Imagem ilustrativa.| Foto: Marcio Antonio Campos com Midjourney
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Funcionou? Seja bem-vindo(a). Ficou sabendo do acontecido no curso de formação inicial de magistrados do TJMG? Dentre os temas tratados houve o de “proteção do vulnerável, acesso à Justiça e direito antidiscriminatório”. Foi ministrado por uma juíza aposentada que levou um convidado para falar: um egresso do sistema prisional que hoje é advogado.

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Façamos uma pausa aqui, antes de saber o que aconteceu durante a aula. Parece haver algo de errado na ideia da professora? A maioria desses juízes conhece pouco da realidade que encontrará, é mais especializada em estudar para concurso do que em ter experiência de vida e de chão de fórum. Então, levar alguém que cometeu um crime, cumpriu sua pena e reconstruiu sua vida para falar a juízes iniciantes me parece boa ideia, não somente acertada, como necessária.

O crime cometido, pelo qual o palestrante foi condenado a 16 anos e 5 meses de prisão em 1997, foi um homicídio de uma criança de 5 anos

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Sigamos. Segundo relatos de alunos, o convidado, porém, foi provocativo e panfletário. Em sua fala, ironizou o Judiciário, atacou a polícia e defendeu o abolicionismo penal e a legalização das drogas. Por óbvio, isso não “pegou bem” e alguns foram pesquisar melhor sobre quem era. Descobriram que o crime cometido, pelo qual o palestrante foi condenado a 16 anos e 5 meses de prisão em 1997, foi um homicídio de uma criança de 5 anos. Também foi acusado pelo Ministério Público de estupro do menor (pouparei o leitor da descrição das agressões e da causa da morte), embora não tendo sido condenado por isso, segundo a professora disse em postagem no seu perfil no X.

Estava feita a confusão em sala de aula. Por óbvio, tornou-se pública, desaguando na imprensa e redes sociais. E, como se pode ler da postagem referida, a professora não achou que houve qualquer problema com a fala do sujeito, defendendo-o contra quem reclamou, acusando os críticos de serem preconceituosos com os egressos etc. Mas em nenhum momento explicou como alguém que cometeu um crime bárbaro contra uma criança de 5 anos poderia falar sobre “proteção ao vulnerável”.

E é claro que ela sabia o que o sujeito falaria, que não seria de uma perspectiva de humildade, arrependimento e intenção de ajudar para que outros vulneráveis não sofram com criminosos como ele um dia foi. Até porque o sujeito não parece de fato ressocializado, colecionando boletins de ocorrência – inclusive chegou a ser preso em flagrante por possível prática de racismo. A própria Associação dos Magistrados Mineiros (Amagis) soltou nota posteriormente na qual informou que já fez até reclamação disciplinar junto à OAB por vários fatos envolvendo o advogado.

Enfim, a escolha do convidado não poderia ter sido pior. Para ser bondoso, foi, no mínimo, de uma insensatez difícil de quantificar. Até porque só poderia resultar no que resultou, no contrário do que pretendia a professora, prejudicando outros egressos do sistema prisional que precisam e até merecem se recolocar socialmente, pois, no fim das contas, o ocorrido não contribui em nada para diminuir a discriminação contra esses. Pior ainda, a insensatez também revela uma insensibilidade revoltante contra a criança assassinada e sua família, os verdadeiros vulneráveis nessa história, que não foram protegidos pela juíza aposentada – nem sequer foram levados em consideração.

P.S.: já conseguiu criar um título adequado? Eu ainda não.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]