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Franklin Ferreira

Franklin Ferreira

Moralidade

Uma perspectiva cristã sobre o pecado da corrupção

Detalhe de "Jezebel e Acabe encontram Elias na vinha de Nabote", de Sir Frank Dicksee. (Foto: Wikimedia Commons/Domínio público)

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A Escritura condena claramente a corrupção, pois esse pecado não só afeta as estruturas sociais, mas também tem implicações espirituais, minando a fé e a comunhão com Deus. A Escritura também fornece princípios éticos para guiar as vidas dos cristãos. Isso os ajuda a discernir entre o certo e o errado, resistir à tentação e promover a justiça. Portanto, ao internalizar esses ensinamentos, os cristãos se fortalecem espiritualmente e se tornam agentes de transformação positiva em suas igrejas e comunidades, buscando a justiça e o bem-estar para todos. Assim, a compreensão dos ensinamentos bíblicos sobre o pecado da corrupção é crucial para os cristãos.

Uma descrição do pecado da corrupção

É importante definir o que é “corrupção”. A origem da palavra remonta ao latim corruptio, derivado do verbo rumpere, que significa “romper” ou “quebrar”. Corromper ou ser corrompido implica romper o equilíbrio entre as pessoas, violar a integridade moral e perturbar a harmonia da sociedade. Em uma perspectiva bíblica, “corrupção” refere-se tanto ao ato ou efeito de corromper-se ou corromper outros, quanto à decomposição física de algo, como a putrefação. Assim, o conceito de “corrupção” é intrínseco ao indivíduo. Esse pecado enraíza-se em cada pessoa que se permite ser corrompida ou corrompe os outros.

A Escritura oferece uma profunda reflexão sobre a origem da corrupção humana, apontando diretamente para o coração como a fonte primordial desses males: “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto. Quem poderá entendê-lo?” (Jr 17,9); “Porque do coração procedem maus pensamentos, homicídios, adultérios, imoralidade sexual, furtos, falsos testemunhos, blasfêmias. São estas as coisas que contaminam a pessoa” (Mt 15,19-20). De acordo com o ensino bíblico, é evidenciado que é do coração que surgem os maus pensamentos, os atos de violência, as transgressões sexuais, os desvios éticos, as mentiras, as calúnias e as profanações. Este entendimento nos leva a confrontar a complexidade e a profundidade da natureza humana, como expresso pelo profeta Jeremias ao descrever o coração como enganoso e desesperadamente corrupto, ultrapassando em malícia todas as outras coisas conhecidas. Esta análise nos desafia a examinar não apenas nossas ações exteriores, mas também as motivações e inclinações mais íntimas do coração, reconhecendo a necessidade de uma transformação interior para lidar com a raiz da corrupção e se viver uma vida justa e íntegra.

A corrupção não é apenas um problema político ou econômico, mas também uma questão moral que nos afeta pessoalmente. Deus nos convoca a sermos pessoas íntegras em todas as áreas de nossas vidas, a rejeitar a injustiça e a promover o bem comum

Outro sentido da palavra “corrupção” reside na modificação das características originais de algo, evocando o relato bíblico da Queda e a doutrina do pecado original. Genesis 3 narra como Adão, considerado o Cabeça da raça humana, pecou e se corrompeu, propagando esse pecado e corrupção por toda a humanidade e acarretando terríveis consequências sociais, culturais e, especialmente, espirituais. Em resumo, após a Queda, a natureza humana se deteriorou e, como resultado, a partir de então toda a humanidade nasce já corrompida – influenciando e corrompendo tudo que está ao seu redor.

Quando se considera a corrupção na esfera política, é crucial para o cristão reconhecer que este é um pecado repugnante que afeta profundamente a vida de todos. Seus efeitos se estendem diretamente à segurança pública, à educação e à saúde, pois desviam recursos essenciais desses setores vitais da sociedade, resultando em maior sofrimento para os necessitados e desfavorecidos. Além disso, há um impacto espiritual significativo, uma vez que padrões éticos que deveriam ser elevados são rebaixados, normalizando comportamentos e atitudes que deveriam ser rejeitados com veemência.

