A primeira segunda-feira do mês de outubro marca o início dos “Termos” da Suprema Corte dos Estados Unidos. As sessões de um Termo continuam até o fim de junho do ano seguinte. Dentro de um Termo, os juízes alternam audiências e recessos em intervalos de duas semanas. Durante as duas semanas de audiências, um máximo de 24 casos podem ser analisados pela corte, com cada lado da disputa recebendo 30 minutos para falar. As sessões ocorrem nas segundas, terças e quartas-feiras, com início às 10 da manhã e término ao meio-dia (daí a limitação de 24 casos). Durante as duas semanas de recessos, os juízes trabalham na elaboração de suas opiniões, votos e pareceres sobre os casos em análise, além de avaliar mais de 100 petições de revisão de julgamentos em esferas inferiores do Judiciário.
Em 4 de outubro de 2021 iniciou-se o Termo atual da Suprema Corte. E, pela primeira vez em quatro décadas, ele começa com apenas três juízes de tendência liberal e seis de tendência conservadora. O temor do Partido Democrata é tamanho que, desde a eleição de Biden, o tema do aumento do número de juízes na Suprema Corte não sai da boca de diversos políticos do partido, especialmente da ala mais radical, como Alexandria Ocasio-Cortez e Ilhan Omar. E os temores não são infundados, especialmente quando consideramos três casos importantes que já foram escolhidos para análise no novo Termo, e que podem trazer grandes mudanças na criação de leis relativas aos seus temas centrais.
Pela primeira vez em quatro décadas, a Suprema Corte começa um Termo com apenas três juízes de tendência liberal e seis de tendência conservadora
O primeiro caso – e, em minha opinião, o mais importante a ser analisado pela Suprema Corte desde 1973 – é sobre a Lei da Idade Gestacional do Mississippi, que proíbe qualquer aborto após a 15.ª semana de gravidez, com exceção de emergências médicas e anormalidade fetal severa. Como já escrevi anteriormente, essa lei foi aprovada em 2018, mas não pode ser colocada em vigência por causa de bloqueio judicial em corte federal. O estado do Mississippi não desistiu da lei, e conseguiu que seu apelo à Suprema Corte fosse aceito e agendado para audiência em 1.º de dezembro de 2021.
Na prática, uma decisão a favor da lei fará com que o entendimento de Roe v. Wade, de que o aborto é permitido até as 20 semanas de gestação, seja abandonado e que o limite menor de 15 semanas seja adotado como jurisprudência dali para adiante. Seria uma grande vitória para a vida humana e para a dignidade dos bebezinhos que hoje são legalmente assassinados aos milhões com requintes de crueldade e sofrimento. Definitivamente, essa será a decisão mais esperada da corte por todos os norte-americanos que se identificam com o conservadorismo e com a defesa da vida humana.
Um outro caso, este proveniente de Nova York, também promete atormentar os liberais, especialmente os favoráveis ao desarmamento da população civil. Atualmente, qualquer morador do estado de Nova York precisa demonstrar uma necessidade especial para obtenção de porte de arma. Para os legisladores estaduais, alegar a defesa própria como motivo não é suficiente para a concessão da licença. Mas eles não contavam com a persistência e inconformismo de Robert Nash e Brandon Koch, dois cidadãos sem nenhuma passagem pela polícia e sem nenhum histórico de crimes. Aos dois foi negado o porte velado de arma sob a alegação de que não satisfaziam o padrão de justificativa do estado. Em vez de uma licença plena, o juiz do caso permitiu que cada um dos autores do caso portasse uma arma apenas de casa para o trabalho, ou quando na prática de caça, ou para defesa própria somente em áreas “não frequentadas pelo público em geral”.
Com a ajuda dos advogados da NRA, Nash e Koch contestaram a decisão com base na Segunda Emenda da Constituição norte-americana, alegando que o direito à defesa própria pode ser necessário em qualquer lugar e a qualquer hora, e que qualquer limitação desse direito é diretamente inconstitucional. O apelo final do caso chegou à Suprema Corte e está agendado para o dia 2 de novembro deste ano. A decisão é esperada para o meio do ano que vem; caso seja em favor dos autores, diversas leis estaduais e municipais que atualmente limitam a concessão de licença para porte de armas podem cair por completo.
A decisão sobre a Lei de Idade Gestacional do Mississippi é a mais esperada por todos os norte-americanos que se identificam com o conservadorismo e com a defesa da vida humana
O terceiro caso de impacto tem relação com o papel da raça de uma pessoa em sua habilidade de ser admitida em uma faculdade. O entendimento vigente da corte é de que as faculdades e universidades podem fazer distinção entre raças dentro do seu sistema de admissão, prática que é conhecida como “ação afirmativa”, muito comum também no Brasil.
O processo que já está na Suprema Corte e que deve voltar a ser discutido neste novo Termo foi movido por um grupo civil chamado Estudantes pela Admissão Justa, em favor de estudantes de origem asiática contra a Universidade de Harvard, no ano de 2014. O grupo contesta o sistema de admissão de Harvard, alegando que ele beneficia negros e hispânicos em detrimento dos orientais. Após decisão contrária no julgamento inicial, o grupo apelou para uma corte distrital em Boston, que manteve a decisão inicial. Sete anos depois, o caso foi parar na Suprema Corte, que, em junho deste ano, adiou a decisão de julgá-lo ou não para o novo Termo. Caso decidam positivamente, será mais um julgamento de grande impacto para todo o país, pois poderá implicar na modificação do processo de admissão de centenas, quando não milhares, de universidades e faculdades.
Serão meses antes que uma decisão sobre esses assuntos seja proferida. Nesse ínterim, será interessante acompanharmos todas as etapas desses processos. A primeira data importante é 2 de novembro. Certamente escreverei sobre o assunto na ocasião.
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