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Francisco Escorsim

Francisco Escorsim

Ano novo

Os pensamentos mágicos do ano

Imagem ilustrativa. (Foto: EFE/ Joédson Alves)

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Este ano (ainda é 2022) comecei escrevendo sobre a então recente morte de Joan Didion, autora do ótimo livro O Ano do Pensamento Mágico, no qual narrou o ano de 2004, que assim chamou por ter vivido como se o marido que havia falecido fosse voltar, acreditando nisso, mantendo sua presença viva. Decidi terminar o ano voltando a falar em pensamentos mágicos.

O exemplo de Joan é de um pensamento mágico cuja função é servir de defesa psíquica, uma forma de recusar e se proteger, quando não fugir, de uma realidade considerada hostil, ajudando a sobreviver ao que parece insuportável. O problema é quando perdura mais do que o mínimo necessário. Deduza o que aconteceria a Joan Didion se continuasse acreditando por mais tempo que seu marido não morreu, por exemplo.

Conhecemos bem esta espécie de pensamento mágico; afinal, como sobreviver no Brasil sem ele? A política é boa fornecedora de outros exemplos, tanto à direita quanto à esquerda.

Em 2021 certamente você desejou sinceramente que 2022 fosse melhor, assim como agora deseja que o novo ano também o seja. Que esta esperança não esmoreça no primeiro aumento da gasolina, nem no último.

À direita, o mais notório é o das milhares de pessoas acampadas em protesto defronte quartéis do Exército espalhados pelo país todo, das grandes às pequenas cidades. Lá estão há semanas, dando um exemplo de resiliência e perseverança raro de se ver no Brasil. O que é em parte admirável, sem dúvida, ainda que sustentado por um pensamento mágico, o de que as Forças Armadas farão algo a evitar que o ex-presidiário tome posse.

A esquerda, por sua vez, alimenta-se antes mesmo de Bolsonaro ser eleito do pensamento mágico de que seria um golpista, fascista, genocida etc. Mas está aí o sujeito de saída do governo, sem se despedir nem dos seus, melancolicamente calado e impotente. Tivesse censurado pessoas, prendido, sem que pudessem sequer saber pelo que foram censuradas e presas, sem acesso até mesmo ao número dos processos, aí, sim, teríamos atos antidemocráticos condizentes com uma ditadura.

E o que dizer do pensamento mágico da superioridade moral dos que não votaram nem em Lula, nem em Bolsonaro? Como se anular, votar em branco ou simplesmente não votar não fosse algo decisivo para a definição do vencedor... Todo aquele que não votou, anulou ou deixou em branco, pouco importam as razões para tanto, contribuiu para a vitória do eleito, fosse ele quem fosse, goste-se ou não. Conheço vários autointitulados conservadores que pensam muito magicamente que não são cúmplices. Creem-se céticos políticos, mas são apenas devotos da sua vaidade imaculada.

Mas há outras espécies de pensamento mágico. Fins-de-ano, aliás, são uma época propícia para o surgimento daquela cuja função é dar corpo à esperança. O problema é quando não perduram o máximo necessário, transformando a esperança em ilusão. Eis aí nossas promessas de ano-novo, em geral raramente cumpridas e rapidamente esquecidas.

Mas, independentemente de promessas, em 2021 certamente você desejou sinceramente que 2022 fosse melhor, assim como agora deseja que o novo ano também o seja. Que esta esperança não esmoreça no primeiro aumento da gasolina, nem no último. É meu pensamento mágico de ano novo, caro leitor. Obrigado pela companhia por aqui, vemo-nos em 2023, se Deus quiser.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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