Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Franklin Ferreira

Franklin Ferreira

Igreja evangélica, Evangelho, teologia moral, história e cultura. Coluna atualizada às quintas-feiras

“Natal de Rappahannock”

A trégua de Natal na Guerra Civil Americana – luz em meio às trevas

Natal de Rappahannock
"Dia de Natal no Rappahannock", de Gilbert Gaul. (Foto: Domínio público)

Ouça este conteúdo

A Guerra Civil Americana (1861-1865) foi um conflito devastador que dilacerou a nação e as famílias dos Estados Unidos, colocando irmãos contra irmãos em uma luta por questões cruciais, como a unidade nacional e a escravidão. Em meio a essa violência e destruição, surgiram momentos de esperança que transcenderam as linhas de batalha. Um desses ocorreu em dezembro de 1862, durante a Batalha de Fredericksburg. Tropas da União e da Confederação, separadas por poucos metros em trincheiras geladas, trocaram cânticos natalinos em uma noite que ecoou com as verdades do Evangelho e a presença do Senhor Jesus como o Príncipe da Paz.

Esse evento, conhecido como o “Natal de Rappahannock”, destaca o poder da fé cristã e das tradições natalinas em oferecer consolo e reconciliação, mesmo em tempos de guerra fratricida. As memórias do nascimento do Messias Jesus trouxeram à tona a fé compartilhada entre os soldados da União e da Confederação, servindo como um lembrete da graça e do amor de Deus, que supera até mesmo as divisões políticas mais profundas.

Jesus, a luz em tempo de trevas

A Batalha de Fredericksburg, na Virgínia, travada entre 11 e 15 de dezembro de 1862, permanece como um dos episódios mais sangrentos da Guerra Civil Americana. Nesse confronto, as forças do Exército do Potomac, da União, lideradas pelo general Ambrose E. Burnside, sofreram uma derrota devastadora ao tentar desalojar o Exército do Norte da Virgínia, da Confederação, comandado pelo lendário general Robert E. Lee. As tropas confederadas estavam entrincheiradas em posições estrategicamente fortificadas, especialmente ao longo de Marye’s Heights, o que tornou qualquer ataque frontal virtualmente suicida.

O cenário era desolador: os campos cobertos de neve contrastavam com o vermelho do sangue derramado, um testemunho do custo brutal da guerra. O saldo da batalha foi aterrador. As forças da União sofreram cerca de 13 mil baixas, incluindo mortos, feridos e desaparecidos, enquanto as tropas confederadas registraram aproximadamente 5 mil perdas. Entre os caídos estavam quatro generais – dois de cada lado –, cujas mortes simbolizavam a dimensão do sacrifício humano no conflito.

Mais do que uma derrota militar para a União, Fredericksburg representou um golpe psicológico e moral profundo, tanto para soldados quanto para civis que acompanhavam a guerra. A violência desmedida, a paisagem repleta de corpos e a inutilidade aparente do derramamento de sangue obscureciam qualquer esperança de reconciliação entre a União e a Confederação. A batalha não apenas reforçou a fama de invencibilidade de Lee naquele momento da guerra, mas também sublinhou a realidade espiritual devastadora do conflito, onde a carnificina parecia superar qualquer possível ganho político ou militar.

O “Natal de Rappahannock”, destaca o poder da fé cristã e das tradições natalinas em oferecer consolo e reconciliação, mesmo em tempos de guerra fratricida

Diante da extensão da carnificina e do sofrimento destacou-se a ação corajosa de Richard R. Kirkland, sargento da Companhia G, 2.º Regimento de Infantaria da Carolina do Sul, pertencente à Brigada Kershaw, Divisão McLaw, do 1.º Corpo do Exército do Norte da Virgínia. Estacionado junto ao muro de pedra na estrada abaixo de Marye’s Heights, Kirkland, como tantos outros, ficou horrorizado com os gritos de socorro dos feridos da União durante a noite de inverno de 13 de dezembro. Após obter permissão de seu comandante, o general de brigada Joseph B. Kershaw, Kirkland reuniu cantis e, em plena luz do dia, sem o benefício de um cessar-fogo ou de uma bandeira de trégua, forneceu água a inúmeros soldados feridos da União espalhados pelo campo de batalha. Os soldados da União cessaram o fogo ao perceberem as intenções de Kirkland. Ele foi apelidado de “Anjo de Marye’s Heights” por essas ações e foi imortalizado com uma estátua no Parque Militar Nacional de Fredericksburg e Spotsylvania, onde ocorreram seus atos.

