A receita é antiga: resfriar o corpo ajuda no combate a inflamações. Mas, agora, sabe-se que crioterapia também tem bons resultados na recuperação muscular de atletas
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A cena, por vezes, beira o patético: um grupo de marmanjos disputando espaço dentro de uma piscina plástica infantil. Ou cada um deles dentro de um tonel, com água até a cintura, literalmente, numa fria. Embora visualmente esdrúxula, a situação em que jogadores de futebol, ciclistas e triatletas têm sido cada vez mais vistos tem um efeito revigorante.
Isso porque tanto as piscinas quanto os tonéis têm um poderoso produto responsável por acelerar a recuperação muscular dos atletas: o gelo. O resfriamento é o princípio da crioterapia, que está longe de ser novidade. Há muito se sabe que baixar a temperatura do corpo diminui o risco de inflamações.
Porém o que durante décadas tinha cara de receita da vovó para sarar ganhou comprovação científica não só na recuperação, mas especialmente na prevenção e recuperação muscular dos atletas. Um dos estudos que apontam o benefício do gelo é da mestre em Fisiologia da Performance pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e fisioterapeuta do Atlético, Sara Gabellone Hernandez.
Ela confirmou a melhor recuperação dos músculos das coxas de triatletas em sua dissertação de mestrado. Durante os testes, realizados pelo Centro de Estudos da Performance Física da UFPR, os atletas foram divididos em dois grupos. Ambos foram submetidos a sessões de atividade física intensa no dinamômetro isocinético (aparelho que permite a avaliação objetiva de vários componentes do desempenho muscular). Em seguida, parte deles foi submetida à crioterapia e a outra, não.
Os atletas do primeiro grupo mostraram níveis de recuperação das microlesões causadas pelo exercício melhores que os dos triatletas que fizeram apenas o repouso sem o mergulho no tonel de água gelada.
“Outros estudos, especialmente feitos no futebol, mostram resultados semelhantes. A imersão é uma terapia que não causa dor nem indícios de hipotermia e é uma boa solução. Os atletas também relatam a sensação de melhora física”, diz Sara.
O triatleta Frederico Monteiro, um dos técnicos da Equipe Olímpica Training, foi um dos participantes do estudo e confirma os resultados. “É só comparar a recuperação depois de prova com e sem crioterapia. O Sesc Triathlon, por exemplo, oferece a imersão na água gelada e, no dia seguinte, estou ‘zerado’, pronto para voltar aos treinos normalmente”, diz.
A crioterapia começa a ser utilizada por corredores de provas mais longas e desgastantes. “A subida da Graciosa, por exemplo [20 km de corrida, sendo 14 km em subida pela Estrada da Graciosa, rota de ligação entre o Litoral e a capital paranaense] é um exemplo de competição em que a crioterapia faz um bem para o atleta”, diz o coordenador geral da Trainer Assessoria Esportiva, Fabio Moralles Alonso, o Tchê.
Solução caseira
Tem banheira em casa? Ou piscina infantil? Use-as para uma sessão de crioterapia de imersão. Lembre-se: a técnica é útil para depois de treinos ou competições bastante desgastantes. Coloque na banheira porções de gelo e complete com água, o suficiente para cobrir as pernas. Controle para que a temperatura fique entre 12ºC e 15ºC. O tempo de imersão deve ser entre 15 e 20 minutos. Menos não é suficiente para resfriar a parte interna dos músculos. Mais pode irritar e até queimar a pele.
Como age
O resfriamento muscular faz com que os vasos sanguíneos se contraiam, o que causa a redução da taxa metabólica da região, fazendo com que células “machucadas” durante a atividade física exaustiva precisem consumir menos oxigênio e exijam menos da circulação sanguínea. Assim, mais frio, o corpo necessita de uma circulação menor de sangue, economizando energia e acelerando a recuperação dos tecidos musculares.
Sem frescura
Veja outras formas de entrar numa fria, com baixo custo e eficiência em uma
emergência:
– Saco de gelo – em uma sacola plástica (prefira as mais grossas) coloque cubos de gelo e aplique sobre a região inflamada. A vantagem é que o resfriamento utilizando um produto que vai passar da fase sólida para a líquida potencializa os efeitos da terapia. Mas vede bem o pacote para não vazar. Proteja a pele com uma toalha.
– Lata de refrigerante – deixe-a no congelador para que fique bastante fria. O formato é ideal para aplicar no arco do pé, massageando-o, com a lata no chão, sendo rolada com a pressão do pé. Proteja a pele com uma meia e o chão para não molhar.
– Bolsas instantâneas –ideais para viagens. Podem ser compradas em farmácias e se autorresfriam ao quebrar o conteúdo da embalagem.
– Importante: gelar a musculatura e a articulação alivia dores e são a solução para microlesões. Se a dor se tornar constante, pode ser indícios de uma lesão mais séria. Nesse caso, um médico deve ser consultado e os treinamentos reduzidos.