Há algumas semanas decidi fazer um inventário em meus dispositivos móveis, listando os aplicativos que uso bastante no meu dia-a-dia e verificando se são gratuitos ou pagos. Constatei que gasto bastante dinheiro com aplicativos e serviços. Passei a fazer uma análise dos meus hábitos de compra para compreender o que eu prefiro que seja pago ao invés de gratuito e por que.
Na verdade, hoje em dia nenhum aplicativo é verdadeiramente grátis. Quando você baixa um “free app”, há 3 cenários com os quais você pode se deparar: 1) o aplicativo é gratuito mas espera que você realize algum tipo de compra dentro dele (exemplos: Uber, delivery de comida, lojas etc.); 2) o aplicativo é gratuito mas supotado por anúncios e/ou cessão de dados pessoais; 3) o aplicativo é freemium (gratuito mas com modelo de assinatura que tira os anúncios e fornece funcionalidades extras).
Parece-me que os modelos de negócios de compra única estão sendo cada vez mais substituídos pelas assinaturas. E que as modalidades gratuitas estão cada vez mais espartanas, obrigando o usuário a assinar algum tipo de plano — o que tem irritado muita gente. Puxa, pagar periodicamente para usar um app? Aconteceu recentemente com o 1Password, o Newton e tantos outros. Aplicativos estão, portanto, se tornando serviços. Isto é correto?
Fato é que a própria dinâmica da economia na web tem tomado novos rumos. Internet não é mais luxo, é commodity. As pessoas compram e vendem pela internet, trabalham em ambientes digitais, guardam seus dados em nuvem, se comunicam via redes digitais e até exercem sua cidadania em serviços públicos online. Para os desenvolvedores toda essa mudança é ótima, pois transformar apps em serviços gera receita constante, cobre os custos com servidores (que também são constantes), inibe a pirataria e, consequentemente, gera mais empregos e oportunidades.
O boom dos aplicativos móveis aconteceu quando eles passaram a gerar receita com anúncios em troca da gratuidade. Houve alguns exageros: certa feita, o criador de um aplicativo estilo “sticky notes” para iOS, bem bonitinho e colorido, passou a impedir o acesso ao app caso o aparelho não estivesse conectado para exibir anúncios. Um aplicativo de notas simples, com armazenamento exclusivamente local, exigindo conectividade? A revolta dos usuários foi grande.
Aplicativos assim entraram em extinção. Hoje, para usar um app grátis, você precisa no mínino criar uma conta, ceder alguns dados pessoais e dar permissões para acesso a outros apps de seu aparelho. Assim, para o usuário, pagar por aplicativos muitas vezes significa a preservação de seus dados e privacidade. Você já parou para se perguntar como pode um aplicativo como o WhatsApp ter sido comprado por bilhões de dólares pelo Facebook e custar outros tantos bilhões para ser mantido sem gerar um único centavo de receita? Pois é.
Quanto custa ao Google um serviço como o Gmail, por usuário/ano? Quanto você teria que pagar anualmente por todos os serviços gratuitos que usa caso fossem pagos? Coloque na conta aplicativos, jogos, vídeos online e redes sociais. Ficou mais fácil dimensionar o quão valiosos são seus dados pessoais, correto? Eles interessam muito a grandes varejistas, corporações em geral e até governos.
Você não precisa se apavorar e cancelar todas as suas contas web afora. Analise criteriosamente o que você realmente fornece ao usar um aplicativo gratuito. Por muitos anos só usei calendários a partir de um serviço Exchange pago, pois colocava lá dados de pacientes e seus números de documentos, o que exigia maior segurança. Hoje meu uso é mais low-profile e optei pelo Google Calendar, gratuito, sem problemas. Contudo, migrei todos os meus dados mais sensíveis para serviços premium do Evernote e Todoist. Meu email continua sendo muito importante para trabalho; prefiro domínio e servidor próprios e deixo as contas gratuitas para logins em geral e direcionamento de spam. Uso discos virtuais gratuitos, mas para atividades mais importantes prefiro pagar anualmente pelo Office 365, com 1 TB de OneDrive. Não gosto de serviços de armazenamento de senhas na nuvem, como o LastPass, e estou resitindo com o 1Password no bom e velho modo de armazenamento local. Eles insistem cada vez mais que eu migre para uma assinatura, colocando os preços das licenças e updates na estratosfera…
E em redes sociais? O que você coloca lá? Só bobagens e coisas irrelevantes, então você não se preocupa? Bem… então por que o Facebook se tornou uma das empresas mais rentáveis do planeta permitindo às pessoas publicarem tanta irrelevância? Ainda que você não poste uma linha lá, ele rastreia tudo o que você acessa e lê. Reflita…
Concluindo: aplicativos gratuitos continuam sendo ótimos e ajudam a vida de muita gente. Às vezes, porém, sai mais barato pagar por eles. Ou não usá-los…