A compra do Twitter por Elon Musk, como eu já havia dito em coluna anterior, foi um dos fatos mais importantes do ano, talvez da década. As mudanças vistas na plataforma desde então são muito mais positivas que negativas e, no geral, contribuem para o aumento da liberdade de expressão do cidadão comum.
Como já era de se esperar, muito do que apenas se imaginava como explicação para comportamentos anormais do aplicativo no tocante à limitação do alcance das postagens de certas pessoas com alinhamento político mais à direita que à esquerda finalmente se comprovou como verdade. Na última sexta-feira, uma série de tuítes chamada de “The Twitter Files” (“Os Arquivos do Twitter”), postados pelo jornalista e escritor Matt Taibbi, trouxe à luz um apanhado de mensagens trocadas entre funcionários da empresa, incluindo seus mais altos executivos. Pelo teor das mensagens, fica claro que essas pessoas decidiram se utilizar do poder da plataforma para censurar visões políticas diferentes das suas, para influenciar eleições e para prejudicar e calar influenciadores conservadores.
Taibbi só soltou a primeira leva de mensagens. De acordo com ele, são milhares de documentos internos do Twitter que lhe foram entregues por múltiplas fontes, e que contam “a história de um mecanismo criado por humanos e que cresceu para fora do controle de seu criador”. A referência, conforme se lê nas trocas de mensagens, é ao fundador e antigo CEO do Twitter, Jack Dorsey, que não sabia de muito do que estava acontecendo na empresa que comandava. Fica também claro que a pessoa que teve um papel chave em todas as iniciativas de censura e supressão de conteúdo foi a chefe do Departamento de Políticas e Assuntos Legais da plataforma, Vijaya Gadde, uma das primeiras pessoas a serem demitidas por Elon Musk, pouco tempo atrás.
Os censores do Twitter brincaram de deuses e agiram como demônios. Mas, como diz a própria Bíblia, não há nada oculto que não venha a ser desvendado
Nos próximos dias, Taibbi promete publicar as sequências dos Arquivos do Twitter, conforme conseguir processar a quantidade enorme de informação que obteve. Mas o que foi tuitado por ele na sexta-feira, 2 de dezembro, já dá a ideia do nível de interferência e da falta de vergonha na cara de Gadde e sua turma. Os documentos mencionam comunicações constantes entre as equipes dos presidenciáveis Joe Biden e Donald Trump e os censores do Twitter, durante a campanha de 2020. Sem nenhum pudor, funcionários da plataforma atendiam a pedidos das campanhas para moderar, censurar e banir conteúdo que consideravam prejudicial. Mais ou menos como vimos acontecer neste ano no Brasil, mas com uma empresa privada no lugar do TSE. E, assim como no Brasil, as solicitações do candidato à esquerda, Joe Biden, foram atendidas em muito mais ocasiões e com muito mais rigor que as solicitações do candidato à direita, Donald Trump.
A primeira leva de documentos também traz à tona a história do laptop de Hunter Biden, com detalhes impressionantes. As ações proativas do Twitter incluíram a suspensão da conta da então porta-voz da presidência, Kaleigh McEnany; a supressão de milhares de postagens que traziam conteúdo proveniente da reportagem do NY Post sobre o filho de Biden; e até mesmo a supressão de mensagens diretas, uma medida até então reservada apenas a casos extremos como a troca de mensagens criminosas entre pedófilos. Em princípio, a desculpa escolhida pelo “departamento de censura” do Twitter foi uma certa política de materiais hackeados, supostamente em vigor na plataforma. A desculpa foi usada pela primeira vez pela executiva de Políticas na ocasião, Caroline Strom. Mas, internamente, a história não colou. Um ex-funcionário do Twitter disse a Taibbi que “a política contra hacking era a desculpa, mas bastaram poucas horas para que todo mundo percebesse que isso não colaria. Acontece que ninguém teve a coragem de revertê-la”.
Mensagens subsequentes trocadas entre os executivos da empresa mostram que não houve unanimidade na escolha da desculpa. Trenton Kennedy, então responsável pelas comunicações da empresa, disse em uma das mensagens: “Estou com dificuldade de compreender a base para o uso da política como justificativa para marcar os tuítes como inseguros, e acho que o melhor argumento explicativo para uso externo seria o de que estamos tentando entender se essa história é resultado de materiais hackeados. Teremos de enfrentar questionamentos duros sobre isso se não tivermos uma razão sólida para marcar os links como inseguros”.
O uso da desculpa da política contra hacking era tão pouco verossímil que o vice-presidente de Comunicações Globais do Twitter, Brandon Borman, perguntou em um e-mail: “Podemos verdadeiramente alegar que isso seja parte da política? Isto é, que como parte de nossa abordagem a materiais potencialmente hackeados, estamos limitando a visibilidade de histórias relacionadas no Twitter enquanto nossa investigação acontece”. O questionamento de Borman, no entanto, não gerou nenhum desconforto aos envolvidos. Jim Baker, membro do Conselho Geral, defendeu a censura dizendo que “a precaução é garantida”.
Como mencionei no início, este é apenas o aperitivo de algo muito maior. Conforme Taibbi disponibilizar mais conteúdo, a coluna trará mais informações e atualizações. Afinal, como já mencionei em outro texto, muitos eleitores americanos afirmaram categoricamente que teriam mudado seu voto de Joe Biden para Donald Trump se tivessem tido acesso à história de Hunter Biden. Os censores do Twitter brincaram de deuses e agiram como demônios. Mas, como diz a própria Bíblia, não há nada oculto que não venha a ser desvendado. Aguardemos os próximos capítulos.