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Francisco Escorsim

Francisco Escorsim

A espera terminou

O fim do Advento (ou Então, é Natal)

Natal Advento
Detalhe de "A adoração dos pastores", de Bronzino. (Foto: Wikimedia Commons/Domínio público)

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O Advento é como uma escada. A cada dia, um degrau. A cada fim de semana, um destino. Destino provisório, como porto de passagem, iluminado cada qual por uma vela: a primeira é a da esperança, em cujo cômodo não há paredes, apenas vista para o mundo, um enxergar por cima de todas as coisas, quase a visão de toda a criação, o único olhar que permite dizer, sem falar: “e viu que era bom”.

No segundo andar, a criação aparece reunida em torno de uma mesa, com a chama da vela da paz a tremeluzir. Pequena, mas insistente e resiliente. Ilumina quem está perto, mas também projeta sombras, lembrando que a paz não é apenas o aceitar e se aproximar da luz, mas o escuro do outro também. Quando isso acontece, a vela se torna lareira, com o fogo a crepitar acalentando mesmo nas noites mais frias, exigindo constante cuidado e alimento para não se apagar.

Este último domingo do Advento é a véspera do encontro com este Menino. Uma espera plena de tensão açucarada, como o instante antes de abrir um presente. Aceitaremos?

No pouso da Alegria, a vela se transfigura na que cedo desponta, a Aurora de róseos dedos, a nos receber como Isabel a Maria. A criação é abraçada pela luz. Escuta-se um canto novo, com o “sim” de Maria estabelecendo o tom e a pulsação com que a vida ganhará ritmo e melodia, mas ainda não harmonia, só possível um andar acima, o do Amor. No andar da Alegria, todo amor ainda é um contentamento descontente, é um cuidar que ganha em se perder.

No topo da escada a última vela arde diferente, sem se ver. Uma chama que sussurra: “Eis que eu venho”. E veio. Quando chegamos, descobrimos que não subimos, Ele quem desceu, construindo cada andar, cada degrau, nos buscando e conduzindo, às vezes apontando o caminho, às vezes levando pela mão, quando não no colo. Sem exigir sacrifícios, vítimas, holocaustos, oferendas, mas oferecendo tudo isso encarnado em seu Filho. Apenas veio. Para amar, por amor.

Quem lhe dirá “sim”? Maria foi a primeira, jovem e frágil, mas corajosa para ter fé o bastante. Maria, que viveu o maior dos amores porque se entregou sem reservas. O Amor verdadeiro tem sempre algo de Maria: confia, espera, sofre, mas floresce e dá luz a outros tantos amores, pequenas velas destinadas a queimar com uma dor que desatina sem doer. Com essa chama original Deus criou o céu e a terra e foi bordando a criação com paciência, entrelaçando os fios do espaço e do tempo para compor a figura do Menino na manjedoura.

Este último domingo do Advento é a véspera do encontro com este Menino. Uma espera plena de tensão açucarada, como o instante antes de abrir um presente. Aceitaremos? O presente do Amor que não exige perfeição, mas entrega perfeição para ser cultivada em cada alma. O amor que não avalia se merecemos, apenas oferece todos os méritos, de graça. Com o “sim”, passamos a fazer parte da chama da vela que arde sem se ver.

A depender do progresso da nossa jornada espiritual, estaremos em alguns dos cômodos, com os mais altos a reluzir com mais força a chama da vela nas noites, servindo de farol para viajantes desorientados ou em fuga do “sim”. Mas só chegamos a eles sendo, antes, degraus por onde Ele continua vindo, mesmo quando não encontra quem por sua escada queira subir. Ele fica, então, ao rés do chão, tudo desculpando, tudo crendo, tudo esperando, tudo suportando. E quando Ele é enfim acolhido, acolhendo, só então nascemos. Só então é Natal.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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