Obsessão por constante melhora no desempenho é inversamente proporcional à qualidade de vida e à longevidade no esporte. Corredores e médicos sugerem cautela
Os 20 anos de treinamento pesado e rigoroso fizeram com que o ex-atleta de alto rendimento Márcio Magalhães, de 39 anos, sentisse o desgaste natural da idade chegando.
Lesões físicas mais frequentes, fadiga mais intensa e o tempo de recuperação entre uma sessão e outra conscientizaram o hoje treinador de atletismo: o corpo já não é mais o mesmo.
Assim mesmo, ele não desanimou, mas resolveu mudar de foco. “Como estudei Educação Física e sei das limitações biológicas, me conscientizei que já não era mais o mesmo e adaptei meus treinamentos para a minha faixa etária”, diz.
Quando mais jovem, Magalhães chegou a treinar três vezes por dia, totalizando ao menos seis horas de exercícios diários. Hoje, orienta um grupo de corredores na faixa etária dos 40 anos e alerta seus alunos quanto às mudanças do corpo com a idade.
“Hoje penso em qualidade de vida e participo modestamente de corridas de rua, mas procuro estar sempre entre os dez melhores da minha categoria”, explica.
Para o diretor médico da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt), Cristiano Laurino, a chave de um bom exercício é exatamente evitar o raciocínio da quebra de “recordes pessoais” e buscar o ápice – erro comum da maioria dos praticantes de qualquer prova esportiva.
“Quem treina de forma amadora tem uma vida paralela muito ativa e não descansa corretamente, diferente do que acontece com o profissional que vive para correr”, comenta. Ele reforça a tese citando o drama físico dos atletas profissionais. “O esforço exagerado, a busca pelo limite não é saudável.”
Situação similar ao do publicitário e corredor amador Remy Moro, 25 anos. Ele atuou no atletismo de pista por cinco temporadas. Neste período conquistou 17 medalhas de ouro, 17 de prata e 15 de bronze. Após muitas lesões e inflamações, ele resolveu mudar de modalidade.
“Sentia que estava exigindo muito do meu corpo sem ter o retorno que esperava e isso começou a me deixar deprimido”, explica Moro.
Após várias tentativas para melhorar o desempenho, procurando ajuda de um bom treinador, fazendo yoga, tomando suplementos e melhorando sua capacidade respiratória, Moro largou mão do sonho de um dia ir à Olimpíada. “Minha meta hoje é figurar entre os principais nomes nas corridas de rua de Curitiba, abrir uma assessoria esportiva e dividir minhas experiências com outros atletas.”
De acordo com o professor de Educação Física da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Ericson Pereira, existem diversos fatores que fazem com que o corpo diminua seu desempenho com o passar dos anos.
“A massa muscular que gera potência para o corpo diminui porque os corredores não têm mais a mesma regeneração de que de um jovem”, explica. A produção de hormônios, o desgaste de cartilagens, tendões e coração, o aumento de gordura corporal e a diminuição de captação de oxigênio também afetam o desempenho do corpo, enumera o professor.
Pereira recomenda aos corredores ir periodicamente ao cardiologista. “Com treinos intensos chega uma hora em que o nosso coração se desgasta, o atleta não está livre de ter problemas circulatórios”, alerta.