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Franklin Ferreira

Franklin Ferreira

Igreja evangélica, Evangelho, teologia moral, história e cultura. Coluna atualizada às quintas-feiras

Cristianismo

A centralidade da Escritura Sagrada

Imagem ilustrativa. (Foto: Pexels/Pixabay)

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Se as Escrituras são verdadeiras e inspiradas por Deus, e se Jesus disse que elas não podem errar, precisamos reconhecê-las como o fundamento sobre o qual a igreja é constituída.

O fundamento da igreja cristã

O apóstolo Paulo diz que Deus “designou uns como apóstolos, outros como profetas, outros como evangelistas, e ainda outros como pastores e mestres” (Ef 4,11). Alguns interpretam esse texto sugerindo que Deus estaria constituindo cinco ministérios diferentes para servir a igreja, mas não é isso que Paulo ensina nessa passagem. Essa interpretação não trata adequadamente do que o versículo registra, nem do próprio contexto em que ele está inserido. Primeiramente, pastores e mestres devem ser tratados como uma única categoria, a de “pastores-mestres”; portanto, não existem cinco ministérios ou dons, mas apenas quatro. Além disso, no contexto maior da Carta aos Efésios, Paulo já havia afirmado que somos “edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, sendo o próprio Cristo Jesus a principal pedra de esquina” (Ef 2,20).

Tendo em mente que os termos “profeta” e “apóstolo” já haviam sido empregados na carta, fica claro o ensino de Paulo de que a base que sustenta a igreja é a mensagem dada aos profetas e apóstolos. Ele confirma isso mais adiante, ao mencionar o seguinte: “o mistério que em outras gerações não foi manifestado aos homens, da forma como se revelou agora no Espírito aos seus santos apóstolos e profetas” (Ef 3,5).

Mas, afinal, o que Paulo quer dizer ao afirmar que Deus “designou uns como apóstolos, outros como profetas, outros como evangelistas, e ainda outros como pastores e mestres”? É simples: que o fundamento da igreja é a mensagem conforme contida no que os apóstolos e profetas registraram. E essa mensagem chega a nós hoje por meio de evangelistas e pastores-mestres. São esses os encarregados de transmitir a nós a palavra dos apóstolos e profetas.

O fundamento da igreja cristã nada mais é, portanto, do que a mensagem contida nos escritos apostólicos e proféticos. Esses são os fundamentos da igreja, e isso não quer dizer que Deus esteja “levantando” apóstolos e profetas na atualidade; quer dizer, antes, que a mensagem dada no passado serve de alicerce para a comunidade cristã até os dias de hoje. Essa mensagem é a base sobre a qual a igreja se assenta, e quem a traz para nós são evangelistas e pastores-mestres. Há uma correspondência entre apóstolos e profetas e entre evangelistas e pastores-mestres. São estes últimos que trazem a mensagem apostólica e profética sobre a qual a igreja se firma.

Desse modo, se a Escritura exerce tão importante papel, ela deve ser central para nós. Devemos lembrar ainda que a Escritura e o Espírito Santo caminham lado a lado, e não precisamos colocar um contra o outro. Paulo ensinou que a Palavra de Deus é “a espada do Espírito” (Ef 6,17), ou seja, o Espírito Santo usa a Escritura como arma, com a qual lutamos contra aqueles que atacam a igreja.

Entretanto, precisamos destacar que a Escritura é essencial para nossa fé, pois é ela que fundamenta tudo o que fazemos na igreja – culto, pregação, sacramentos, ensino, oração etc. –, porém, não podemos esquecer que é o Espírito Santo que a toma e a usa com poder em nosso meio.

O Espírito Santo e a interpretação das Escrituras

O Espírito ilumina nossa leitura das Escrituras, mas nenhum de nós é inspirado – somente os autores da Escritura, os profetas e apóstolos, receberam essa graça. O que experimentamos na atualidade, quando descobrimos uma verdade na Escritura, ocorre graças à iluminação do Espírito Santo, que nos permite entender e aplicar a Escritura a nós e ao povo de Deus. Expressando essa verdade de maneira concisa, podemos dizer que o Espírito Santo nos ilumina para que sejamos dirigidos pela voz de Deus na Sagrada Escritura.

É por isso que, sempre que nos dirigimos à Escritura no intuito de lê-la e interpretá-la, devemos fazer uma oração simples, singela, para que o Espírito Santo venha com poder e nos ilumine aquela passagem, mostrando-nos tanto o que ela quis dizer no passado quanto a melhor maneira de aplicá-la ao nosso coração e às pessoas ao nosso redor. A interpretação da Sagrada Escritura precisa ser feita em dependência do Espírito Santo.

Usando as Escrituras na igreja

Nesse sentido, uma igreja que quer ser igreja evangélica, igreja da Reforma, deve priorizar a Sagrada Escritura, que precisa ter destaque em tudo o que a igreja faz. Isso pode ser feito de diversas formas. Por exemplo: na liturgia, devemos ler trechos da Sagrada Escritura. Alguns documentos litúrgicos do passado prescreviam que no culto de domingo fosse providenciada a leitura de uma passagem do Antigo Testamento e de uma do Novo, e geralmente a passagem do Antigo Testamento era um salmo.