Foi nesse contexto que a mensagem cristã do Natal brilhou com uma intensidade especial. O Natal, celebrado como o nascimento do Messias Jesus na terra de Israel (Mateus 2,6.20-21), relembra o momento em que Deus veio ao mundo como ser humano para trazer salvação e paz aos homens. Para os soldados que viviam na iminência da morte, Jesus, o Salvador, oferecia conforto de que a luz ainda podia vencer as trevas, mesmo em meio ao horror da guerra.

Um surpreendente Natal

O cirurgião Spencer G. Welch, do 13.º Regimento de Infantaria da Carolina do Sul, da Segunda Brigada Gregg, da Divisão Ligeira A. P. Hill, do 2.º Corpo do Exército do Norte da Virgínia, escreveu em uma carta para sua esposa logo após o Natal: “Nosso regimento estava de sentinela no rio há alguns dias e os sentinelas ianques estavam na margem oposta. Não há disparos entre as sentinelas agora... Os homens nem sequer mantêm suas armas carregadas. Os dois lados conversam familiarmente entre si, e os ianques dizem que estão muito ansiosos para ter paz e voltar para casa”.

O sargento Berry G. Benson, da Companhia H, 1.º Regimento de Infantaria da Carolina do Sul, Brigada Jenkins, Divisão Pickett, do 1.º Corpo do Exército do Norte da Virgínia, descreveu suas lembranças do inverno de 1862 e 1863, quando sua unidade foi designada para serviço de piquete:

“Fazíamos a vigilância do [rio] Rappahannock na igreja de Moss Neck, e a vez de cada soldado no piquete chegava a cada poucos dias, com turnos de 24 horas. Ficamos bastante amigáveis com os piquetes inimigos postados no lado oposto, costumávamos conversar com eles e trocar jornais. A troca era feita utilizando um pedaço de madeira ou casca, fixando um graveto em pé como mastro, com o jornal preso a ele como uma vela. Ao ajustar a vela corretamente, o vento levava o jornal de um lado para o outro, conforme o desejado. Uma vez, uma banda da União desceu pelo rio e tocou Dixie. Nós os aplaudimos ruidosamente, é claro. Depois, tocaram Yankee Doodle, e os inimigos aplaudiram. Então tocaram Home, Sweet Home, e uma salva de aplausos ecoou forte e prolongada de ambos os lados do rio.”

O 140.º Regimento da Pensilvânia chegou à linha de frente em 20 de dezembro de 1862, apenas alguns dias após a terrível derrota da União em Fredericksburg. O regimento foi designado para a 3.ª Brigada, 1.ª Divisão, do 2.º Corpo do Exército do Potomac. No dia de Natal, os homens do 140.º da Pensilvânia foram destacados para a linha de frente para cumprir a função de sentinelas avançadas. Muitos dos jovens soldados do regimento, ainda inexperientes, estavam longe de casa em um Natal pela primeira vez. Estacionados nas margens congelantes do Rio Rappahannock, alguns iniciaram uma conversa com os soldados confederados que guarneciam o outro lado do rio, pertencentes à Brigada Barksdale, Divisão McLaw, do 1.º Corpo do Exército do Norte da Virgínia. John Paxton, que serviu no 140.º, contou em 1886 a história daquele Natal:

“‘Senhores, a cadeira de Professor de Matemática está vaga neste colégio [Jefferson College, em Canonsburg, Pennsylvania]; permitam-me apresentar-lhes o capitão [John] Fraser’. Rah! rah! rah! e lá fomos nós nos alistar – rumo a Richmond. Levou-nos três anos para chegar lá. Não é de se surpreender; havia tantas ‘Longstreets’ [ruas longas] para atravessar, tantas ‘Hills’ [colinas] para escalar, tantos ‘Stonewalls’ [muros de pedra] para derrubar, tantos ‘Picketts’ [piquetes] para limpar do caminho [Paxton faz um jogo de palavras com os nomes dos principais generais confederados]. Foi uma jornada tão difícil quanto o caminho íngreme e pedregoso para o céu...

