não tem nada demais na movimentação do Queiroz, isso é jogo da imprensa para tentar atingir o presidente eleito”. Passado um tempo, quando os dados divulgados mostraram que havia sim coisa demais nas movimentações do ex-assessor, o discurso passou a ser “que o Queiroz seja punido, mas que seja feita justiça: Flávio Bolsonaro não tem nenhuma obrigação de responder por algo que não é de sua responsabilidade”. Mais alguns dias e, diante de novas descobertas como a do outro assessor que passou meses no exterior enquanto continuava recebendo salário e da assessora que conseguia trabalhar o dia todo como personal trainer de celebridades enquanto também recebia mesada pública, o discurso passou ao nível culinário da fritura, com títulos como “Flávio Bolsonaro precisa se explicar para evitar perda de apoio ao governo”.
O mais esclarecedor nesse episódio tem sido a constatação, ainda que negada pelos bolsonaristas convictos, de que o clã Bolsonaro pratica a mesma política brasileira de sempre, aquela em que assessores pagam pedágio do salário para assessorados, em que a obtenção e manutenção do poder é mais importante que o interesse público, em que há amigos do rei, e mais um monte de coisas que o povo brasileiro tem visto por décadas e décadas. Sem saber como responder aos fatos, o bolsonarismo tem adotado subterfúgios semelhantes aos que o petismo usava quando seus políticos eram alvos de ataques, com destaque para o comparativo dos coitados – “todo mundo faz isso mas a imprensa só tem olhos para Bolsonaro”. Ora, poderia ser diferente, dado que o presidente eleito construiu sua campanha inteira em cima do pilar da moralidade e da justiça? É claro que a grande imprensa brasileira, extremamente alinhada à esquerda, tem feito seu trabalho com muito mais prazer e, quiçá, um certo sadismo. Mas isso não muda o fato de que toda e qualquer irregularidade deva ser devidamente noticiada, investigada e punida. Cabe ainda notar que a fritura de Flávio Bolsonaro, já iniciada nas panelas dos blogueiros e influenciadores neogovernistas, não condiz nem um pouco com a imagem de religiosidade e de união familiar que o clã passou nos últimos quatro anos. Parece que, no final das contas, prevalecerá a tática do boi de piranha.
O novo presidente começará o seu mandato com uma sombra nas costas – se ela se dissipará ou se crescerá, ainda não sabemos. O que podemos inferir é que não será um primeiro ano tranquilo para Jair Bolsonaro. O caso do Coaf é apenas um dos fatores de estresse que já fazem parte da equação. Há ainda as disputas internas de poder em seu partido, as negociações de apoio na Câmara dos Deputados, a organização silenciosa da oposição de esquerda, a ansiedade da população por mudanças rápidas em áreas como segurança pública e educação (temas-chave da campanha eleitoral), e outros esqueletos que porventura estejam guardados em armários ainda não descobertos. Para continuar sendo apoiado pelo povo que lhe confiou o voto, Bolsonaro precisa fazer mais do que se esquivar de assuntos delicados. Afinal, foi a sua postura de confronto e coragem que tanto atraiu os brasileiros fartos da pusilanimidade dos políticos tucanos e seus afins, os quais por tanto tempo fizeram uma oposição fraca e débil aos governos petistas. Em outras palavras, Jair Bolsonaro precisará ser o Jair Bolsonaro que foi anunciado. Ninguém gosta de comprar o hambúrguer bonito da foto e receber um pão amassado com carne sebenta e uma folha de alface murcha em cima.
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