Frank Watkinson é um senhor inglês de 68 anos, aposentado há cerca de uma década. Desde então, passou a tocar violão com mais frequência, uma antiga paixão muitas vezes abandonada. Desde os seus 16 anos possui algum violão, mas nem sempre tocava e com frequência o instrumento passava meses sem ser usado. “Nunca fui além do nível iniciante, sério. Embora sempre tivesse um violão, a vida se intrometia no meio do caminho, sabe?”, disse em entrevista.
Também desde que comprou seu primeiro violão começou a compor músicas, mas nunca gostou de nada, nem levava tão a sério. Mas, depois da aposentadoria, dedicou-se mais, compondo algumas das quais, porém, igualmente não gostava. Até que um dia seu cachorro, Buster, foi atropelado e morreu. Compôs, então, sua primeira canção de que realmente gostou, expressando sua dor e dedicada ao fiel companheiro, dando seu nome à música, na qual canta: “Se há um Paraíso, espero que você esteja lá / Porque se você não estiver no Paraíso, o Paraíso não é para mim”.
Segundo conta na descrição de uma das gravações que fez dessa música e que publicou no seu canal no YouTube, Watkinson tem a certeza de que foi aí que formatou o seu estilo de tocar e cantar. E é impressionante quanta personalidade há nesse estilo, parecendo um compositor de longa carreira, não um estreante que nem sequer tem planos de estrear de fato. Ele apenas quis tocar seu violão, decidiu registrar e descobriu que era fácil e simples colocar no YouTube, pensando mais em sua família e amigos próximos escutando, jamais imaginando que fosse chamar a atenção de alguém mais.
Assistir a Frank tocando seu violão e cantando com sua voz introspectiva é medicinal, consolador e reconfortante
Pois chamou. Embora o canal já tenha alguns anos, foi no ano passado, durante a pandemia, que Frank foi descoberto por artistas que escutaram versões que ele gravou de suas músicas. E são versões realmente impressionantes, espiritualmente comoventes, sendo impossível não lembrar das gravações de Johnny Cash em seu fim de carreira, na série de discos American Recordings, embora o estilo de canto de Frank esteja mais próximo de um Leonard Cohen.
A consequência foi uma explosão de acessos, curtidas e comentários em suas postagens, surpreendendo Frank, que jamais esperava algo assim: “Isso me surpreendeu. Não sou um performer. Nunca toquei num palco na minha vida. Então, eu simplesmente não sei o que eles estão enxergando”. Mas basta conferir os comentários para descobrir. As gravações simples, apenas com voz e violão, feitas em casa quando a esposa está no trabalho, cativam, primeiro, pela despretensão que se torna uma lufada de ar fresco no ambiente virtual das redes sociais tão neurotizado com a pandemia. Assistir a Frank tocando seu violão e cantando com sua voz introspectiva é medicinal, consolador e reconfortante.
Aliás, Frank compôs três músicas sobre a pandemia, mais especificamente sobre os lockdowns na Inglaterra. Chamou-as de Lockdown 1, 2 e 3, sendo que na primeira canta: “Se eu não fosse louco já de antes, tenho certeza de que ficaria louco agora”. Já na segunda, meses depois: “Mas apenas imagine, se eles fizerem de nós robôs, eis aqui um novo ponto de vista: não precisaremos de terapia porque robôs ‘don’t get blue’ (não ficam tristes)”. Por fim, encerrou a trilogia: “e é em tempos assim que todos os seus demônios escondidos vêm brincar e está cada vez mais difícil fazê-los ir embora”.
Tudo, claro, com aquele dedilhar suave de violão e a voz grave, profunda, significativa, que nos transportam para algum refúgio espiritual dessa loucura toda de pandemia e lockdowns. Passeie pelos comentários dos vídeos e confirme o bem que Frank tem feito, quanta gente se sentindo confortada, devolvida à esperança.
A capacidade de Frank de cantar do fundo da alma, atingindo o fundo das almas dos ouvintes, pode ser mensurado pela reação de centenas de pessoas que, ao escutar outra canção autoral sua, a bela This Could Be My Last Song, acharam que ele estava se despedindo, talvez por alguma doença mortal ou desistência da música. Não adiantou explicar que não se tratava disso, tendo de acrescentar no título do vídeo: “Canção original, apenas um título, não é sobre mim”.
Não coloquei nenhum link no texto para as músicas citadas acima, deixo apenas agora o do canal dele. Porque vale muito mais a pena você conhecê-lo por conta própria, escutando o que mais lhe atrair. Duvido não acabe como milhares de outras pessoas, “viciando” em escutá-lo e, quando menos esperar, estará adormecendo embalado por Lullaby, uma canção de ninar que ele compôs para seus seguidores que disseram que dormiam escutando suas músicas. Como um avô querido, canta: “Então, vá dormir, meu anjo precioso / E deixe os problemas derreterem / Te vejo na luz da manhã / Onde lutaremos por mais um dia”. OK, não resisto e deixo o vídeo dessa abaixo:
Eu disse que você precisava conhecer Frank Watkinson.