Parti para Richmond em julho de 1862, um rapaz de 18 anos, estudante universitário, ansioso para a batalha, determinado a marchar rapidamente atrás da alma de John Brown [o mártir da abolição], que, como não precisava de mochila, ração de três dias, cantil ou descanso noturno, estava sempre marchando adiante.

Na véspera de Natal de 1862, eu era um jovem patriota desanimado, arrependido de ter me alistado, tremendo no frio a um quilômetro do [Rio] Rappahannock, na reserva de sentinelas, exposto a uma tempestade de neve úmida. Não havia um pedaço de madeira sequer num raio de oito quilômetros; tudo tinha sido cortado, até as raízes das árvores, e queimado. Deitamos em nossos cobertores [...], puxamos os de lã por cima, nos agrupamos o mais perto possível para roubar calor dos companheiros, e tentamos não chorar.

Na manhã seguinte, a neve estava pesada e profunda, e os homens, quando acordei e olhei ao redor, me lembraram de um cemitério de igreja no inverno. ‘Formem filas para o serviço de sentinela. Moore, McMeaus, Paxton, Perrine, Pollock, alinhem-se’. Nós nos alinhamos, claro. Sem café da manhã, gelados até os ossos, com neve de quase meio metro. Apertamos os cintos sobre os estômagos vazios, pegamos os rifles e marchamos para o rio para cumprir nossas seis horas de vigília.

Era o Dia de Natal de 1862. ‘Então isso é guerra’, pensei enquanto marchava pelos meus cinquenta metros de ronda na margem do rio. ‘Estou aqui para atirar naquele sujeito magro, pálido, tossindo e vestido de cinza amanteigado do outro lado do rio. Então isso é guerra; isso é ser soldado; essa é a verdadeira experiência; este é o famoso ‘Avançar para Richmond’ de H. Greeley. Bem, gostaria que ele estivesse aqui no meu lugar, correndo para se aquecer, batendo os braços no peito para fazer o sangue circular. Então isso é guerra, andando para cima e para baixo neste rio com os pés molhados, estômago vazio, nariz inchado’.

Para os soldados que viviam na iminência da morte, Jesus, o Salvador, oferecia conforto de que a luz ainda podia vencer as trevas, mesmo em meio ao horror da guerra

Ah, quando estava deitado sob as árvores do campus universitário em junho, guerra significava para mim música marcial, generais magníficos em azul e dourado, jovens altos em linha, brilhando em latão. Guerra significava memórias tumultuadas de Bunker Hill, da Décima Legião de César, da Carga dos Seiscentos [da Brigada Ligeira na Crimeia] – qualquer coisa menos isso. Bah, eu queria estar em casa. Casa? O país de Deus. Uma lágrima? Sim, uma lágrima. O que eles estão fazendo em casa? Hoje é Natal. Casa? Bem, meias penduradas na lareira, doces, peru, diversão, Feliz Natal e o rosto da garota que deixei para trás. Outra lágrima? Sim, não consegui evitar. Eu tinha apenas 18 anos, e havia um contraste tão grande entre o Natal de 1862 no Rappahannock e outros Natais. Sim, havia uma garota também – olhos tão doces, cílios tão longos, uma voz tão suave e terna.

‘Vamos, mais rápido. Quem vem aí?’ Mudo o rifle de um ombro dolorido para o outro.
‘Ei, Johnny [apelido dos confederados], o que está fazendo?’ O rio era estreito, mas fundo e rápido. O frio era úmido, não congelante. Não havia gelo, rápido demais para isso.
‘Ei, Johnny, por que tanta tosse?’
‘Yankee [apelido dos federais], sem casaco, sapatos cheios de buracos, nada para comer além de milho torrado e tabaco, e com essa maldita neve yankee de um pé de altura, não nos resta nada além de tossir como forma de protesto contra esse tratamento infernal. Nós todos tossimos aqui, Yank, e ninguém sabe o que nos acabará primeiro, a tosse ou suas balas.’

