Quem tem filhos, sabe bem. Não há festa de escola de dia das mães que não coloquem as crianças para cantar o clássico de Roberto Carlos, Como é grande o meu amor por você. E tudo passa como se o amor maior fosse dos filhos, como se eles tivessem tanto pra falar, mas com palavras não saberiam dizer. Mas não é, o amor maior do mundo está nessa hora transbordando em lágrimas comovidas das mães que a tudo assistem como se não fosse o delas, o amor delas, como se o amor de mãe pelos filhos não fosse muito maior e mais bonito do que o céu, as estrelas, o mar, o mundo e o infinito. Mas é.
Como dimensionar um amor tão grande assim? Tem de ser de proporção “bíblica”. Pois daí você vai à Bíblia procurar pelo amor de Maria por seu filho e o que encontra? Da anunciação do anjo Gabriel à ressurreição de Cristo, Maria quase não fala, pouco cobra e apenas o acompanha, testemunha, padece, guardando tudo no seu coração. Ah, esse coração de Maria… Se nossa grandeza está no quanto amamos, imagine a magnitude de Maria! Como não vê-la na mulher do Apocalipse vestida de sol, com a lua debaixo dos seus pés e uma coroa de estrelas sobre a sua cabeça, gritando com as dores do parto?
Se queremos ver como é grande o amor de mãe, temos de procurar no que elas guardam em seu coração. E aí cada um tem de se voltar para o coração da sua mãe. Quando paro pra pensar no da minha, da dona Célia, parece que nem preciso procurar, nada haveria que não transbordasse do coração dela. Minha mãe é toda “para fora”, não se aguenta com nada. Quem a conhece sabe que é impossível imaginá-la quietinha, por exemplo, sem falar (e minha mãe fala tanto, mas tanto, que, se fossem transcrever, a literatura mundial perderia em número de páginas), sem dar pitaco, sem criar um furdunço.
Ela é a tia querida, a amiga divertida, sempre pronta com um sorriso, uma brincadeira, é difícil vê-la de mau humor. Mas não é tanto na extroversão que encontro minha mãe. Pelo contrário. Como no pior momento da vida de nossa família. Fazíamos vigília por meu pai internado na UTI. Alugamos um quarto ao lado do hospital Sírio Libanês, em São Paulo, e eu e meus irmãos nos revezávamos nos dias por lá, junto com ela. Era quando os médicos vinham nos atualizar das condições do pai que eu a via se calar, parecendo murchar. As mãos unidas, como se rezasse o rosário. E acho que era isso que fazia, sem falar nada, mantendo uma calma, uma mansidão que nunca parecia possível que conseguisse ter. Não sei se ela tem noção do quanto nos ajudou naquele período.
Essa é a minha imagem preferida da mãe. Não a da faladora, alegre, companheira divertida, mas a da pequena e frágil mulher aquietada em fortaleza, voltada “pra dentro”, rezando, guardando tudo em seu coração. Não está sendo fácil a distância que temos mantido dela por causa da pandemia. Já não era fácil morar sozinha no mesmo apartamento para onde voltou depois do enterro do marido, mais ainda agora que não recebe nem visitas. Mas há de passar e enquanto não passa, mãe, faça o que a senhora sabe fazer de melhor: leve-nos para dentro do seu coração. Porque nele estamos como eternos piás cantando que nem mesmo o céu, nem as estrelas, nem mesmo o mar e o infinito, nada é maior que nosso amor, nem mais bonito.