Está explicado o porquê de os democratas terem lutado tanto para evitar a nomeação de Neil Gorsuch para a Suprema Corte americana. Ocupando o lugar que fora do conservador Antonin Scalia, Gorsuch parece estar disposto a levar adiante o legado do antigo dono da cadeira.
Em 2012, a Igreja Luterana da Trindade da cidade de Columbia, Missouri, pediu um auxílio do governo estadual para refazer o piso de um parquinho infantil. O parquinho faz parte da pré-escola operada pela igreja, e o projeto era colocar um piso feito com borracha de pneus reciclados para evitar que as crianças se machuquem em caso de queda. Naquele ano, o estado do Missouri concedeu 14 auxílios, mas negou o da igreja, classificado em 5o lugar dentre 44 pedidos (de acordo com os critérios que regem a concessão do auxílio), simplesmente pelo fato de o parquinho estar localizado no terreno da igreja. O caso foi parar na Suprema Corte, que emitiu seu julgamento no dia 26 de junho passado. Por 7 votos a 2, a corte julgou que a exclusão de organizações religiosas de benefícios estatais é inconstitucional quando esses benefícios estão ligados ao bem-estar geral das pessoas, independentemente de sua religião. Em seu voto, Gorsuch foi além e disse que “os princípios gerais aplicados aqui não permitem a discriminação contra a prática religiosa, seja ela em um parquinho ou em qualquer outro lugar.”
No mesmo dia, a corte também julgou uma ação contra as medidas de proteção de fronteira do presidente Donald Trump. Em decisão unânime, a corte decidiu em favor de Trump, que comemorou dizendo que aquela era “uma vitória clara para a segurança nacional”. Assim, o famoso travel ban (banimento de viagem) de Trump está novamente em vigor, com algumas exceções impostas pelos juízes. Cidadãos de Irã, Líbia, Somália, Sudão, Síria e Iêmen estão proibidos de entrar nos Estados Unidos a não ser que tenham algum relacionamento formal com uma entidade americana – universidades e empresas, principalmente. Apesar de ter sido unânime no momento da votação, a decisão teria sido mais rígida e abrangente se o posicionamento de Gorsuch tivesse prevalecido. Juntamente com os juízes Samuel Alito e Clarence Thomas, ele defendeu que não houvesse restrições e que a medida fosse aplicada exatamente como saiu da caneta de Trump.
Ainda no mesmo 26 de junho, a corte rejeitou um apelo contra uma restrição do porte oculto de armas de fogo em vigor na Califórnia. O estado mais esquerdista da nação possui regras discricionárias em relação ao porte de armas – o cidadão precisa fornecer uma justificativa para o pedido de licença de porte, a qual precisa ser aprovada por um agente público. Embora o apelo tenha sido rejeitado, os juízes Neil Gorsuch e Clarence Thomas emitiram votos contundentes contra a decisão da maioria. Gorsuch disse que o caso levantava questões importantes, e que as discussões com base na Segunda Emenda não estão tendo a atenção que merecem da corte. Suas palavras exatas: “A decisão da corte reflete uma tendência preocupante: o tratamento da Segunda Emenda como um direito desfavorecido.” Ele continuou, dizendo: “Esta corte não ouviu um argumento sequer em casos envolvendo a Segunda Emenda por mais de sete anos. Esta discrepância é indesculpável, especialmente diante do fato de nossa jurisprudência sobre a Segunda Emenda ser muito menos desenvolvida quando comparada à Primeira e à Quarta Emendas.”
Por fim, continuando na mesma segunda-feira, a corte julgou o caso de dois casais de lésbicas que pediram à Suprema Corte o direito de incluir o nome de duas mulheres na certidão de nascimento de uma criança. A Suprema Corte do Arkansas tinha recusado o apelo, que foi acolhido pelos juízes federais. Novamente, Gursuch, Thomas e Alito discordaram da decisão. Gorsuch escreveu em seu voto que não há nada de errado com uma abordagem tradicional de listar somente os pais biológicos em um formulário do governo. Ele também criticou a abordagem da corte, que usou uma decisão de 2015 (sobre casamento entre pessoas do mesmo sexo) como provisão legal para passar por cima do julgamento original da Suprema Corte do Arkansas.
Neil Gorsuch veio para ficar – literalmente, pois sua posição é vitalícia – e para aterrorizar os democratas e toda a esquerda americana. Na composição atual, a corte vive na corda bamba, ora tombando para a direita, ora para a esquerda. O responsável pelo lado é geralmente o juiz Anthony Kennedy, frequentemente chamado de “moderado” por conta de suas inclinações à esquerda em assuntos como aborto e direitos dos homossexuais. Tendo servido como mentor de Gorsuch na década de 1990, Kennedy tem dado a entender que pretende se aposentar em breve. De acordo com Carrie Severino, conselheira-chefe da organização Judicial Crisis Network, é muito provável que ele deixe a corte durante o mandato de Trump. Caso essa saída se confirme, os pesadelos da esquerda americana ficarão muito piores. De acordo com reportagem da Fox News, fontes do governo americano dizem que a Casa Branca está pronta para preencher qualquer vaga que surja na Suprema Corte, e que a estratégia será baseada no sucesso da nomeação de Gorsuch, que tem um índice altíssimo de aprovação pela população. Basta abrir uma vaga para que Trump coloque a segunda andorinha e faça o verão.