No passado, a igreja costumava ler trechos do Saltério a cada domingo. Dessa forma, ao fim de três anos, quem tivesse frequentado o culto regularmente teria ouvido a leitura de todo o Livro de Salmos. Podemos escolher também alguns trechos dos evangelhos e lê-los ao longo dos meses nos cultos dominicais. Se a Escritura é o fundamento da igreja, e se é por meio dela que a palavra apostólica e profética vem a nós para nos edificar, ela deve ser lida no culto público também.

Podemos criar espaços na igreja para lermos a Escritura juntos, e aqui podemos e devemos ser criativos. É possível organizar, por exemplo, um encontro no sábado para que as pessoas se reúnam na igreja para um tempo de comunhão, para ler um ou dois livros juntos, com períodos de silêncio para leitura individual e reflexão. Comidas e bebidas combinam muito com esse tipo de reunião. Assim, é possível ler livros menores da Escritura como Efésios, Gálatas, Colossenses, Habacuque, Oseias, Obadias, Malaquias etc., de forma que a igreja seja exposta à Escritura, que é o fundamento da comunidade cristã e a Palavra de Deus vinda a nós.

A escola bíblica dominical, antes de ser temática, tem de ser um espaço para expor a Escritura. Podemos montar o currículo de ensino de tal forma que a cada dois domingos um livro da Escritura seja objeto de estudo. Nesses dois domingos, a ideia é que se gaste tempo tratando do tema do livro, a possível data em que foi composto, a autoria, seu esboço, os versículos principais, os textos mais difíceis, os ensinos doutrinais principais. Em um período de dois a três anos, a igreja toda conseguirá ter uma compreensão bem ampla de todos os livros que compõem a Escritura Sagrada.

O sermão dominical

Independentemente da atividade a ser desenvolvida, se queremos honrar a Reforma protestante e ser de fato evangélicos, é a Escritura que tem de ser colocada diante das pessoas. Fico maravilhado ao ver como domingo após domingo pessoas se aproximam da igreja. E por que elas vêm? Para ser entretidas? Duvido muito! Há entretenimento muito melhor do que ficar duas horas dentro de um templo, muitas vezes sem ar-condicionado, sem conforto etc. Tenho a convicção de que as pessoas vêm porque têm esperança de, mesmo tateando, ouvir uma palavra de Deus para elas.

E aí entra a preocupação com o sermão: o verdadeiro sermão consiste na exposição do texto da Escritura, e não podemos pedir mais, mas também não podemos esperar menos dos nossos clérigos e pastores. Não queremos ouvir suas histórias engraçadas, a última manchete do jornal ou como a Escritura pode responder a ela. Não queremos ouvir apenas testemunhos, mas, sim, a exposição fiel de um texto da Escritura Sagrada. Quando o pregador entende isso, para de usar ilustrações bacanas ou bonitinhas no começo do sermão para quebrar o gelo ou chamar a atenção. Quando muito, fará uma recapitulação do sermão pregado no domingo anterior ou oferecerá uma visão panorâmica do contexto da passagem da Escritura, para ir a ela diretamente, sem delongas.

Domingo após domingo, as pessoas se reúnem porque querem ouvir a voz de Deus – e o pregador não é a voz de Deus; a Escritura, sim! O pregador é, no máximo, um instrumento, e aquele que honra essa função fala menos de si e deixa a Palavra falar às pessoas. Claro que suas características, personalidade e temperamento não são ignorados, mas seu alvo é que Deus fale por meio da Escritura no poder do Espírito Santo.

Os sermões, então, precisam ser expositivos, e o tempo que um pregador passa no púlpito não deve ser usado para brincar ou entreter. Como dissemos, há coisa muito melhor para fazer se nosso desejo for entretenimento. Deus escolheu a Palavra como um dos meios para vir até nós, e isso conspira contra a modernidade altamente dependente de tecnologia. É muito difícil ter de competir com a enxurrada de imagens presentes em nossa cultura, mas Deus, em sua infinita graça e misericórdia, resolveu destacar a exposição de sua Palavra como meio de vida para nós.

A relação da Escritura com a fé

Os reformadores destacaram bastante a afirmação de que “a fé vem pelo ouvir, e o ouvir, pela palavra de Cristo” (Rm 10,17). Nada mais e nada menos. O único órgão ativo, por assim dizer, para a nossa salvação é o ouvido. Como Lutero disse: “Se você perguntar a um cristão qual é sua tarefa e porque ele é digno do nome cristão, não pode haver nenhuma outra resposta senão que ele ouve a Palavra de Deus, isto é, a fé. Os ouvidos são os únicos órgãos do cristão”. Respondemos à obra de Deus por sermos atraídos pela graça e ouvirmos a Palavra; e dessa forma somos movidos a ter fé e a descansar em Deus.

A Escritura, assim, é central para o povo de Deus. Ela é o fundamento da igreja cristã; a igreja, por assim dizer, é assentada na Escritura e em sua mensagem profética e apostólica. Portanto, podemos terminar orando juntos: “Bendito Senhor, que fizeste com que a tua Santa Palavra se escrevesse para nossa instrução; permite que a possamos de tal modo ouvir, ler, ponderar, aprender e assimilar interiormente, para que, pela paciência e consolação das Santas Escrituras, mantenhamos inabalável a bem-aventurada esperança da vida eterna, que tu nos tens dado em nosso Salvador Jesus Cristo. Amém”.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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