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Franklin Ferreira

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Igreja evangélica, Evangelho, teologia moral, história e cultura. Coluna atualizada às quintas-feiras

Religião

O espantoso crescimento do cristianismo na África

Padres ortodoxos realizam procissão em Lalibela, na Etiópia. (Foto: Anne Saurat/Unesco/Wikimedia Commons)

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A África foi um dos bastiões do cristianismo primitivo, especialmente os territórios que correspondem aos atuais Egito e Tunísia. Alguns dos mais importantes pensadores cristãos da história foram africanos, como Tertuliano de Cartago, Clemente de Alexandria, Orígenes de Alexandria, Cipriano de Cartago, Atanásio de Alexandria e Agostinho de Hipona. No entanto, a partir da conquista muçulmana, nos séculos 7.º e 8.º, a igreja cristã praticamente deixou de existir ali, restando alguns centros católicos na atuais Líbia e na Argélia que resistiram até o século 12, além de antigas expressões de fé cristã no Egito, na Etiópia e na Eritreia, que ainda existem.

O crescimento do catolicismo

De acordo com Philip Jenkins, em 1300, cerca de 40% da população africana controlada pelo califa muçulmano era cristã, vivendo sob implacável perseguição. Com a era dos descobrimentos, os franciscanos chegaram a Cabo Verde entre 1456 e 1460, e, entre 1482 e 1632, missionários portugueses chegaram a Gana. Os capuchinhos franceses chegaram à Guiné em 1637, e em 1534 um bispado foi estabelecido em São Tomé e Príncipe com o apoio de agostinianos portugueses. A partir do século 20, a Igreja Católica expandiu-se rapidamente na África. A fé dos católicos africanos é fortemente conservadora e tradicional, mas frequentemente carismática. Entre seus líderes mais destacados estão os cardeais Francis Arinze (1932-), nigeriano, e Robert Sarah (1945-), guineense. Em 2009, estimava-se que cerca de 120 milhões de africanos eram ligados ao catolicismo e à ortodoxia oriental.

A chegada dos protestantes

A partir das missões protestantes do século 19, a fé protestante cresceu enormemente na África Subsaariana. Muitas das igrejas que surgiram nessa região são oriundas das igrejas dos missionários, cujos países colonizavam a África. Mas a independência das colônias permitiu-lhes mesclar os ensinamentos cristãos com ideias e valores africanos tradicionais, com a fundação de um imenso número de igrejas independentes. A maioria dessas igrejas é pentecostal, com forte ênfase em curas e exorcismos. Várias igrejas locais têm como líder um profeta carismático e fortes elementos sincréticos, como a igreja kimbanguista, fundada pelo batista Simon Kimbangu (1889-1951) na atual República Democrática do Congo, e a Igreja Harrista na Costa do Marfim, fundada pelo metodista William Wadé Harris (c. 1860-1929), que mudou seu nome em 2000 para Igreja de Cristo. Algumas das maiores igrejas africanas estão ligadas ao movimento Aladura (“povo de oração”), que surgiu na Nigéria entre 1920 e 1930, sob a liderança de Josiah Ositelu (1902-1966). A maioria de seus fundadores é oriunda de divisões ocorridas nas igrejas anglicana e metodista naquele continente, e as ênfases doutrinárias do movimento são pentecostais. Inserindo-se na tradição da Reforma, a Igreja Apostólica de São Miguel, em Botsuana, proclama que a igreja “é uma congregação de homens fiéis em que a pura Palavra de Deus é pregada e os sacramentos são ministrados diariamente, de acordo com as determinações de Cristo”.

A fé dos católicos africanos é fortemente conservadora e tradicional, mas frequentemente carismática

O apartheid na África do Sul

De 1652 a 1835, protestantes oriundos da Holanda, da Alemanha, da França e da Escócia migraram para a África do Sul, combinando-se para formar um povo distinto, chamado de africâners. Os huguenotes formaram um número significativo desses imigrantes, tendo chegado à África do Sul entre 1687 e 1691, fugindo da perseguição que começou na França depois que o Édito de Nantes foi revogado. Essas pessoas se consideravam mais africâners que europeus, falando seu próprio idioma, o africâner. Os africâners implantaram na África do Sul o modelo do desenvolvimento em separado conhecido como apartheid (“separação”), o regime de segregação racial adotado de 1948 a 1994 pelo Partido Nacional, que foi apoiado por segmentos da estatal Igreja Reformada Holandesa na África do Sul. Os africâners se uniram em torno de uma forma de calvinismo africâner, uma tentativa de unir uma reinterpretação da noção de Abraham Kuyper (1837-1920) de soberania das esferas com aspirações nacionalistas. Um dos pregadores de maior destaque dessa igreja foi Andrew Murray (1828-1917), que esteve envolvido com o avivamento ocorrido em 1860.

