Manifestantes pró-governo participam de ato na Esplanada dos Ministérios.| Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil
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Se o Brasil se limitasse ao que se vê nas redes sociais, eu poderia afirmar categoricamente que três grupos bem distintos, porém igualmente incoerentes, produzem e replicam mais de 95% de todo o conteúdo político dessas redes. Estou falando da esquerda marxista, do meião antibolsonarista e da direita bolsonarista. Quero analisar as manifestações de ontem sob a perspectiva de cada um desses grupos e, na conclusão, sob a minha perspectiva (eu me considero parte de um grupo minoritário e diminuto, o da direita conservadora).

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Comecemos com a esquerda marxista. Estamos falando aqui de petistas, psolistas e revolucionários em geral, gente que defende os regimes de Castro e Maduro, que assume posição radical em favor do aborto, que acredita na submissão do indivíduo ao coletivo, que endossa o identitarismo em todos os seus espectros. No meio dessa turma estão aquelas pessoas que inserem crucifixos em suas vaginas e ânus, que querem a normatização da fluência de gênero, que odeiam a família tradicional, que abominam a religiosidade e demonizam o sucesso individual. Esse pessoal, que costuma se paramentar de vermelho quando vai às ruas, odeia Bolsonaro porque ele é o nêmesis perfeito.

Se o presidente tivesse colocado 20 milhões de pessoas nas ruas ontem, eles ainda diriam que foi um fracasso, que não passou de montagem fotográfica, que a Polícia Militar estava mancomunada e por isso inflou os números, e outras coisas do tipo. Embora não morra de amores pelo Ministro Alexandre de Moraes, a esquerda marxista vai usá-lo como figura máxima de enfrentamento a Bolsonaro. Farão uso, por assim dizer, do dito popular “o inimigo do meu inimigo é meu amigo”.

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A esquerda marxista dá as cartas em muitas redações do Brasil; nas maiores delas, para ser mais preciso. Ela dita o tom de muito do que é vendido como jornalismo mas que, na verdade, não passa de panfletaria ideológica construída sobre uma montanha de distorções de fatos e mentiras sem pudor. Não existe encadeamento lógico para esse grupo, pois a única lógica que seguem é a da derrota a qualquer custo do capitalismo de mercado e da direita política, e de qualquer ideia ou instituição que deles derivem. Os fins justificam os meios é a bíblia da esquerda marxista, e é por isso que jogam tão sujo e agem, se preciso for, com requintes de psicopatia. Essa turma não quer Bolsonaro fora do governo; querem-no morto, de preferência.

O segundo grupo ao qual me referi é o meião antibolsonarista. Preferi usar o termo meião em vez de centrão, porque entendo que esse grupo abrange uma parte da esquerda, o centro e uma parte da direita. São aquelas pessoas com quem, até certo tempo atrás, era possível dialogar honestamente. Afastados dos extremos ideológicos por princípios ou por preferência pessoal, os integrantes desse meião foram por algum tempo tachados de isentos, na época que não tinham ainda aderido aos chavões e às narrativas criados e divulgados pela esquerda marxista.

O meião antibolsonarista foi sempre antipetista. Na época em que o PT era governo, apoiavam inúmeras iniciativas que atualmente se encontram debaixo do bolsonarismo. Voto impresso, direito ao armamento, direito à vida e à liberdade de expressão são alguns exemplos. Não digo que o grupo todo apoiasse todas essas pautas em conjunto, pois não seria verdade. A turma mais à esquerda, por exemplo, jamais abraçou o armamento civil como um direito do cidadão. Mas, no geral, havia equilíbrio suficiente para que esse grupo agisse como uma zona de amortecimento entre extremismos.

Quantos projetos de lei esdrúxulos não foram contidos pela ação do centrão político com a ajuda do meião jornalístico? Muitos. Antes de se tornar antibolsonarista em sua essência, o pessoal do meião prezava pela isenção e pelo equilíbrio. Hoje, infelizmente, tornaram-se um negativo de Bolsonaro, pautando suas opiniões quase que exclusivamente pelas do atual presidente: se ele é a favor, são contra; se ele é contra, são a favor. A justificativa que têm às mãos é sempre a mesma, de que Bolsonaro sequestrou algumas boas pautas e que, por conta disso, não podem mais defendê-las.

Fossem as manifestações de ontem contra Bolsonaro, e não a seu favor, e os influencers do meião diriam que tinha muito mais gente nas ruas do que a PM divulgou. Mostrariam fotos dos quarteirões da Paulista e fariam contas para provar que os números foram superlativos. Foi assim durante todo o processo de manifestações contra Dilma, quando a imprensa tentava diminuir as passeatas e eles lutavam para provar o contrário. Tivesse Alexandre de Moraes prendido algum deles durante um governo petista e pelos mesmos motivos que prendeu alguns bolsonaristas - “crime” de opinião - e estariam soltando texto após texto em defesa da liberdade de expressão.

