Não confunda o M deste boné com o M do Marçal.| Foto: Francisco Escorsim
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Quem aí não tem mais paciência para o chato eleitoral? Pois criei uma técnica eficiente aqui em Curitiba para afastá-lo: a cada encheção de saco demonizando o adversário, digo que votarei no adversário. “Fulana é negacionista!” Parabéns, acabou de conseguir mais um voto para ela. “Fulano é esquerdista!” Parabéns, acabou de conseguir mais um voto para ele. Funciona, experimente.

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Cazuza tem uma música chamada Não há perdão para o chato. Acho que tem razão e, como a música é chata, logo... Outro que cantou sobre o chato foi Oswaldo Montenegro, na autobiográfica O Chato. Se você procurar para ouvi-la, provavelmente o primeiro resultado será a versão ao vivo em que Oswaldo fica uns 3 minutos discursando antes de, enfim, tocá-la. Ao menos a música é até legalzinha.

Mas talvez o chato tenha perdão, sim; afinal, quem não é um pouco chato para alguma coisa? Então, melhor deixar o perdão disponível. Menos para o chato eleitoral, este não dá. Torna-se nesta época seu “desconhecido íntimo”, como dizia Nelson Rodrigues, fazendo parecer que tem proximidade como se fosse amigo de infância, mas você mal lembra o nome dele, se é que alguma vez o viu na vida. Sua única vantagem é ser, ao menos, um chato sazonal.

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Criei uma técnica eficiente para afastar os chatos eleitorais: a cada encheção de saco demonizando o adversário, digo que votarei no adversário

Ainda assim, pode deixar sequelas irreversíveis. Aconteceu comigo, olha que chato isso. Tenho um boné de estimação, herança de meu pai. O boné já estava velho quando ele morreu, mais de dez anos atrás. Imagine hoje. Era de um azul acinzentado que foi estonando com o tempo. Na frente, duas letras em relevo com um tom azulado mais escuro: MC. Na aba, em branco, está escrito “Monaco”, que se repete na parte de trás. Ele trouxe de lá, quando visitou o principado, e costumava usar para fazer suas caminhadas matinais.

Mas nem sei por que estou a descrever o boné – é ele na foto de capa desta coluna. Perdoem a chatice. Mantenho este boné sempre à vista no guarda-roupa, próximo da gaveta das meias. Quem já perdeu alguém vai me entender, guardar essas coisas vale mais do que mil porta-retratos com fotos da pessoa. Volta e meia usava o boné, gostava da sensação de levar meu pai passear. Mas isso não será mais possível. Porque agora não tem como olhar o boné e não lembrar também do de Pablo Marçal. Deus me livre ser confundido com um chato eleitoral.

Enquanto escrevia aqui, veio a notícia de que dois chatos – não só eleitorais – estão brigando em público: Ney Leprevost, candidato derrotado no primeiro turno aqui em Curitiba, e Sergio Moro, cuja esposa foi candidata a vice daquele. Como o primeiro turno em São Paulo provou, a briga entre chatos pode até ser um remédio para a chatice, mas a verdade é que ataca apenas os sintomas, não curando a doença.

A briga acaba, a chatice permanece. Basta ver o segundo turno em São Paulo. Ou alguém aguentou assistir ao debate por lá? Foi tão insuportavelmente chato que soube que o Nunes até andou abraçando Boulos. Chatos e constrangedores. Por aqui, na capital das araucárias, não assisti ao debate entre Cristina Graeml e Eduardo Pimentel, evidentemente. Mas me arrependi ao ver uns trechos no dia seguinte. Se tivesse assistido ao vivo, teria conseguido vencer a insônia antes mesmo de ela chegar.

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Olha aí, quem disse que não há algo de bom que se pode tirar de toda chatice? Mas como seria chato chegar a um objetivo num instante, como ensinou Raul Seixas, melhor ter dito isso no fim deste texto do que na primeira frase. E, para não ser mais chato do que já estou sendo, despeço-me aforismando com Millôr Fernandes: “Quando um chato diz: ‘Eu vou embora’, que presença de espírito”.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]