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Corrida das cavernas
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Os homens da caverna não corriam, exceto para garantir a pró­­pria sobrevivência, ao caçar e fugir de ser a caça. Com a evolução, parou de lutar pela comida – aderiu a produtos industrializados, – e a corrida virou uma das principais formas de garantir vida saudável e forma física.

Mas, biologicamente, o ser humano está foi feito para correr longas distâncias? Segundo o economista norte-americano Arthur De Vany, não. Em seu livro The New Evolution Diet, que será lançado em português no Brasil em junho, pela editora Larousse, defende que o ser hu­­mano saudável é aquele que preserva hábitos da era paleolítica, como uma dieta semelhante à dos homens das cavernas, sem adotar treinamentos longos de corrida. A tese está longe de ser consenso, mas o livro virou best-seller nos EUA.

De Vany lista pelo menos dez motivos – baseados em estudos científicos, garante – para não se preparar e correr uma maratona. Entre eles, alguns alarmistas, como lesão permanente dos músculos (inclusive do miocárdio, no coração), danos ao fígado e à vesícula biliar, al­­terações renais, agravamento de tumores cerebrais preexistentes, que podem causar morte precoce.

O ultramaratonista e assessor esportivo da Trainer Asses­­soria Esportiva, Fabio Moralles Alonso, o Tchê, concorda que a maratona não é uma prática para quem quer saúde, mas afirma que os danos são causados quando o esportista não está preparado. “O organismo paga mais em distâncias mais longas, mas não se pode nivelar todos da mesma maneira. Faço corridas de longa distância pelo desafio. Antes de competir, o atleta precisa se preparar adequadamente”, enfatiza.

O doutor em Ciência da Motricidade e professor da graduação em Educação Física da Universidade Positivo (UP) Glé­­ber Pereira afirma que, para entender as conclusões do economista, é necessário distinguir atividade física (caminhadas ou corridas sem nenhuma rotina), exercício físico (atividade programada) e esportes (fo­­cado no rendimento com esforço maior).

Esforço

Esporte para o rendimento, por exemplo, não é sinônimo de saúde, destaca. “Está demonstrado que o sistema imunológico é prejudicado com o alto vo­­lume [quilômetros percorridos] e intensidade [velocidade de corrida] de exercícios. Mas, se houver moderação, a resposta é positiva, como a melhora do sistema imunológico”, afirma.

Ele enfatiza que as pesquisas que servem de argumento para De Vany para os problemas re­­nais e lesões musculares graves causados pelo esforço com a cor­­rida em longas distâncias são antigas. “É preciso ver a qua­­lidade das publicações e principalmente a interpretação de quem faz o uso destas”, ad­­verte. E ressalta que norte-americano se precipita ao generalizar o risco na corrida. “De Vany radicaliza em seus argumentos. Talvez para ganhar espaço na mídia. Nada prova que um corredor vai ter aquele tipo de doença ou que vai morrer assim que cruzar uma linha de chegada”.

Para uma maratona, os profissionais de Educação Física recomendam pelo menos dois anos de prática de corrida regular, com um currículo de pelo menos duas meia maratonas (21 km). Entre os profissionais, é possível perceber o esforço que a atividade cobra dos atletas: a grande maioria da elite entre os maratonistas aparenta ser mais velho do que realmente são.

“Correr 42 quilômetros em uma competição qualquer um faz, mesmo andando ou correndo devagar em alguns trechos. Mas terminar a prova e ter disposição à tarde, daí sim, é para os poucos que realmente estão preparados”. diz Tchê.

Opinião
“Ouvindo” seus genes
Breno Baldrati, editor adjunto do caderno de Econimia e corredor.

Há algo de absurdo na ideia de tentar simular o modo de vida do homem das cavernas nos dias de hoje – isto é, até que você pare para pensar a respeito. Simular, aqui, é palavra-chave. O objetivo da dieta paleolítica, tanto no hábito alimentar quanto na forma de se exercitar, não é viver literalmente como um homem da Idade da Pedra. Não está se incentivando trocar a casa pela caverna ou o supermercado pela caça. O ponto central é entender como seu corpo evoluiu e utilizar o conhecimento e a tecnologia atuais para tirar o máximo de proveito de seu código genético.

Note que um bebê nascido hoje é praticamente indistinguível de um que nasceu 100 mil anos atrás, mas o homem hoje usa o corpo com propósito bastante diferente do que “esperam” seus genes. O corpo humano evoluiu durante milhares de anos em torno de dois extremos do exercício físico: a necessidade de correr muito rápido para caçar ou fugir de um predador, e, no tempo restante, a possibilidade de descanso e caminhadas aleatórias.

Nesse cenário, os exercícios físicos crônicos (como corridas de longa distância) não fazem o menor sentido. Usam apenas as fibras musculares de contração lenta e estimulam a perda das fibras de contração rápida – as principais para se manter jovem. Em se tratando de exercícios, a receita dos defensores da dieta paleolítica é alternar caminhadas com sprints e fazer musculação de alta intensidade.

É ilustrativo lembrar que o nome maratona é uma referência a Marathon, local da batalha entre atenienses e persas na Primeira Guerra Médica. Findo o confronto, o soldado grego Filípides correu 42 km até Atenas para avisar as mulheres que os inimigos haviam sido derrotados. Ao chegar, gritou “Nike” (Vitória) e caiu morto.

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