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Em seu voto para regular redes sociais, o ministro José Roberto Barroso, com sua pose pombalina de regulador ilustrado, oculta a face do verdadeiro Leviatã: o Estado, único com exércitos, impostos compulsórios e o monopólio da violência. Ele supõe que controlar as plataformas trará justiça. Mas justiça para quem? Para o Estado, claro, insaciável em poder e tributos. Insaciável para determinar como a nossa vida vale a pena ser vivida.
Direitos autorais, privacidade, proteção econômica... tudo pretexto para domesticar a democracia, ou seja, censura disfarçada. As Big Techs, com todos os seus pecados e ganâncias, ao menos oferecem escolha: use ou não use. Já o Estado? Obedeça ou pague o preço.
Sim, a dominação de mercado, com todas as suas deformações, é um problema, de fato. Mas pior é a dominação de consciências, quando um ministro decide, com sua pose pombalina de regulador ilustrado, o que é "bom" para nós.
O ministro fala em "manipulação das vontades" como se o conceito fosse claro, objetivo e inquestionável. Não é. Manipular pode significar influenciar, sugerir, convencer ou impor. Toda comunicação é uma tentativa de persuasão.
A publicidade vende produtos, a política vende ideias e obediência. O mercado sempre influenciou escolhas, mas a decisão final é do indivíduo. Pressupor que somos massa amorfa, manipulada como marionetes, é negar a autonomia humana, consequentemente, suas responsabilidades.
Barroso alega que "as plataformas não sabem apenas onde moramos ou trabalhamos, ou os nomes de nossos familiares. Elas sabem também o último livro que compramos, a última viagem que fizemos ou até a última doença que nos preocupou. Com essa enorme capacidade de manipular nossas vontades, a legislação busca limitar esses abusos."
Tudo muito lírico, mas vago. Quais abusos? O que significa "manipular vontades"? Indicar qual livro eu preciso comprar ou qual destino viajar não é manipulação. É consumo informado. Dados não tomam decisões por ninguém. Indivíduos tomam.
Plataformas digitais personalizam experiências. Não há manipulação em sugerir um produto que alguém já demonstrou interesse. Isso é eficiência tecnológica, marketing, não abuso político. A diferença entre influência legítima e manipulação abusiva está na intenção e no resultado.
Coerção é manipulação. Sugestão baseada em preferências é conveniência. Equiparar essas práticas é desonesto e alarmista. O tom alarmista é retoricamente estratégico. Anuncie perigo para se vender como a solução.
A coleta de dados é uma ferramenta, não uma arma. Dados são usados para vender serviços ou direcionar anúncios. O uso indevido é um risco real, mas leis já existem para punir abusos. Expandir regulações sob o pretexto de proteger a privacidade abre caminho para a vigilância.
O Estado, com seu histórico impecável de "boas intenções", cria crises para ampliar seus poderes. A internet, com sua natureza descentralizada, é uma ameaça ao controle estatal
Regular plataformas sob o pretexto de proteger o usuário é, na prática, domesticar um espaço de liberdade.
O ministro acusa as Big Techs de saberem demais. É verdade que sabem. Sabem o que compramos, aonde vamos e até nossos receios mais banais. Mas quem sabe mais do que o Estado? Ele não precisa deduzir onde você mora; ele já sabe. Não precisa cruzar seus dados para descobrir sua renda; ele impõe impostos diretamente.
A diferença é que as Big Techs dependem de sua escolha para existir. O Estado, não. Ele se impõe. Não quero fazer aqui uma defesa apaixonada das Big Techs, também tenho meus receios.
Entretanto, a manipulação verdadeira é transformar o medo das plataformas em justificativa para expandir o Leviatã. O discurso de "proteção" oculta a lógica subjacente: controlar aquilo que não se pode vencer. O modelo das plataformas é eficiente porque oferece conveniência, e a conveniência tem um custo. Esse custo, até agora, é suportável. O custo da regulação excessiva é muito maior: menos liberdade, menos inovação, mais poder para o governo.
As plataformas digitais não são isentas de críticas. Há monopólios a serem enfrentados e transparência a ser exigida. Só que isso não pode ser feito pelo Estado como um justiceiro moral. Deve ser feito pelo mercado, pela concorrência e por consumidores, conscientes ou não das bobagens que fazem na internet.
O ministro quer salvar-nos das plataformas. Quem nos salvará do ministro? O maior manipulador das vontades não é o algoritmo. É o Estado, com suas leis ambíguas, discursos paternalistas e pretensões de onisciência. Mais do que "proteger" o indivíduo, regulações excessivas restringem sua autonomia e ampliam o controle de quem realmente decide por todos. Não são as plataformas que têm poder demais. É o Leviatã.
Conteúdo editado por: Aline Menezes