A extensão do pecado da corrupção

Embora a corrupção não seja exclusiva das autoridades civis, as Escrituras abordam a corrupção como um pecado que afeta a todos indiscriminadamente.

A corrupção eclesiástica é um desafio enfrentado pela igreja, pois vai contra os princípios de serviço eclesiástico delineados nas Escrituras. O apóstolo Pedro adverte sobre a importância de pastorear o rebanho de Deus com zelo e integridade, rejeitando qualquer forma de ganância ou dominação (1Pe 5,2-4). Ele enfatiza a necessidade de liderança exemplar, não por força, mas por livre vontade e prontidão de coração. Ele destaca a responsabilidade da liderança eclesiástica de servir como modelo para o rebanho, seguindo o exemplo do Sumo Pastor, Jesus Cristo. A igreja, em resposta a essa advertência, deve buscar continuamente a reforma e a renovação, confiando na orientação do Espírito Santo para purificar e fortalecer sua liderança e ministério, mantendo-se fiel aos princípios bíblicos e promovendo uma cultura de integridade e serviço mútuo.

A corrupção na sociedade é um mal que permeia todas as esferas da vida humana, afetando profundamente as relações pessoais e a aplicação da justiça. O profeta Miquéias descreveu a depravação moral e a falta de retidão que caracterizam a sociedade do Reino de Judá de sua época (Mq 7,2,3). Ele lamentou a ausência de homens piedosos e justos, apontando para a prevalência do suborno, da propina e da injustiça entre o povo. As Escrituras condenam veementemente essas práticas corruptas, alertando para os seus efeitos nocivos sobre a sociedade e sobre as próprias vidas daqueles que as praticam. O suborno é descrito como um instrumento que cega os que têm visão e perverte as palavras dos justos (Êx 23,8; Pv 17,23; Is 5,22-23), enquanto a propina é vista como uma forma de distorcer as veredas da justiça e negar direitos aos necessitados (Lc 3,12-13). O exemplo de cobradores de impostos que procuram João Batista em busca de orientação ilustra a gravidade dessa questão, mostrando como a ganância e a corrupção podem corromper até mesmo aqueles encarregados de administrar a justiça e proteger os direitos dos cidadãos. Assim, a Escritura nos adverte a rejeitar qualquer forma de corrupção e a buscar a justiça e a retidão em todas as nossas interações sociais, conscientes de que somente através da integridade e do respeito mútuo podemos construir uma sociedade justa e harmoniosa.

A corrupção na política é uma preocupação séria abordada nas Escrituras Sagradas, que fornecem princípios claros sobre justiça e integridade na administração pública. O livro de Deuteronômio adverte contra a distorção da justiça e a aceitação de subornos, ressaltando como tais práticas comprometem a sabedoria dos líderes e pervertem a verdade (Dt 16,19-20). A mensagem é clara: seguir a justiça é essencial para desfrutar das bênçãos da terra prometida por Deus. Duas formas de corrupção política são destacadas: a criação de leis injustas e a conduta injusta dos próprios políticos. O Salmo 82,2-5 clama por justiça, condenando aqueles juízes que defendem os ímpios em detrimento dos fracos e oprimidos. Isaías denuncia os legisladores corruptos que promulgam leis injustas para privar os pobres de seus direitos, além de políticos que amam o suborno e negligenciam a causa dos órfãos e das viúvas (Is 10,1-2; Is 1,23). Essas passagens bíblicas enfatizam a responsabilidade dos líderes políticos de governar com justiça e cuidar dos mais vulneráveis, destacando que a corrupção na política não é apenas uma questão moral, mas também uma violação dos princípios fundamentais da justiça e da equidade estabelecidos por Deus.

