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Francisco Razzo

Francisco Razzo

Francisco Razzo é professor de filosofia, autor dos livros "Contra o Aborto" e "A Imaginação Totalitária", ambos pela editora Record. Mestre em Filosofia pela PUC-SP e Graduado em Filosofia pela Faculdade de São Bento-SP.

Debate público

Os limites do argumento de autoridade no debate público

Imagem ilustrativa. (Foto: Unsplash)

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Nenhum texto produzido para contribuir com qualquer assunto no debate público pode se esquivar de regras gerais básicas da argumentação. Obviamente, o ambiente público não se determina por critérios acadêmicos, com metodologia própria para cada área do saber. Sendo assim, no espaço público, a produção e correção de um texto argumentativo não se fundamentam na autoridade de especialistas, por mais que muitos autores de textos de opinião, muitas vezes, precisem apelar para autoridade de um perito com objetivo de balizar seus argumentos.

No espaço público, socialmente demarcado pela pluralidade de ideias, o argumento de autoridade precisa ser usado com parcimônia. Devida à nossa condição cognitiva limitada, não dá para sermos especialistas e ter domínio de todos os assuntos. Dizem que o filósofo alemão Leibniz foi o último homem da Europa a saber tudo. Eu duvido que hoje, com o estado atual do desenvolvimento do saber, ele conseguiria ser perito em tantas áreas como fora em no século 18. Digo com certo pesar que polímatas estão fora de moda.

De qualquer maneira, no espaço público, sobretudo na era das redes sociais, cada um se tornou o maior especialista na própria opinião. Isso não tem problema, desde que sejamos capazes de defender nossas opiniões da melhor forma possível. E por melhor forma quero dizer com bons argumentos, respeitando regras básicas da lógica informal.

No espaço público, socialmente demarcado pela pluralidade de ideias, o argumento de autoridade precisa ser usado com parcimônia.

Por sua vez, infelizmente, o debate público tem sido intoxicado pelo uso excessivo de argumento da autoridade, que deveria apenas se limitar a casos muito específicos quando certos assuntos requerem a ajuda de universitários.

Porque, o problema, no entanto, é recorrer ao argumento de autoridade simplesmente porque o nome da pessoa está associado a algo de positivo. Todos têm uma ideia mais ou menos segura de que Albert Einstein foi um gênio em uma área muito específica da Física. Mas o que Einstein disse a respeito do socialismo é irrelevante para sustentar uma argumentação acerca de o socialismo ser a forma mais justa para a construção de uma sociedade.

Outro exemplo de argumento de autoridade é aquele baseado na experiência social de quem argumenta. Numa questão em disputa a respeito de cotas para negros em universidades, é de extrema importância toda a sociedade ouvir as reinvindicações dos membros dos movimentos negros. Numa perspectiva social, isso não está em questão. Entretanto, argumentos não terão mais — ou menos — validade porque a pessoa que argumenta é negra. Nesse caso, o “lugar de fala” pode fundamentar muitas coisas, mas não fundamenta argumentos.

Um argumento de autoridade, por mais que se esconda em camadas retóricas, tem uma estrutura muito simples: Certa pessoa A diz B. Portanto, B é verdadeiro. Por “A” entendemos a pessoa de reputação social privilegiada. Pode ser um especialista em determinada matéria ou alguém que goze de vivência no assunto em disputa. No caso do especialista, só faz sentido apelar para autoridade da pessoa se a questão em disputa tiver a ver com a especialidade dela.

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No espaço público, cujos temas são de interesse de todos, aberto ao escrutínio da divergência, o lugar da autoridade de um especialista é extremamente restrito. Além disso, um único especialista dando opinião não significa que a autoridade dele represente o consenso inteiro da comunidade de especialistas — aliás, durante a pandemia vimos isso acontecer com a forte presença de epidemiologistas no debate público.

Mais do que isso, vimos também muitos especialistas falarem como verdadeiros porta-vozes “ciência”, assim como um todo, como se a palavra “ciência” fosse mágica o suficiente para resolver todos os outros dilemas sociais além da especialidade do especialista. Como se não houvesse especialistas em sociologia, economia, ciência política etc.

Mas não quero entrar nessa polêmica. Meu objetivo foi apenas mostrar que argumentar no espaço público deve obedecer a critérios distintos dos da argumentação acadêmica. Eu não estou alegando com isso que o apelo à opinião de um especialista não pode ser uma forma legítima de resolução de certas questões em disputas no debate público. Apenas que seu excesso pode representar algum grau de irracionalidade.

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