Neste mês de novembro de 2021, meu livro Contra o Aborto completou quatro anos. O livro já está na sua quinta edição, com ligeiras correções em relação à primeira, de 2017. Nesses últimos anos, aprendi muita coisa com meus leitores. Recebi mais elogios e críticas positivas do que ataques e críticas negativas. No geral, ataques são sempre os mesmos: “homem não pode falar de aborto”; “livro cheio de falácias” e coisas do gênero. Os críticos, com zelo pela verdade, fizeram-me corrigir erros e repensar equívocos. Sou grato a eles.
Entretanto, nenhuma análise substantiva demonstrou a invalidade do que sustento do início ao fim do livro: o embrião é pessoa desde o momento da concepção e, por ser pessoa, merece respeito moral e proteção legal. Não admito reduzirem o problema do aborto a um problema de saúde pública ou de autonomia do corpo da mulher. Na verdade, o problema do aborto não pode ser compreendido por uma única perspectiva. É, pois, problema complexo. E, pela complexidade inerente, não pode ser solucionado com respostas simples e bravatas de ativistas.
O embrião é pessoa desde o momento da concepção e, por ser pessoa, merece respeito moral e proteção legal
Nunca me importei para ataques e sempre me coloquei à disposição da conversa franca e respeitosa. Lamento pessoas que, em vez de discutir ideias, preferem repetir jargões que nada contribuem para uma construção madura acerca de tão delicado tema. Eu, por ser da área da filosofia, lido com argumentos, independentemente de quem “fala”. Não há um “lugar de fala” privilegiado quando o objetivo é a verdade. Porque não se trata de quem, mas do que se fala.
Meu livro nunca se pretendeu panfleto contra o aborto. É reflexão filosófica e propõe solução objetiva para o problema do aborto – que considero, antes de tudo, problema moral envolvendo não uma, mas toda a comunidade de pessoas.
O problema moral do aborto não se encerra na descrição científica de um organismo vivo e da descrição do processo de seu desenvolvimento biológico, sociológico e econômico. Logo, não se trata de evocar só esta ou aquela ciência, este ou aquele recorte da realidade. A controvérsia gira em torno, primeiro, de uma resposta para pergunta simples, porém difícil: “o que sou eu?” Sem uma resposta relativamente segura dada a essa pergunta filosoficamente difícil, não será possível pensar a pergunta mais importante no caso do aborto: “faz sentido dizer que o embrião já existe como pessoa?”
A ciência pode nos dizer muitas coisas sobre organismos vivos, porém, não diz respeito ao método científico se somos ou não pessoas. Verdade é que não há “pessoas” em tratados científicos. A categoria “pessoa” é irrelevante para a ciência natural. É curioso, no entanto, perguntar para os defensores do aborto o que certamente morre quando se pratica um aborto.
A dignidade de uma pessoa, invisível ao método das ciências naturais, não muda conforme as mudanças biológicas e muito menos conforme bravatas de interesses de ativistas
A descrição da experiência interpessoal responsável por fornecer sentido à sentença “o embrião é uma pessoa” precisa ser distinta em ordem e qualidade da descrição objetiva da ciência “este organismo vivo é um embrião”. E pouco importa dizer que um embrião não tem sistema nervoso desenvolvido. Essas ordens descritivas da realidade, natural e interpessoal, não se anulam. Na verdade, subsistem enquanto formas legítimas de compreensão de duas ordens da realidade: a realidade natural e a realidade humana.
Sou taxativo neste ponto: uma pessoa é o seu próprio corpo. Meu livro praticamente é uma defesa da tese de que uma pessoa não tem corpo, ela é corpo. O embrião é pessoa por ser corpo com potencial de se autodesenvolver para a vida adulta autoconsciente. Não tem potencial de ser pessoa; já é pessoa em ato, desde o momento da concepção.
Ser contra o aborto não implica em limitar a liberdade da mulher. Pelo contrário, é reafirmar que todos são livres desde o momento da concepção
A experiência humana mais elementar não diz que eu só tenho um corpo depois de me tornar consciente; eu sou meu corpo desde o momento da concepção e minha consciência será o resultado do meu autodesenvolvimento como pessoa convivendo com outras em uma relação interpessoal. O embrião é, pois, membro da comunidade moral por ser corpo pessoal e não um parasita biológico.
A dignidade de uma pessoa, invisível ao método das ciências naturais, não muda conforme as mudanças biológicas e muito menos conforme bravatas de interesses de ativistas. Se dependêssemos da vontade de terceiros para fundamentar nossa dignidade, jamais avançaríamos em relação aos direitos humanos universais. A universalidade do direito humano não é um penduricalho que serve de enfeite à ganância humana, mas o fundamento de toda liberdade. Por isso, ser contra o aborto não implica em limitar a liberdade da mulher. Pelo contrário, é reafirmar que todos são livres desde o momento da concepção.
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