Nesta semana meu filho, de três anos, teve uma apresentação de judô na escola, bem na hora do almoço. Quando soube que teria esse evento, prometi a ele que estaria lá, mas foi uma semana muito corrida e confesso que duas ou três vezes passei perto de decidir que não daria para ir.
Deixar de ir significaria dar um péssimo exemplo sobre cumprimento de palavra. Fiz cálculos milimétricos e um verdadeiro malabarismo para conseguir sair, ficar lá por pelo menos 30 minutos e voltar ao trabalho dentro do meu intervalo de almoço. Seria corrido, mas possível.
E valeu muito a pena ter ido ver ele e os colegas, inicialmente inibidos com a presença de tantos desconhecidos, aos poucos irem adquirindo confiança e se soltando para demonstrar alguns movimentos de queda e várias cambalhotas.
Aproveitei o momento para contrabandear uma paçoca e, no final, entregar para ele em segredo (lá é bem regrado quanto a comer doces, mas era uma ocasião especial).
Passada a correria, viver esse processo me levou a pensar no que acontece dentro da cabeça dos pequenos quando estamos lá para assisti-los e apoiá-los nessas apresentações que normalmente não são nada de encher os olhos, mas têm um potencial enorme de gerar benefícios a eles – e claro, também faz muito bem a nós, pais.
Para entender melhor quais os efeitos positivos no cérebro e no desenvolvimento emocional das crianças quando contam com a presença dos pais em apresentações escolares, decidi pedir ajuda a duas pessoas que acredito que estejam entre as mais capacitadas para falar sobre o assunto: o dr. Julio Muzzetti, neuropediatra e mestre em Biotecnologia Aplicada à Saúde da Criança e Adolescente, e a Karina Rizzardi, psicóloga especialista em casais e família.
A mágica no cérebro da criança quando vê os pais
De forma prática, a primeira coisa que acontece no cérebro de uma criança quando vê que seus pais estão presentes em uma apresentação na escola é que o sistema límbico, responsável pelas emoções, é ativado, promovendo sentimentos de afeto e pertencimento.
Só quem já prestou atenção na mudança do olhar da criança quando, em meio a tantos rostos desconhecidos, finalmente encontra o seu pai e/ou a sua mãe, sabe o quanto isso é incrível!
Essa mudança da expressão acontece porque o sistema de recompensa no cérebro também é ativado, liberando neurotransmissores como a dopamina, que contribuem para a sensação de prazer e realização.
Saber que os pais estão presentes também ajuda a reduzir o estresse que muitas crianças sentem ao se apresentar em público – quem nunca viu o filho “congelar” ou ter uma reação totalmente diferente do esperado em uma apresentação?
Com os pais por perto, o córtex pré-frontal, ligado à regulação do estresse, recebe sinais de segurança, o que diminui os níveis de cortisol: o famoso “hormônio do estresse”.
Além de toda essa reação bioquímica imediata, há outros benefícios de longo prazo que acontecem a partir de momentos como esse, como vamos ver agora.
Ajuda a criar resiliência e uma base emocional forte
É importante saber que para criança é um desafio muito grande estar à frente de dezenas de pessoas que nunca viu na vida fazendo algo que ela muitas vezes ainda não tem segurança, como uma apresentação de judô, de música, dança ou qualquer outra coisa.
Mas a lembrança desses momentos desafiadores em que se sentiram importantes e amparados ajuda a criar uma base emocional forte, o que no futuro vai contribuir em aspectos como tomada de decisões e resolução de problemas.
Além disso, com o passar dos anos esses adultos que desfrutaram de momentos assim, de apoio e presença dos pais, tendem a lidar melhor com as relações interpessoais e a enfrentar desafios com mais resiliência.
“Esses pequenos gestos de presença, mesmo em situações como uma simples apresentação na escola, constroem a capacidade de viver de forma mais saudável emocionalmente, criando boas conexões com os outros”, explica Julio Muzzetti.
Amplia o senso de segurança
Momentos assim também são propícios para o desenvolvimento do senso de segurança e da identidade da criança.
Como explica a psicóloga Karina Rizzardi, ocasiões assim são capazes de gerar reflexos nas atividades profissionais, pessoais e afetivas do futuro adulto. “Quando a criança vê os pais, os sensores de afeto, valor e importância vão ficando mais fortalecidos para que ela mesma se sinta importante. Ela precisa sentir que é especial, única, cuidada, porque isso vai refletir lá na frente”.
“Toda essa troca afetiva – óbvio que não fica presa só nas apresentações na escola, mas em um cenário diário dessa atenção –, é passada para a própria criança como um fortalecedor emocional”, continua.
“Grava” sentimentos positivos no cérebro e fortalece a autoconfiança
Experiências como essas podem criar importantes memórias afetivas com os pais e aumentar a conexão emocional entre a família. Além disso, o hipocampo, área do cérebro responsável pela formação de memórias, vai armazenar essas lembranças, e o cérebro tende a associar situações futuras de apresentações com sentimentos positivos. Isso vai facilitar com que a criança lide melhor com os desafios nas próximas apresentações.
“A criança começa a associar essas experiências a sensações boas e acolhedoras, fortalecendo os laços familiares e contribuindo para o desenvolvimento emocional. Isso promove a autoconfiança, fazendo com que ela se sinta capaz de enfrentar novos desafios, sabendo que conta com o apoio daqueles que ama”, conta o dr. Julio.
É claro que não é uma única ida a uma apresentação do filho, seja na escola, na igreja ou qualquer outro lugar, que vai gerar todos esses benefícios. Quando se trata de criação de filhos, presença e constância são inegociáveis.
Voltando à história do começo do texto, depois da apresentação dos movimentos “técnicos” que divertiram muito os pais, no final cada criança disputou uma “lutinha” com um colega, e o Vitor acabou perdendo a dele. Mas de que importa? Naqueles minutos que passaram tão rápido ganhamos tanto!
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