Por causa do racismo e do segregacionismo dos africâners, que atingiam mais de 26 milhões de africanos, surgiram muitas igrejas independentes na África do Sul como forma de protesto contra o controle dos brancos sobre as igrejas instituídas. Uma delas foi a Igreja Reformada Holandesa na África. Em 1892, o metodista Mangena M. Mokone (1851-1936) fundou a Igreja Etíope, que se opunha ao controle europeu da igreja sul-africana. A maior igreja independente do país é a Igreja Batista Nazaré, fundada por Isaiah Shembe (1870-1935), em 1910, entre a tribo zulu. Em 1954, o luterano Erlo Stegen (1935-) começou a trabalhar como missionário entre a população zulu em Natal, e nos anos de 1966-1967 um avivamento começou entre essa tribo, marcada por conversões em massa e curas milagrosas, o que levou à fundação do centro Kwasizabantu (“lugar onde as pessoas se ajudam”) em 1971. Esse centro se tornou sinônimo do movimento.

Após a derrota africâner para a Inglaterra na Guerra dos Bôeres (1880-1881 e 1899-1902), foi criada a União Sul-Africana, como protetorado inglês, com a anexação das repúblicas bôeres do Transvaal e do Estado Livre de Orange às colônias britânicas da Província do Cabo e de Natal. Em 1961, a União se dissolveu, quando foi declarada a República da África do Sul. Os africâners estabeleceram-se como a minoria dominante na África do Sul até que a pressão internacional e o crescimento do caos social tornaram impossível manter a política do apartheid, que se encerrou em 1994.

O maior crescimento religioso da história

Em 1900, havia entre 8 milhões e 10 milhões de cristãos na África, mas em 2000 havia cerca de 380 milhões de cristãos espalhados em 53 países, o que representava cerca de 40% da população africana. Esse crescimento religioso coincide com o fim do colonialismo europeu, e, em termos quantitativos, é o maior que já ocorreu em todos os tempos. Nesse contexto, o evangelista pentecostal alemão Reinhard Bonnke (1940-2019) pregou o evangelho para públicos imensos no continente africano desde 1967. Em 2000, numa única noite, ele pregou para uma multidão calculada em 1,6 milhão. Na Conferência de Lambeth, em 1998, 224 dos 735 bispos anglicanos que participaram do encontro eram da África, e apenas 139 eram da Inglaterra ou da Europa. Atualmente, os anglicanos na Nigéria chegam a 20 milhões de membros batizados, enquanto há quase 3 milhões nos Estados Unidos. O pastor anglicano mais conhecido do mundo é o arcebispo Desmond Tutu (1931-2021), que ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1984 por sua luta contra o apartheid na África do Sul. E, talvez, o teólogo de maior destaque foi o nigeriano Byang Kato (1936-1975), da Igreja Evangélica da África Ocidental, que lutou por uma educação teológica autóctone e contra as tendências à cristianização do paganismo africano.

Em contraste, Norte da África e Oriente Médio têm perseguição

Saindo da África e indo para o Oriente Médio, berço da fé cristã, as comunidades cristãs estão sob violenta perseguição islâmica. No Iraque, após a invasão americana e britânica de 2003, a maioria dos cristãos viu-se forçada a emigrar para o norte, estabelecendo-se entre os curdos, na fronteira com a Turquia. A população cristã foi reduzida de 1,5 milhão de fiéis para apenas 350 mil, vivendo em meio a 25 milhões de muçulmanos. No Irã, multiplicam-se as histórias de igrejas invadidas, prisões e confiscos de Bíblias. Então, segundo dados de 2005, num processo iniciado há 15 anos, 125 mil cristãos armênios deixaram o Irã e 500 mil cristãos deixaram o Iraque.

Nos territórios palestinos o êxodo dos cristãos tem se acentuado, e muitos têm partido para Europa, Chile e El Salvador. Na Síria, a sede do segundo mais antigo patriarcado cristão, os cristãos ortodoxos representam 10% da população, mas muitos têm emigrado por falta de perspectivas econômicas e perseguições. Com o irrompimento da guerra civil, em 2011, os rebeldes muçulmanos começaram as perseguições e os assassinatos contra os cristãos e a destruição de igrejas. Com isso, iniciou-se um êxodo em massa para o Líbano – dos 60 mil cristãos que viviam em Homs, apenas mil permanecem lá na atualidade. No Líbano, os cristãos foram majoritários, mas as atuais forças políticas são sunitas ou xiitas. No Egito, os cristãos coptas, que compõem 10% da população do país (cerca de 10 milhões de egípcios), têm tido suas igrejas queimadas, e confrontos com milícias muçulmanas são comuns em Alexandria e no Cairo.

