| Foto: Reprodução Twitter
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Quando o ano de 2020 terminou, depois de toda a loucura inicial da pandemia e com as vacinas já em início de aplicação, muita gente achou que 2021 seria um alívio. Não foi, como hoje sabemos. No entanto, ao final de 2021, com a pandemia já em seus últimos suspiros e a vida de volta ao normal, muita gente achou que 2022 seria um alívio. E eis que Putin decide fazer uma guerra e chacoalhar um mundo que mal havia saído do último chacoalhão.

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Um breve estudo de geopolítica básica apontará duas razões principais pelas quais Putin decidiu invadir a Ucrânia. A mais óbvia tem a ver com a possibilidade de a Ucrânia se tornar parte da OTAN. Caso isso aconteça, a fronteira leste do tratado estará a menos de 500 quilômetros de Volgogrado, ponto nevrálgico da infraestrutura de transporte de petróleo e gás da Rússia, e não haverá mais uma zona neutra entre os dois lados. Por mais que nossas mentes de pessoas comuns não achem provável que a OTAN inicie um ataque a Rússia, tomando Volgogrado e dominando o acesso do pais ao Mar Cáspio, para o presidente russo essa possibilidade será sempre considerada como real, e por isso a admissão da Ucrânia na OTAN é um ponto inegociável na agenda de Putin.

A segunda razão tem a ver com a Crimeia. Quando Putin tomou a peninsula, em 2014, o objetivo era muito claro: dominar o acesso as reservas energéticas no Mar Negro e impedir que a Ucrânia se tornasse um competidor de peso no fornecimento de gas natural aos países europeus. Lembremos que a venda de gás e petróleo gera quase metade de todo o orçamento do governo federal, incluindo a manutenção e expansão do aparato militar russo. A última coisa que Putin deseja é um novo concorrente bem ali, na loja vizinha. Acontece que a Crimeia é um lugarzinho ruim de se viver. Não há muita água potável por ali. Antes da anexação russa, a população da Crimeia recebia 85% de sua água por meio de um canal construído na era soviética e que conecta a península ao rio Dnieper. Após a anexação, o governo ucraniano bloqueou o canal, cortando o fornecimento de água. E logo no primeiro dia da invasão, 24 de fevereiro, Moscou anunciou que as tropas russas haviam desbloqueado o canal.

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Obviamente que não sabemos o que se passa na cabeça do presidente que já foi agente da KGB. Pouquíssimas pessoas no planeta sabem até onde ele está disposto a ir. Ele poderia, por exemplo, ocupar a faixa sudeste do país, conectando a Crimeia às regiões separatistas de Donetsk e Luhansk, garantindo o desbloqueio permanente do aqueduto e consolidando o domínio de mais da metade da costa ucraniana. Ele poderia ir além, avançando até Kiev e depois recuando até a altura da fronteira norte da Moldávia, tomando metade da Ucrânia e cortando por completo seu acesso ao Mar Negro. Ou ele poderia tomar o país inteiro. Em qualquer dos desfechos, no entanto, a Rússia manterá sua posição de principal fornecedor de gás e petróleo dos países europeus, principalmente da Alemanha, maior economia do continente. Essa dependência tem raízes no movimento irracional de banimento da energia nuclear, uma das formas mais limpas de energia que o homem já inventou. Não deixa de ser irônico que o desastre de Chernobyl tenha sido a faísca desse movimento.

Nos Estados Unidos, a situação é ainda mais irracional. Em seu primeiro dia de governo, Joe Biden assinou ordem cancelando a permissão de construção do oleoduto Keystone XL, que conectaria a província canadense de Alberta aos Estados Unidos. A decisão de Biden foi 100% política: o oleoduto havia recebido sua permissão no governo de Donald Trump, que tinha como plano o fim das importações de petróleo da Rússia, e Biden queria começar o mandato desfazendo aquilo que Trump construiu. Um ano depois, os Estados Unidos estão comprando mais de 650 mil barris de petróleo da Rússia por dia. Keystone XL traria mais de 800 mil barris por dia do Canadá.

Há uma razão clara para Putin ter escolhido esse momento para invadir. Não há alguém forte no ocidente para peitá-lo. Pode parecer simplista, mas não é. Biden é um fantoche e sua família tem conexões espúrias com a oligarquia russa. A resposta americana ao conflito deveria ser dada aqui dentro mesmo, com a retomada de Keystone XL e com novas usinas nucleares. E no tocante a Ucrânia, é necessário manter o país como zona neutra se há de se querer qualquer diálogo com o Kremlin. A preocupação militar de Putin é legítima, ainda que sua invasão seja cruel e desumana. Qualquer pessoa com o mínimo de moral tem a obrigação de condenar a ação russa, mas achar que Putin vai parar porque a Apple deixou de vender seus produtos por lá não passa de ingenuidade pueril.