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Cobertura fotográfica de desastres naturais sempre são difíceis de fazer e exigem do profissional muita paciência, determinação e, apesar de todo o cansaço, uma dose cavalar de atenção, seja um tsunami no Japão ou uma enchente no litoral do Paraná. Mas a cobertura da visita ao Rio de Janeiro do presidente norte-americano Barack Obama tem exigido o mesmo grau de dificuldades, ou até mais, de um terremoto ou um tufão. Sem dúvida, está sendo dos trabalhos mais complicados que tive oportunidade de fazer em 23 anos de fotojornalismo.

O esquema de segurança nem se compara com o de um presidente brasileiro, que também já fiz várias vezes em visitas ao Paraná. Se até os ministros da presidente Dilma Roussef foram obrigados a serem revistados pelos homens de preto da Casa Branca, imaginem a imprensa. Mesmo tendo que ficar a uma distância de aproximadamente 50 metros, tive até a minha alma revistada: tirar sapatos para provar que eu não levava nenhuma bomba, detector de metais pelo corpo, um interrogatório sobre meu celular, pelo simples fato de o segurança não conseguir ligá-lo, e olhares sempre desconfiados, muitos olhares desconfiados.

No credenciamento para a cobertura, você já fica sabendo que a coisa não vai ser moleza. Conforme o próprio site da Embaixada Norte-Americana informa, cadastrar-se não é garantia nenhuma de que você realmente vai ter uma credencial. Entre as orientações, a embaixada recomenda que os profissionais da imprensa estejam no local cinco horas antes do horário programado. Chegando lá, você faz uma espécie de check-in no aeroporto, mas muito mais rigoroso: documentos originais e perguntas de toda a espécie. E só depois de ser aprovado por essa bateria de exigências é que você vai saber se o seu credenciamento foi realmente aceito.

Meu parceiro de cobertura, o repórter Sandro Moser, não teve a mesma sorte que eu. Mesmo cadastrado par a cobertura, infelizmente ficou fora da base aérea do Galeão, por onde o presidente Obama chegou ao Brasil. Motivo: excesso de gente. E não adianta reclamar. Com os homens de preto da Casa Branca não tem jeitinho que dê jeito.

Sem meu parceiro de trabalho, parti para a segunda etapa da romaria: os seguranças norte-americanos propriamente ditos. Repórter fotográfico deve ser uma ameaça constante para as autoridades. Afinal, nunca entendi porque tanto segurança para vigiar os profissionais de imprensa. Talvez pensem que alguém vai pular o cercadinho onde sempre põem os jornalistas nessas coberturas e cometer um atentado.

Os locais e horários na agenda da comitiva não são informados. O negocio, então, é tentar intuir para onde vai a muvuca. Ruas trancadas para carros (inclusive para os moradores dessas ruas, imagina para nosso taxi), movimentação grande de policiais de todos os tipos, somados à movimentação da imprensa são indícios de que você está no caminho certo. Mas não há garantia nenhuma de que Obama vai realmente aparecer. E se aparecer, não se sabe onde, o que também diminui a possibilidade de uma boa foto.

Colegas especulam de todas as formas. Moradores dão como certo que o homem vai aparecer nos seus respectivos bairros. Na Cidade de Deus, tem até quem afirme que o presidente vai bater um pênalti numa pelada no campinho da pracinha.

O olho cresce. Afinal, se isso acontecer, sei que será a grande imagem da cobertura. Um presidente norte-americano, negro, num bairro pobre de uma cidade brasileira, jogando futebol. Foto mais emblemática, difícil.

E voltando ao Sandro Moser, não pensem que ele se deu por vencido. Se o jeitinho não cola com a segurança de Obama, com os moradores dá-se um jeito. Como não havia conseguido entrar na base área no dia anterior, o Sandro tratou de ir à Cidade de Deus para fazer o reconhecimento da área. Dessa vez os homens de preto não o iriam impedir de fazer seu trabalho. Ele tratou de fazer umas entrevistas com o povão de adianto e, na base da conversa, conseguiu alugar uma vaga para mim e para ele na laje do barraco de uma moradora vizinha da pracinha onde o homem iria visitar a comunidade. Preço da investida: R$ 100.

Aposta feita e começa a movimentação de seguranças. Em cada telhado, militares com fuzis e binóculos eram vizinhos de fotógrafos, também de olho em tudo. Profissionais de imprensa espalhados por todas as lajes da favela. Cada um apostando na sua informação. Eu, é claro, apostando na batida do pênalti no campinho de terra.

Informações desencontradas começam a dar pistas de que foi tudo em vão e o presidente não vai aparecer. Depois de já ter acompanhado a chegado do big boss na base aérea e ter passado por inúmeras revistas, começo a duvidar de que vão levar o homem a Cidade de Deus.

A tensão começa quando helicópteros começam a sobrevoar a favela. Alguns minutos depois, surge o comboio. Os carros passam ao lado da laje onde eu estava e não param no campinho. O comboio vai pra uma escola próxima. Tem muita gente da imprensa, do mundo todo, e é claro que alguém apostou na escola. Agências e os jornais da cidade cobrem um evento como este com toda a equipe. Portanto, sempre têm alguém nos lugares onde o presidente norte-americano possa aparecer.

Eu e alguns fotógrafos começamos a pensar que perdemos a foto. Alguns que estavam comigo abandonam a laje. Mas eu decido insistir. E não é que a comitiva decide passar bem onde estou e, parece que até combinado, o Obama ainda dá um tchauzinho exatamente na minha direção

Sorte é para quem tem fé. E não seria na Cidade de Deus que Ele iria me abandonar.

As fotos estão aí. Não são as melhores imagens do Obama na favela. Mas para quem não tinha credencial, não conhecia o território e já estava quase sem esperança de conseguir algo, fiquei muito satisfeito com o material que produzi. Yes, We can!

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