A neve continuava caindo, o vento cortante e cruel atingia até os ossos. Era o pior clima de Deus, no lugar mais abandonado de Deus, naquele Natal de 1862 no Rappahannock, a pouco menos de um quilômetro da cidade de Fredericksburg. Mas levante o ânimo, soldado trêmulo. Há umidade suficiente ao redor sem que você contribua com suas lágrimas.

‘Vamos rir, rapazes’.
‘Ei, Johnny’.
‘Ei, você mesmo, Yank’.
‘Feliz Natal, Johnny’.
‘Para você também, Yank’.
‘Diga, Johnny, tem algo para trocar?’
‘Milho torrado e tabaco – esse é o nosso Natal, Yank’.
‘Tudo bem; você terá café, açúcar e carne de porco nossos. Meninos, encontrem os barcos’.

Tais barcos! Pareciam aqueles com que crianças brincam nos lagos do Central Park. Algum yankee, desesperado por tabaco, os inventou para negociar com os confederados. Eles ficavam escondidos sob as margens do rio, aguardando os turnos de sentinelas.

Tiramos os barcos. Um lenço velho servia de vela. Colocamos café, açúcar, carne de porco, içamos a vela e os vimos lentamente cruzar para o outro lado. E os confederados? Era incrível vê-los se aglomerarem na margem, empurrando-se para ser os primeiros a pegar os barcos, entrando na água e esticando os braços. Então, quando puxaram os barcos para a terra e ficaram em volta da carga, suas exclamações foram: ‘Viva o porco!’ ‘Isso não é centeio torrado, é café de verdade. Cheire isso!’ ‘E açúcar também!’

Depois dividiram a remessa. Riram e gritaram: ‘Parece que vocês foram bons conosco neste Dia de Natal, Yankees’. Em troca, colocaram milho torrado, tabaco e caquis maduros nos barcos e os enviaram de volta para nós. E nós mastigamos o milho torrado, fumamos folhas de tabaco da Virgínia, comemos caquis que, mesmo não sendo muito nutritivos, ao menos diminuíam o tamanho de nossos estômagos para caber nosso jantar de Natal.

E assim o dia passou. Gritamos: ‘Feliz Natal, Johnny’. Eles gritaram: ‘Para você também, Yank’. Esquecemos o vento cortante, o frio congelante; esquecemos que aqueles homens eram nossos inimigos, que talvez tivéssemos de atirar contra eles antes do anoitecer. Havíamos construído uma ponte sobre o rio, um elo sobre o abismo sangrento. Éramos irmãos, não inimigos, trocando saudações de boa vontade em nome do Menino de Belém, no Natal de 1862. Bem na linha de frente dos exércitos em oposição, o Menino Jesus declarou uma trégua para nós, derrubou o muro da separação e tornou-se nossa paz. Trocamos presentes. Gritamos saudações uns para os outros. Comemoramos o Natal e nossos corações ficaram mais leves, e nossos corpos trêmulos, um pouco menos frios.”

Um dos irmãos de John, Wilson, foi capturado pelos confederados na Batalha de Gettysburg, em 1863. Seu outro irmão, Thomas, foi morto em combate em Spotsylvania, em 1864. Depois da guerra, John se formou nos Seminários Teológicos Western e de Princeton, e pastoreou igrejas presbiterianas na Pensilvânia, Washington D.C. e Nova York.

Na noite de Natal, o tenente William G. McCabe, servindo no Batalhão de Artilharia de Pegram da Virgínia, Divisão Ligeira A. P. Hill, do 2.º Corpo do Exército do Norte da Virgínia, escreveu um poema intitulado Noite de Natal 1862, que foi logo publicado em vários jornais do Sul.

O sopro de inverno vai uivando,
a neve cai sobre minha cabeça;
ouço o passo solitário da sentinela,
e fogueiras distantes iluminam o céu.