Uma solução para a corrupção no Brasil

A corrupção manifesta-se de maneiras diversas na sociedade brasileira, permeando muitos aspectos do cotidiano. Desde pequenos atos, como o roubo de sinal de wi-fi ou a cola em provas escolares, até práticas mais elaboradas, como o superfaturamento de obras públicas e o desvio de verbas, a corrupção revela-se como um problema multifacetado e enraizado na cultura brasileira. A compra de produtos piratas, o roubo de serviços como energia elétrica através de “gatos” e a tentativa de suborno para evitar penalidades são exemplos adicionais que demonstram como a corrupção pode ocorrer em diferentes contextos. A legislação criada para favorecer interesses particulares em detrimento do bem comum também perpetua a corrupção institucionalizada. Diante dessa ampla gama de práticas corruptas, fica evidente a urgência de enfrentar esse problema em todas as suas formas, promovendo uma cultura de integridade, transparência e responsabilidade em todas as esferas da sociedade.

A situação, do ponto de vista humano, é desanimadora. No entanto, ao longo da história, a fé cristã tem desempenhado um papel crucial na formação moral e na coesão das sociedades no Ocidente

Apesar das deficiências do nosso modelo político ultrapassado e do Estado excessivamente inchado, fatores que certamente facilitam a corrupção, e mesmo diante do fracasso da utopia socialista que permeia a cultura brasileira, as instruções divinas sobre a corrupção são muito pertinentes para cada um de nós. E estes princípios bíblicos sobre justiça, integridade e honestidade continuam a nos guiar. A corrupção não é apenas um problema político ou econômico, mas também uma questão moral que nos afeta pessoalmente. Deus nos convoca a sermos pessoas íntegras em todas as áreas de nossas vidas, a rejeitar a injustiça e a promover o bem comum. Portanto, devemos nos concentrar em viver de acordo com os princípios divinos, construindo uma cultura de honestidade, justiça e responsabilidade em nossas ações diárias. Essa abordagem individual pode ter um impacto significativo na transformação de nossa sociedade e na busca de um futuro mais ético e íntegro no país.

Como Alexis de Tocqueville observou, em sua obra A democracia na América, a moral cristã desempenhou um papel significativo na formação da sociedade norte-americana. Ele argumentou que a ética cristã, com seus princípios de igualdade, fraternidade e caridade, ajudou a moldar o caráter democrático dos Estados Unidos. A fé cristã, especialmente o protestantismo, influenciou não apenas a vida espiritual dos norte-americanos, mas também sua vida política e social. O pensador francês viu na moralidade cristã uma força que promoveu a coesão social, incentivou a participação cívica e contribuiu para o desenvolvimento de instituições democráticas robustas. Além disso, Tocqueville sugeriu que a religião desempenhou um papel fundamental na preservação da liberdade e da ordem em uma sociedade democrática. Ele argumentou que a crença em um único Deus criador e na ética revelada na aliança firmada entre esse único Deus e o seu povo eleito ajudaram a conter os excessos do individualismo e a promover o senso de responsabilidade pessoal e comunitária. Em resumo, de acordo com Tocqueville, a moral cristã desempenhou um papel crucial na formação dos Estados Unidos ao fornecer um conjunto de valores compartilhados que sustentaram a coesão social, promoveram a participação cívica e contribuíram para a estabilidade política duradoura em uma sociedade democrática.

No ranking do Índice de Percepção da Corrupção de 2023 da ONG Transparência Internacional, o Brasil ocupava o 104.º lugar, entre 180 países. A título de comparação, os Estados Unidos ocupam o 24.º lugar. Entre os países da América do Sul, o Brasil está atrás de Uruguai, Chile, Colômbia e Argentina. A posição ocupada pelo Brasil reflete os desafios persistentes que o país enfrenta no combate à corrupção e na promoção da transparência e integridade em sua governança. Mas, diante desse quadro, parece que a corrupção está profundamente enraizada na sociedade brasileira e, humanamente falando, as soluções parecem escassas. A situação, do ponto de vista humano, é desanimadora. No entanto, ao longo da história, a fé cristã tem desempenhado um papel crucial na formação moral e na coesão das sociedades no Ocidente. A fé cristã tem sido o elemento unificador que conecta as nações-Estado. É preocupante o esforço das elites e partidos esquerdistas em marginalizar os cristãos da esfera pública, especialmente do Estado. A religião civil ou identitária carece do poder necessário para unir uma nação. Apenas a fé cristã possui essa capacidade. Se os cristãos forem excluídos da esfera pública, o país perderá uma fonte vital de esperança e, nesse sentido, o futuro pode parecer sombrio, sugerindo um possível colapso do Brasil, assim como das nações-Estado ocidentais conforme as conhecemos.