Se no começo do século 20 aproximadamente 70% da população cristã mundial vivia na Europa, esse total caiu para 28% no fim do mesmo século. Atualmente, a América Latina e a África juntas contam hoje com cerca de 40% dos cristãos no mundo

Em Israel, o cristianismo é a terceira maior religião, depois do judaísmo e do islamismo. No fim de 2022, os cristãos representavam 1,9% da população israelense, totalizando aproximadamente 185 mil pessoas. Dez igrejas cristãs são formalmente reconhecidas pelo sistema confessional de Israel: a Igreja Apostólica Armênia, a Igreja Católica Armênia, a Igreja Católica Caldeia, a Igreja Episcopal em Jerusalém e no Oriente Médio, a Igreja Ortodoxa Grega, a Igreja Católica Latina, a Igreja Católica Greco-Melquita, a Igreja Católica Síria, a Igreja Maronita Síria e a Igreja Ortodoxa Síria. Todos os principais sítios históricos da fé cristã em Israel são protegidos pelo Estado e preservados por igrejas e organizações cristãs.

O protestantismo chegou a Israel pelos auspícios da Sociedade de Londres para a Promoção do Cristianismo entre os Judeus (LSJ), que apoiou a criação do cargo de bispo anglicano em Jerusalém, em 1841; em 7 de novembro daquele mesmo ano, Michael Solomon Alexander (1799-1845), um rabino convertido, foi consagrado bispo anglicano, para servir a partir de 1842 como o primeiro “bispo em Jerusalém”. Esse bispado, que contava com o apoio da rainha Vitória, foi resultado de um esforço conjunto de anglicanos, reformados e luteranos da Igreja Evangélica da Prússia. A LSJ foi ativa na fundação da Igreja de Cristo em Jerusalém, perto do Portão de Jaffa, a mais antiga igreja protestante no Oriente Médio, concluída em 1849. Como todas as sinagogas da cidade, sua fachada está voltada para o Monte do Templo. A partir de 1887, o esforço missionário continuou exclusivamente sob os auspícios anglicanos. A sede do bispado anglicano na região foi mudada para a Catedral de São Jorge, em Jerusalém, próximo ao Jardim da Tumba, construída em 1898. A LSJ apoiou o estabelecimento do Estado de Israel em 1948 e continua a se engajar na defesa dos direitos de Israel, o único país no Oriente Médio onde há liberdade religiosa. Na atualidade, cerca de 20 mil israelenses são judeus messiânicos, ou seja, são judeus que reconhecem Jesus como o Messias prometido no Antigo Testamento e se identificam como seguidores do Novo Testamento.

Uma impressionante mudança

Em cerca de um século, o eixo do cristianismo mudou. Se no começo do século 20 aproximadamente 70% da população cristã mundial vivia na Europa, esse total caiu para 28% no fim do mesmo século. Atualmente, a América Latina e a África juntas contam hoje com cerca de 40% dos cristãos no mundo. Todo esse crescimento foi acompanhado por intensa perseguição promovida ou por muçulmanos ou por governantes autoritários. Um dos mais conhecidos mártires africanos é o anglicano Janani Luwum (1922-1977), arcebispo da Igreja da Uganda de 1974 a 1977 e um dos mais influentes líderes da igreja africana, preso, torturado e assassinado a mando do infame Idi Amin. Na África do Sul, a catecúmena Manche Masemola (1913-1928), da tribo pedi, em Transvaal, foi assassinada por seus próprios parentes, “batizada em seu próprio sangue”. Esther John (1929-1960), enfermeira presbiteriana, foi morta no Paquistão por um muçulmano.

Sobre o futuro da fé cristã, Philip Jenkins escreve que “o cristianismo deverá ter uma explosão de crescimento mundial nos próximos 100 anos, mas a vasta maioria dos fiéis não será branca nem europeia, nem tampouco euro-americana”. Embora surjam sinais de “índices fenomenais de crescimento populacional nos países muçulmanos”, o fato é que “índices similares ou até mais altos também são encontrados em países cristãos já populosos, sobretudo na África. Ao lado da eflorescência muçulmana [...], haverá também uma explosão populacional cristã, amiúde nos mesmos países ou em nações adjacentes”. Ele continua: “Nos últimos 100 anos, o centro de gravidade do mundo cristão deslocou-se inexoravelmente para o Sul, para a África, a Ásia e a América Latina. Já em nossos dias, as maiores comunidades cristãs do planeta encontram-se na África e na América Latina. Se quisermos visualizar um cristão contemporâneo ‘típico’, deveremos pensar numa mulher residente numa aldeia da Nigéria ou numa favela brasileira”. O cristianismo, no começo do século 21, está não apenas sobrevivendo, mas se expandindo.

Sobre o perfil dessa nova cristandade, Jenkins escreve: “Essas novas igrejas pregam uma fé pessoal profunda e uma ortodoxia comunal, assim como o misticismo e o puritanismo, todos calcados na clara autoridade das Escrituras”. Todavia, “os integrantes de uma nova Igreja dominada pelo Sul tenderão a estar entre os mais pobres do planeta, num contraste marcante com o antigo mundo dominado pelo Ocidente”. Ainda assim, “à medida que continuar a se expandir e amadurecer, o cristianismo meridional certamente desenvolverá um espectro teológico mais amplo do que hoje, e é possível que emerjam tendências liberais ou secularizantes mais fortes. No futuro previsível, porém, a corrente dominante do cristianismo mundial emergente será tradicionalista, ortodoxa e voltada para o sobrenatural”.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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