Esses dias meu amigo Gustavo Nogy, que também é colunista aqui da Gazeta do Povo, me pediu uma lista de alguns bons livros sobre arte. Eu sempre fui fascinado por história da arte, e, como sempre, estou disposto a indicar livros para os meus generosos leitores. Então, por que não publicar esta pequena lista aqui (por sugestão do próprio Gustavo)?
Mas antes eu gostaria de falar de onde saiu meu interesse por arte, principalmente por pintura. Não sei se já contei isso, mas a minha primeira faculdade foi de Artes Plásticas. Para se ter uma ideia do meu envolvimento com a matéria, cheguei até a dar aulas de História da Arte durante uns três anos. Foi meu primeiro emprego como professor, no início dos anos 2000.
Engraçado é que quando eu estudava no ensino médio, lá nos anos 90, não era um aluno muito entusiasmado com os estudos. Nunca tinha passado pela minha cabeça virar professor, ainda mais de Arte e muito menos de Filosofia. Como um bom aluno medíocre, estudava por obrigação. Nenhum passo além de um preguiçoso senso de dever. Um aluno medíocre que tirava notas suficientes para passar de ano. Só isso. Falo sem nostalgia e ressentimentos.
Cristo na tempestade, de Rembrandt, é coisa fina, de abalar o coração gelado de qualquer ateu convicto
Minha primeira paixão pelos estudos nasceu em contato com a história da arte. Meus motivos pessoais foram despertados depois de me deparar com uma ilustração de Rembrandt, foi amor à primeira vista. Lembro-me exatamente da pintura: Cristo na tempestade. Coisa fina, de abalar o coração gelado de qualquer ateu convicto. Encontrei Rembrandt em um livro na prateleira empoeirada na casa da avó de um velho amigo.
O fato é que lá em casa ninguém era ligado nessas coisas de estudar arte. Exceto para meu pai, que foi músico profissional, arte era uma total perda de tempo. Coisa de gente ociosa e, claro, rica. Embora eu lutasse herculeamente com minha natureza ociosa, não éramos ricos. Então, estudar arte estava fora de um projeto de vida (para usar a expressão pedagógica do momento).
Quando comuniquei a minha família meu interesse em cursar Artes Plásticas na faculdade, foi como se eu tivesse anunciado o apocalipse. Enfim, tomei coragem e pedi a conta do meu primeiro emprego – numa importante indústria de papel. Minha mãe quase surtou. Minto: ela surtou. Afinal, rompi com a tradição pequeno-operária dos meus antepassados e me aventurei no universo irrelevante dos clássicos.
Ao chegar à faculdade, conheci um daqueles professores que fazem a diferença na vida da gente. Ele era um jovem francês. Chegou ao Brasil a fim de estudar a nossa Semana de Arte Moderna (para a qual eu nem dava bola) e, se não me engano, Anita Malfatti. Ele se apaixonou pela arte brasileira, e resolveu ficar. O jeito como ele ensinava, com didática e entusiasmo, mudou a forma como eu me relacionava com os estudos. É isso, estava decidido! Vou me dedicar a estudar História da Arte. E estudei com muito amor.
Meu embrião de biblioteca era basicamente composto de livros de história da arte e estética (aliás, entrei na Filosofia por causa da estética, mas essa é uma outra história). Mergulhei de cabeça nesse universo. E são justamente alguns desses livros que fizeram a minha cabeça que eu gostaria de indicar para qualquer interessado em conhecer um pouco mais de história da arte para além dos clichês típicos. Mas, antes de ler livros, não deixe de dar uma boa olhada nas obras de Ticiano, Tintoretto, El Greco, Caravaggio, George de La Tour...
Começo com o primeiro livro que me marcou de verdade: Significado nas artes visuais, de Erwin Panofsky. Trata-se de uma série de ensaios de um dos maiores críticos de arte. Panofsky foi um daqueles alemães muito eruditos e responsáveis por elevar a história da arte a um patamar de ciência humanística. Aliás, se não quiser ler o livro todo, leia apenas o ensaio que serve como introdução: A história da arte como disciplina humanística; ou, ainda, A alegoria da prudência de Ticiano, um exemplo primoroso de seu método, que trabalha com os conceitos de iconografia e iconologia. Tem em português pela editora Perspectiva.
Antes de ler livros, não deixe de dar uma boa olhada nas obras de Ticiano, Tintoretto, El Greco, Caravaggio, George de La Tour...
Outro autor de que gosto muito é Heinrich Wölfflin (ele foi discípulo de ninguém mais, ninguém menos que Jacob Burckhardt). Wölfflin tem duas obras recomendadíssimas, verdadeiras obras-primas da historiografia da arte. A primeira que indico é o magistral Conceitos Fundamentais da História da Arte. Nessa obra ele apresenta como se dá a evolução de alguns estilos, pelo menos aqueles que vão de Albrecht Dürer a Rembrandt. A outra é A arte clássica, dedicado aos grandes nomes da pintura italiana, como Leonardo da Vinci, Rafael e Michelangelo. A Martins Fontes publicou todas elas.
Um autor que li com muito entusiasmo na época da graduação foi o francês Pierre Francastel. Diferentemente de Wölfflin, ligado ao método mais formalista, Francastel foi mestre do que ficou conhecido como método sociológico, que busca examinar a obra de arte como um “meio de expressão e de comunicação dos sentimentos e dos pensamentos”, pois, como o próprio autor diz, “ao contrário de Wölfflin, que tende a considerar a função visual independentemente das outras funções intelectuais, acredito que seja necessário estudá-la em relação à atividade total do homem numa época determinada”. O livro recomendado é Pintura e sociedade. Também pela Martins Fontes.
Para fechar essa pequena série de indicações sobre arte, não poderia deixar de falar do grande E. H. Gombrich, autor de A história da arte. Sem dúvida um dos mais populares e bem escritos livros sobre história da arte. Ele cobre desde a pré-história até arte do século 20. Seus textos são primorosos e as ilustrações da edição brasileira da LTC são muito bem cuidadas. Vale cada centavo investido. É o tipo de obra para ostentar, fazer inveja e jamais emprestar para os amigos.
De qualquer forma, se não você não for ler esses livros agora, recomendo que guarde sempre essa lista com carinho. E tenha uma boa leitura!