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Por fim, temos o terceiro grupo, a direita bolsonarista. Em certo ponto do passado, boa parte dos influencers dessa turma andou lado a lado com a turma do atual meião. Quando Bolsonaro assumiu a presidência, a cisão foi consumada. A direita bolsonarista, que antes de 2019 se dizia conservadora como Burke e que vivia citando Sowell, Scruton, Voegelin e Ortega y Gasset, agora admira um político de carreira como seu maior ídolo e mito; messianiza um homem cujo discurso público é desprovido de empatia, misericórdia e amor. Chamam-se de cristãos e defensores da família, ao mesmo tempo em que desprezam os que criticam seu mestre terreno, desejando-lhes o mal e ofendendo-os com os piores xingamentos. Nesse ponto, são realmente bolsonaristas, pois não só imitam como também louvam a falta de freios do presidente, que não se cansa de repetir bobagens e crueldades. “Morreu pouca gente em Pedrinhas. Devia ter morrido muito mais.” Mito! Mito! Mito! “Não sou coveiro.” Mito! Mito! Mito! E assim por diante.

A direita bolsonarista compôs o grosso das manifestações de ontem. Saíram às ruas para defender seu ungido contra o complô diabólico que acreditam existir. Em seu maniqueísmo, tudo o que Bolsonaro faz é bom e tem lógica, ainda que dentro de um intrincado sistema de xadrez de quatro dimensões, e tudo o que fazem contra ele é ruim e diabolicamente comunista (ou comunistamente diabólico). Embora tenham lido os autores que gostavam de citar até um passado recente, assumiram na atualidade a postura de pragmatismo radical. Para eles, querer um conservador verdadeiro não passa de uma utopia no Brasil, e por isso justifica-se a adoção de Bolsonaro como único líder possível no momento.

Mais do que isso, usam da mesma estratégia intelectual do meião para dizer que não faz sentido criticar o governo, porque fazê-lo seria dar munição à imprensa suja e aos adversários do presidente. Em outras palavras, pregam a lealdade incondicional a um deputado obscuro que passou 30 anos mamando nas tetas do Estado brasileiro, votando projetos de acordo com o que fosse mais conveniente para si, para sua família e para seus eleitores, completamente fora de qualquer projeto maior que tivesse o país como um todo em mente.

Eu, que não faço parte de nenhum desses grupos aí de cima, considero as manifestações de ontem significativas em termos de participação popular. Os números que estão sendo divulgados pela imprensa não fazem jus ao que vi nos vídeos e fotos. Bolsonaro levou muita gente para as ruas, mais do que eu esperaria se acreditasse nas pesquisas de satisfação popular divulgadas pela grande imprensa. Se Bolsonaro estivesse realmente corroído como elas indicam, as ruas estariam bem menos cheias no dia de ontem.

Sobre o discurso de Bolsonaro, achei uma peça de populismo regada a chavões messiânicos. “Onde vocês estiverem, eu estarei!”, “Foi Deus quem me colocou na presidência”, “Estou pronto a dar a minha vida por vocês”. Não dá para ser mais populista e manipulador que isso. No entanto, Bolsonaro tem razão em uma coisa, que foi um dos pontos principais das manifestações: o STF está demonstrando um poder muito maior que deveria ter, abusando de sua autoridade para ceifar a liberdade de expressão e implementar uma tirania judicial no país.

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Bolsonaro não é burro, sabe que seus seguidores, ainda que da boca para fora, colocam a liberdade de expressão no mesmo patamar do direito à vida e ao armamento. Obviamente, se fosse um ministro bolsonarista a prender um jornalista de esquerda, grande parte desse pessoal salivaria de satisfação, exatamente como o meião e a esquerda estão fazendo agora. Mas, como as prisões absurdas foram todas de defensores do presidente, estão circunstancialmente do lado certo. O outro ponto muito válido que ele levanta é o das urnas auditáveis e da contagem pública de votos. Novamente, esse ponto era consenso entre todo o pessoal do meião até pouco tempo atrás, a ponto de ter sido tornado em lei pelo Congresso, lei que foi impedida de se tornar válida por uma interferência indevida do STF.

Eu não gosto de Jair Bolsonaro. Acho que ele destruiu a direita brasileira. Acho sua administração ruim e sua conduta pessoal completamente reprovável. No entanto, entre aturá-lo até a próxima eleição e ter um togado com mandato vitalício me dizendo o que posso ou não falar, prefiro Bolsonaro. Continuo torcendo pelo surgimento de uma terceira via factível, mas entendo que um STF com poderes como os de hoje será sempre um entrave à democracia e, principalmente, à liberdade.

Assim sendo, qualquer terceira via que deseje o meu apoio e o apoio de gente como eu terá necessariamente de se posicionar a respeito desse assunto. Nesse ponto, Bolsonaro está certíssimo. E não me importa o motivo de ele assim se declarar. Uma coisa não deixa de ser certa porque um idiota passou a defendê-la. Uma terceira via que não veja as atitudes de Alexandre de Moraes como ameaças à liberdade dos brasileiros não vingará. Não é preciso agir como Bolsonaro para capitanear mudanças necessárias e reformas mais que devidas em nosso país, mas é preciso abraçar algumas das bandeiras do atual presidente. Se ninguém o fizer, ele será novamente a única opção de muita gente na urna.