Para enfrentar o mal da corrupção

Ocorrido no Reino de Israel, o episódio da “Vinha de Nabote”, descrito em 1Reis 21,1-29, é um exemplo importante que ressalta a sacralidade da propriedade privada e revela as nuances da corrupção. Nabote, como proprietário de uma vinha próxima ao palácio do rei Acabe, recusou-se a vendê-la, pois era uma herança de seus pais. O rei Acabe, tentando adquirir a vinha, recorreu a um estratagema corrupto sugerido por sua esposa, a rainha Jezabel. Esta manipulou os anciãos do reino para prestarem falsos testemunhos contra Nabote, resultando em sua morte por apedrejamento e na apropriação da vinha pelo rei.

Este relato bíblico destaca diferentes papéis na corrupção – aquele que promove e opera o esquema corrupto, os cúmplices que se deixam corromper – e ressalta a responsabilidade, especialmente dos líderes religiosos, em denunciar a corrupção. O profeta Elias confrontou o rei Acabe, condenando-o pela injustiça cometida contra Nabote e profetizando seu castigo divino: “Então a palavra do Senhor veio a Elias, o tesbita, dizendo: Levante-se, vá encontrar-se com Acabe, rei de Israel, que mora em Samaria. Eis que ele está na vinha de Nabote, aonde foi para tomar posse dela. Fale com ele, dizendo: Assim diz o Senhor: Você matou e, ainda por cima, tomou a herança? Fale também o seguinte: Assim diz o Senhor: No mesmo lugar onde os cães lamberam o sangue de Nabote, cães lamberão o seu sangue – sim, o seu sangue” (1Rs 21,17-19). Esse episódio evidencia a importância de líderes religiosos e espirituais falarem a verdade e denunciarem os corruptos e corruptores, mesmo quando isso os coloca em conflito com as autoridades civis. É um lembrete poderoso sobre a necessidade de integridade, justiça e responsabilidade em todas as esferas da vida, inclusive na esfera política e governamental.

A Bíblia evidencia a importância de líderes religiosos e espirituais falarem a verdade e denunciarem os corruptos e corruptores, mesmo quando isso os coloca em conflito com as autoridades civis

E a mensagem para todos os cristãos é clara, vinda diretamente de Jesus: “Porque eu afirmo que, se a justiça de vocês não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrarão no Reino dos Céus” (Mt 5,20). Essas palavras de Jesus destacam a importância da verdadeira justiça, que vai além das aparências externas e das práticas religiosas superficiais. Ele nos convida a uma busca por uma justiça que reflita a completa santidade de Deus, uma justiça baseada no amor, na misericórdia e na integridade. É um chamado para uma vida de autenticidade e compromisso com o Reino de Deus, que se manifestam em nossas ações e atitudes diárias.

Para a fé cristã, a solução para a corrupção não está apenas em medidas externas e humanas ou mais regulamentos e leis. Para ser verdadeiramente eficaz, a cura precisa atingir o cerne do problema, transformando o coração humano individualmente. Isso significa que a mudança genuína só pode acontecer por meio de uma regeneração interior, que ocorre quando o coração de uma pessoa é transformado pela graça de Deus. Nesse contexto, a fé cristã ensina que somente através de uma transformação espiritual profunda, que envolve arrependimento, perdão e renovação, é possível superar a corrupção em todas as suas formas. Essa abordagem não se limita a simplesmente impor leis e punições, mas busca uma mudança real nos valores, atitudes e comportamentos das pessoas. Assim, a solução para a corrupção, do ponto de vista cristão, reside em uma transformação interior que começa no coração de cada indivíduo e se reflete em toda a sociedade.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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