Formas sombrias deslizam pela penumbra;
os soldados se reúnem ao redor das chamas
para falar de outros natais
e murmuram suavemente sobre o lar, o lar.

Meu sabre balança sobre minha cabeça,
brilhando no brilho inconstante da fogueira,
enquanto a neve cortante e cegante
cai furiosa e a memória me leva aos mortos.

A troca de presentes e o breve cessar das hostilidades em Fredericksburg simbolizam a busca por algo maior do que a guerra – uma lembrança da paz prometida por Deus através de Jesus

Meus pensamentos vagueiam de lá para cá,
vibrando entre o Agora e o Então;
eu vejo novamente o lar humilde,
o velho salão decorado com visco.

E doce, vindo de anos distantes,
ecoam risadas suaves e baixas,
as vozes de um Longínquo Passado!
Meus olhos se enchem de lágrimas ternas.

Sinto de novo o beijo materno,
vejo outra vez a surpresa alegre
que iluminava os olhos tranquilos
e os fazia transbordar de lágrimas de felicidade.

Ao correr para fora da velha porta,
ela me abraçou com carinho –
seu rosto radiante com a alegria
de ver seu menino travesso em casa outra vez.

Meu sabre balança no galho,
brilhando no brilho inconstante da fogueira,
enquanto a neve cortante e cegante
cai de lado sobre minha testa entristecida.

Esses rostos queridos se foram!
Dormem em sepulturas silenciosas
onde a neve se acumula em ondas –
E eu estou sentado aqui sozinho.

Não há camarada nesta noite
que não saiba que entes queridos, distantes,
ajoelhados, esta noite orarão:
“Deus, traga nosso querido de volta da luta.”

Mas não há ninguém para me desejar de volta,
por mim, nenhuma oração ansiosa se eleva,
os lábios estão mudos e os olhos, fechados –
Meu lar é o acampamento.

Em 1863 McCabe esteve envolvido nas bem-sucedidas defesas do Forte Sumter e Forte Wagner, na Ilha Morris. Este último foi palco de bombardeios navais e dois ataques terrestres: o primeiro, realizado por uma única brigada, em junho de 1863; e o segundo, um mês depois, por uma força muito maior de dez regimentos de infantaria, liderados heroicamente pelo 54.º de Massachusetts, comandado pelo coronel Robert G. Shaw. Este ataque foi retratado no celebrado filme Glory (1989). Os versos que McCabe escreveu em Fredericksburg evocam de forma pujante o sentimento de tristeza que permeava a Confederação naquele Natal.

Numa carta de Natal, escrita pelo general Robert E. Lee poucos dias após a batalha de Fredericksburg para sua esposa, Mary Anna Randolph Custis Lee, reflete tanto sua devoção a Deus, o amor pela família, o impacto pessoal da guerra e evocações sobre o significado real do “dia santo” do Natal.

“Começarei este dia santo, querida Mary, escrevendo para você. Meu coração está cheio de gratidão ao Deus todo-poderoso por Suas misericórdias indescritíveis com as quais Ele nos abençoou neste dia, por aquelas que nos concedeu desde o início da vida e, particularmente, pelas que nos tem oferecido durante o último ano. O que teria sido de nós sem Sua suprema ajuda e proteção? Eu vi Sua mão em todos os eventos da guerra. Oh, se o nosso povo apenas reconhecesse isso e parasse com sua vã autoglorificação e adulação, como seria forte minha crença no sucesso final e na felicidade de nosso país. Pois sei que somente Nele estão a nossa confiança e segurança.

Separado de toda comunicação com você e com meus filhos, meu maior prazer é escrever para você e para eles. Contudo, não tenho tempo para me dedicar a isso. Você precisa dizer isso a eles e dizer que penso constantemente neles e os amo reverentemente com todo o meu coração. Eles devem me escrever sem esperar respostas. [...]

Mas que coisa cruel é a guerra. Separar e destruir famílias e amigos, e arruinar as mais puras alegrias e felicidades que Deus nos concedeu neste mundo. Encher nossos corações de ódio em vez de amor pelo próximo e devastar a bela face deste maravilhoso mundo. Oro, neste dia em que ‘paz e boa vontade’ são pregadas a toda a humanidade, para que pensamentos melhores encham os corações de nossos inimigos e os voltem para a paz. A confusão que agora existe em seus conselhos [referência à União] resultará em algo bom.

