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Digitalização de serviços públicos não tem volta, mas ainda há muito a ser feito
| Foto: Freepik

Durante décadas o brasileiro precisava sair de casa, ir a uma agência bancária e ficar em longas e cansativas filas para ações rotineiras como pagar contas e transferir dinheiro. Isso mudou a partir de 1983, quando os bancos começaram a investir em sistemas informatizados. No passado, as pessoas também iam aos Correios para enviar cartas e se comunicar com familiares e amigos. Hoje, para quem está longe ou até na mesma cidade, no mesmo bairro, basta enviar um e-mail ou usar algum aplicativo de comunicação, como WhatsApp ou Telegram, para garantir contato praticamente instantâneo.

Indiscutivelmente o avanço da tecnologia vem a cada ano – em algumas situações a cada mês – transformando obsoletas ações que eram habituais para milhões de pessoas durante muitas gerações. Mas dentro do setor público a situação ainda não é a ideal.

Em junho de 2018, uma reportagem do Valor Econômico tratou sobre o estudo “O fim dos trâmites eternos: cidadãos, burocracia e governo digital”, divulgado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) naquele ano. A avaliação da instituição trouxe uma conclusão preocupante. Na América Latina, a oferta de um serviço burocrático com atendimento presencial podia custar até 40 vezes mais aos cofres públicos do que a realização do mesmo atendimento de forma digital.

Das nações estudadas, sete simplesmente não sabiam quantos serviços burocráticos existiam e dez sequer tinham um catálogo de todos os procedimentos. A reportagem mostrou ainda que alguns governos do continente até já haviam implantado mecanismos digitais, mas os mesmos não eram utilizados. E, entre os 12 que possuíam plataformas que se comunicavam, somente México, Trinidad e Tobago e Uruguai conectavam todas as respectivas instituições públicas.

Naquele momento, a realidade brasileira assegurou que 75,4% dos trâmites burocráticos locais podiam ser iniciados e concluídos por meio da internet, contra um total de 88,8% no México e de praticamente 100% no vizinho Uruguai. O jornal destacou também que, de acordo com o levantamento do BID, os meios digitais não só têm custo menor como ainda diminuem o tempo gasto para soluções em 74%. Outra vantagem sugerida era a diminuição na incidência da corrupção. O problema é que o investimento no setor dentro da América Latina e no Caribe para garantir os serviços públicos digitalmente era baixo se comparado com a União Europeia, onde 81% dos procedimentos eram operacionalizados online.

Em nosso continente, apontou o estudo, somente 7% das pessoas entrevistadas afirmaram que resolveram assuntos burocráticos pela via digital durante o ano de 2017. No Brasil, três quartos das solicitações de serviços públicos podem ser iniciadas online e o processo todo pode ser feito de forma digital em aproximadamente 54% dos casos. No Uruguai, praticamente todos os tramites burocráticos podem ter início via internet e mais de 40% podem ser concluídos da mesma forma. Ainda é pouco quando se pensa que na União Europeia é de 81% a média dos processos administrativos que podem ser iniciados digitalmente.

É estarrecedor notar que, três anos depois do levantamento, o Brasil ainda tenha muitas instituições governamentais que não atendem às recomendações do BID. E, se compararmos com os avanços promovidos no mundo da economia privada, onde existe uma permanente preocupação em melhor atender aos clientes, essa mudança para melhor é mais do que justificada e iminente, até porque a gestão pública digital é uma realidade no país há alguns anos.

Pode se afirmar sem medo que a digitalização dos serviços públicos é muito mais do que uma mera tendência. É, sem dúvida alguma, um caminho sem volta, principalmente porque os brasileiros, independente das classes socioeconômicas onde transitam, já vivem a cultura digital.

Talvez você ainda não saiba, mas em muitas cidades brasileiras situações como emitir documentos, fazer licenciamentos para a construção civil, informar sobre problemas nas ruas e equipamentos públicos, renovar alvarás para empresas, solicitar corte de árvores, emitir guias para o recolhimento de tributos da administração municipal, agendar consultas médicas ou matricular os filhos na rede pública de ensino são resolvidas com a qualidade e a velocidade que os tempos atuais exigem.

O município gaúcho de Gravataí, com população de 255 mil habitantes, investiu na computação em nuvem e virou case de sucesso, colecionando prêmios por conta da transparência nas contas públicas graças à marca de 70% dos seus processos efetuados digitalmente. Em Minas Gerais, a administração de Bom Despacho também tomou a decisão de disponibilizar serviços de melhor qualidade para seus 49 mil moradores e, com a implantação de um software com gestão 100% na nuvem, as projeções são de uma economia de R$ 1 milhão por ano.

No Estado de Santa Catarina, na cidade de Palhoça (168 mil habitantes), o portal digital operado pelo governo local recebeu 1,3 milhão de acessos de moradores entre junho de 2018 e junho de 2019. Pessoas que não precisaram deixar o conforto do lar e enfrentar o trânsito pesado na região da Grande Florianópolis para resolver pendências na prefeitura.

Nestes casos citados e em muitos outros, está virando coisa do passado ficar na fila. Basta acessar um smartphone, um tablet ou um computador pessoal conectado à internet e, em poucos cliques, a burocracia desaparece. Isso faz com que ela acabe sendo transformada em algo mais do que positivo: o sagrado direito de todo cidadão gozar de mais tempo livre para si mesmo, sua família e seus amigos.

O que levava meses – algumas vezes até vários anos – para se encontrar uma solução, hoje em dia é resolvido em questão de segundos. O único arrependimento dos gestores que já entraram neste novíssimo mundo é não ter trilhado antes o caminho aberto pelos serviços digitais que proporcionam agilidade, inovação, qualidade e precisão. Não faltam motivos, portanto, para todo os demais gestores passarem a fazer parte deste movimento inovador.

*Aldo Luiz Mees é empresário e sócio-diretor da IPM Sistemas, empresa de Santa Catarina especializada em sistemas em nuvem para a gestão de órgãos públicos com sede em Florianópolis e com Centro de Tecnologia instalado em Rio do Sul.

Correção

O texto publicado em 18 de fevereiro de 2020 afirmava que o percentual de serviços públicos que podem ser realizados de forma totalmente digital era de 35%. Em 19 de fevereiro, atualizamos a informação para o percentual correto, que é de 54%.

Corrigido em 19/02/2020 às 16:36
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