Os acontecimentos recentes na Rússia, onde o grupo Wagner iniciou uma insurgência contra o governo de Vladimir Putin, evidenciam o abismo de realidade que existe hoje entre as potências ocidentais e o par Rússia-China. Minto: o abismo de realidade é entre as potências ocidentais e o resto do mundo.
Na maior parte da África, pessoas continuam morrendo de fome, desnutrição, falta de saneamento básico (básico do básico, para ser mais preciso), embates tribais, ditadores sanguinários e pobreza generalizada. Quero citar apenas três exemplos, para não deixar o texto demasiadamente longo. A Eritreia, governada por Isaias Afwerki desde 1993, é um dos países mais fechados do mundo. O governo exerce controle rígido sobre todos os aspectos da vida dos cidadãos, com violações generalizadas dos direitos humanos e restrições à liberdade de expressão, imprensa, religião e associação política. A Guiné Equatorial é governada pelo mesmo ditador, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, desde 1979. Seus cidadãos sofrem constantes abusos de direitos e liberdades básicas e a democracia não existe sequer como conceito nesse país. O Chade teve o mesmo presidente por 31 anos; Déby Itno só deixou a posição porque morreu. Itno governou com mão de ferro e nenhum respeito às liberdades e direitos humanos que tanto prezamos. Após sua morte assumiu seu filho, Mahamat Déby, que deu continuidade ao eterno pesadelo que os chadianos vivem.
O brasileiro de hoje, em vez de se ocupar com as tragédias que assolam o país – incluindo a tragédia dos sistemas político e judiciário –, faz coro com o discurso woke
E o que dizer das ditaduras e monarquias islâmicas? Nesses países, ser gay é crime. Na Arábia Saudita, por exemplo, a homossexualidade é considerada ilegal e pode resultar em punições severas, incluindo penas de prisão, multas, chicotadas, deportação e, em alguns casos extremos, pena de morte. No Irã, ser gay é sinônimo de ser criminoso. A pena mais comum para tal crime é a execução. A mesma abordagem existe no Iêmen. Ainda no Oriente Médio, mulheres são consideradas inferiores aos homens em muitos aspectos. Novamente, na Arábia Saudita mulheres precisam de permissão masculina para algumas atividades. No Irã o uso do hijab é obrigatório, enquanto no Iêmen as mulheres nem sequer podem escolher livremente o tipo de educação que querem ter.
Voltando à Rússia e à China, as preocupações do dia a dia são muito diferentes do mundo ocidental desenvolvido. O jovem chinês precisa estudar como louco para conseguir ter alguma vantagem competitiva quando chegar ao mercado de trabalho. Namoro? Tik-Tok? Questões de autoidentificação? Nada disso ocupa suas mentes. No lugar disso, pesadas rotinas de estudo de Matemática, Física e Inglês, para que possam competir em pé de igualdade quando da busca por vagas nas mais renomadas universidades do mundo. Já o jovem russo está sempre sob a ameaça de ter de participar de alguma guerra. E não é uma preocupação banal como “puxa, vou perder um ano de faculdade no exército”. A coisa é bem mais complicada. Ser convocado para um conflito russo se traduz em uma chance bem real de perder a vida.
Enquanto esse mundo de gente enfrenta os desafios da realidade dura em que vivem, o ocidente vive em uma realidade paralela. A grande decepção do jovem ocidental é ser vítima de microagressões ou ter de ouvir alguém palestrar sobre algo que consideram inapropriado. As universidades americanas, que deveriam ser um local de debate e de respeito ao contraditório, se tornaram centros de repetição monotônica de ideologias de esquerda. Mesmo o jovem americano que decide por uma carreira militar tem de enfrentar mais “desafios” relacionados a políticas de diversidade que os embates reais de uma força de guerra. Nas empresas, buscar empregados com excelência acadêmica e alto nível de intelectualidade passou a ser comparado a discriminar os menos capacitados. Um gerente de RH nos Estados Unidos nem sequer pode aplicar um teste de QI ou de capacitação intelectual sob pena de ter de se explicar para os órgãos fiscalizadores sobre as razões da necessidade de tal teste.
E o Brasil? Onde fica nisso tudo? Ora, o Brasil é a jabuticaba de sempre. Não somos desenvolvidos, mas agimos como se fôssemos. O brasileiro de hoje, em vez de se ocupar com as tragédias que assolam o país – incluindo a tragédia dos sistemas político e judiciário –, faz coro com o discurso woke. Some-se isso ao espírito de pão e circo que vive na alma do brasileiro, e o resultado é uma total e completa alienação aos reais problemas da vida adulta e da comunidade. Só isso para explicar a total inação dos brasileiros diante dos absurdos que têm acontecido no país, diante do desrespeito diário às liberdades básicas, diante da censura brutal que o Judiciário – leia-se Alexandre de Moraes – tem imposto a comunicadores de quaisquer esferas.
O mundo ocidental caminha ou para sua queda ou para uma renovação completa, no nível Segunda Guerra Mundial. E o Brasil, nesse quesito, é pioneiro. Já atingiu a queda e continua cavando o fundo do poço.
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