Nosso exército nunca esteve em tão boa saúde e condição desde que me juntei a ele, e acredito que compartilham comigo minha decepção pelo fato de o inimigo não ter renovado o combate no dia 13. Eu estava me contendo o dia todo, economizando nossas forças e munições para a grande luta para a qual pensei que ele estava se preparando. Se eu soubesse que aquele seria seu único esforço, ele teria enfrentado mais do nosso empenho. Mas estou satisfeito. Poderíamos ter ganho mais, mas também teríamos perdido mais, e talvez nossa condição relativa não tivesse sido melhorada. Meu coração sangra com a morte de cada um de nossos valentes homens.

Envie muito amor a todos. Beije Chass e Agnes por mim, e acredite em mim, com verdadeira afeição.”

Em uma guerra que dividiu famílias, comunidades e a própria nação, a celebração do Natal nas linhas de frente da Guerra Civil revela como a tradição cristã influenciava profundamente a vida dos soldados

A profecia sobre Jesus ser o Príncipe da Paz (Isaías 9,6-7) foi particularmente poderosa no inverno de 1862. A troca de presentes e o breve cessar das hostilidades em Fredericksburg simbolizam a busca por algo maior do que a guerra – uma lembrança da paz prometida por Deus através de Jesus. Para muitos soldados cristãos, o Natal era uma ocasião para refletir sobre sua fé e renovar sua esperança em um futuro além do sofrimento da guerra. Esse breve momento de trégua foi, portanto, um ato de resistência espiritual contra a desumanização do conflito, uma forma de reafirmar que o amor divino não podia ser apagado pelas circunstâncias terrenas.

A importância da tradição do Natal

Em uma guerra que dividiu famílias, comunidades e a própria nação, a celebração do Natal nas linhas de frente da Guerra Civil revela como a tradição cristã influenciava profundamente a vida dos soldados. Muitos vinham de lares onde a leitura da Bíblia, o culto em família e a participação em igrejas protestantes eram práticas centrais no cotidiano. Para esses homens, o Natal era um momento de lembrar não apenas o nascimento de Jesus, mas também seu amor sacrificial demonstrado na cruz, uma mensagem particularmente relevante para quem enfrentava diariamente a possibilidade de morrer em batalha.

Ao trocarem presentes no Rio Rappahannock, em 1862, os combatentes dos dois lados expressavam seu desejo de paz e sua fé na promessa de um reino divino de graça e reconciliação. Essa fé funcionava como uma ancora em meio ao caos, oferecendo esperança nos momentos mais sombrios. O episódio também destaca a capacidade do Evangelho de inspirar misericórdia e empatia: apesar de lutarem em lados opostos, os soldados compartilhavam experiências comuns de medo, saudade, perda e fé. O Natal, com sua mensagem de amor, lembrou a todos que, antes de serem inimigos, eram irmãos na criação divina.

Embora este episódio não tenha alterado os rumos da Guerra Civil, deixou um legado espiritual e moral duradouro – inclusive na consolidação da tradição de troca de presentes no Natal. Em meio à violência e ao desespero, a mensagem de Jesus brilhou como um raio de luz, oferecendo consolo e esperança. Para os soldados que viveram aquele Natal às margens do Rappahannock, a troca de presentes foi um raro momento de misericórdia em meio à brutalidade da guerra. Para as gerações seguintes, tornou-se um exemplo da força da fé cristã em reconciliar divisões e reafirmar a dignidade humana nos cenários mais difíceis.

Em um conflito marcado pela destruição, soldados inimigos encontraram, ainda que brevemente, comunhão ao se voltarem para o Senhor Jesus, o Príncipe da Paz. A memória do Natal trouxe um vislumbre da reconciliação prometida pelo Evangelho, evidenciando o poder transformador do Messias, capaz de unir corações mesmo nas circunstâncias mais sombrias. Que essa memória continue a inspirar a busca pelo amor e pela união em meio às adversidades.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.