Ele não reagiu, sabia ser inútil. Sentado algemado, acompanhava os policiais revirando o quarto, empilhando seus livros. “Tem algum aqui que seria permitida a leitura, senhor?”, perguntou o agente que parecia chefiar a operação. Não respondeu, era inútil.
Em um dos caixotes, vários cadernos, seus diários. O mesmo agente folheava um a esmo. “3 de janeiro de 2073. Encontramos o documento. O primeiro volume da história pode ser agora concluído.” Em anexo, folhas com timbre do 9.º Fórum Jurídico de Lisboa grampeadas. O agente continuaria a leitura, mas interrompeu ainda no primeiro parágrafo, ficando desconfortável. Determinou a continuidade da busca e se sentou na ponta da cama, próximo a ele, lendo em silêncio, parando aqui e acolá em alguns sublinhados:
“PREÂMBULO
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Sessão Plenária do Supremo Tribunal Federal para instituir um Estado Juristocrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução jurídica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de nós mesmos, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
TÍTULO I
DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Art. 1.º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Juristrocrático de Direito e tem como fundamentos:
I - O Supremo Tribunal Federal;
II - a soberania;
III- a cidadania;
IV - a dignidade da pessoa humana;
V - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
VI - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana dos ministros do Supremo Tribunal Federal, que o exercem por meio de si mesmos, nos termos desta Constituição.
Art. 2.º São Poderes da União, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, sendo o Executivo e Legislativo dependentes do Judiciário.”
(...)
“TÍTULO II
DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos convenientes aos ministros do Supremo Tribunal Federal.
(...)
TÍTULO IV
DA ORGANIZAÇÃO DOS PODERES
(...)
CAPÍTULO II
DO PODER EXECUTIVO
SEÇÃO I
DO PRESIDENTE E DO VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Art. 76. O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado, sob tutela dos ministros do Supremo Tribunal Federal.”
O policial dobrou as folhas, guardou o diário e disse, sem olhar para ele, num tom que parecia amistoso: “Isso nunca se realizou, não existiu esta Constituição”. Ele se virou para o agente, incerto. Mas o fiapo de esperança se desfez antes mesmo de se instalar, com ele abaixando a cabeça e respondendo: “Não foi necessário”.
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